Acompanho, não com surpresa, a uma onda solidária ao PR João Lourenço, muito por conta das medidas intervencionistas que tem estado a tomar no âmbito da sua estratégia governativa.
Por: RUI KANDOV
O ponto mais alto do coro de apoios foi, sem dúvidas, depois do tão esperado anúncio de exoneração de Isabel dos Santos, fi lha mais velha do ex-PR, uma das mulheres mais rica de África. Esta exoneração, que era necessária, considerando a importância estratégia da empresa e, por conseguinte, um activo indispensável para o sucesso governativo, precipitou a institucionalização de duas alas bem definidas no MPLA. João Lourenço, Presidente da República e Vice-Presidente do Partido, entende que as reformas são indispensáveis para o exercício governativo.
A outra ala, a mais conservadora, advoga que é preciso fazer as alterações de forma paulatina. Considero absolutamente normais e até encorajo diferentes formas de abordagem sobre uma mesma realidade política. Ao contrário dos apregoadores de costume, não acho que seja falta de lealdade pensar diferente do chefe. Não há mal nenhum que o partido se apresente com duas correntes de pensamentos diferentes.
Assim acontece em todo mundo, nos EUA, mais concretamente no partido Democrático, por exemplo, Hillary Clinton liderava uma “turba” que não alinhava com o pensamento de Barack Obama. Em Portugal, António Costa opunha- se a José Seguro (PS). No PSD, Passos Coelho pensava diferente de Santana Lopes. Paulo Portas apresentava-se como alternativa a Ribeiro e Castro (CDS).
Logo, não há mal nenhum que uma força política promova formas diferentes de projectar, agir e implementar.
Ocorre que, no caso MPLA, a situação é delicada. João Lourenço considera que o País está completamente viciado, e tem razão. Quando olhamos para o funcionamento dos hospitais, das escolas públicas, para a gestão do erário, percebemos que está tudo errado que há necessidade urgente de se alterar o quadro, não para arregimentar um hipotético apoio popular, mas, sobretudo, para ir de encontro às premissas que justificam a luta de libertação que reivindicava a elevação de Angola a um Estado. João Lourenço está a devolver a esperança aos angolanos, sim. No entanto, ocorre, porém, que a degradação do estado de coisas acontece num País que está a ser governado há mais de 40 anos pelo MPLA, partido em que João Lourenço é militante desde que se lhe conhece como homem de política. Ora, isso remete- nos às seguintes perguntas: Como foi possível construir tamanha discrepância entre o que se prega e o que se pratica?
É realmente o MPLA um partido fundado em ideias que procuram o bem comum? As questões são levantadas no sentido de se perceber como será possível voltar a colocar o MPLA, primeiro, como partido que funciona à luz dos fundamentos da lei jurídica, mas também e sobretudo a luz dos fundamentos da lei moral. Segundo, até que ponto as formas engajam a estrutura ideológica do partido?
Sim, porque mais do que reformas governativas de João Lourenço que, por hipótese durariam 10 anos, é preciso garantir que o MPLA, enquanto partido dominante, tenha consolidado as alterações por formas a assegurar que o ímpeto reformista faça parte da sua cartilha e, independentemente de quem for o Presidente, as reformas vão continuar. Essa garantia está longe de ser alcançada, por enquanto. Portanto, mais do que encorajar a cisão entre os membros do mesmo partido, nalguns casos com sugestões que roçam o ridículo, o ideal seria, pois, apelar para ajustamentos necessários para que o MPLA volte a ser a “Grande Família”. *Docente universitário