Camama é uma referência sem igual, já que lá encontramos as instalações da TPA, Arquivo Nacional, Hospital Geral de Luanda, uma rotunda muito famosa, um Cemitério que recebe gente de muitos cantos de Luanda e, aliás, agora ganhou um novo Shopping Popular.
Uma boa parte dos moradores dessa zona, e não só, tem essa interrogação na cabeça. Enquanto professor de Língua Portuguesa nas escolas da zona, tenho sido vítima constante dos alunos quanto a essa dualidade, a cada ano que passa.
E eles perguntam mesmo: Professor, diz-se NO Camama ou NA Camama? Em meio dessa matéria, muitos exprimem as suas opiniões mediante suas convicções e achamentos. Aquando da pergunta na sala de aula, os alunos têm adiantado manifestar as suas opiniões.
Muitos alunos começam por dizer que o certo é DA Camama, já que o Cemitério e a TPA assim o determinaram. Isso encontra maior adepto por conta desses modelos.
Mas os alunos ficam sem saber o que passa de concreto com Camama, quando lhes digo que a Administração está determinada como Administração DO Camama. Ao me deparar com a questão em sala de aula tenho aconselhado os alunos de duas formas: 1.
Cada um é livre de preferir DO Camama ou DA Camama; NA Camama ou NO Camama. 2. Prefiro não usar DO Camama, muito menos DA Camama. Tenho dito DE Camama, EM Camama.
Numa primeira impressão, tenho sentido alguma reacção agravada, deixando os alunos mais perplexos. Mas tudo parece ter alguma clareza, quando explico com mais detalhes. Justificando a primeira opção, levo os alunos nessa liberdade de uso, em função da existência das duas realizações, tal como dita a realidade.
Qualquer uma das opções se fundamenta em função da disputa. Como não há convenção que determina o ideal, ninguém pode condenar o outro. A língua nos oferece essa simpatia em certas circunstâncias. Existe pessoas que dizem DA Camama e soa-lhes perfeitamente, assim como há pessoas que se acostumaram com o DO Camama e também não lhes fere os ouvidos.
Apesar de que na língua portuguesa existe a designação de substantivos consagrados com a dupla possibilidade (masculino e feminino), os substantivos comunsde-dois, não podemos afirmar que essa determinação prevalecerá para Camama, já que se trata de um caso raríssimo para os locativos.
Por essa raridade, já que para muitos a outra realização soa esquisita, essa disputa já dita um vencedor em função da tamanha vastidão de adeptos, embora, na língua, nem sempre a maioria vence.
Por ora, podemos mesmo afirmar que as duas variações existem e tem sido realizada, tal como mencionamos logo no princípio. Justificando a segunda opção, ela não é um mundo imaginário.
Prefiro dizer vivo “EM Camama”, Cemitério “DE Camama”, sou “DE Camama”, sem determinação, já que não existe uma consagração convencional que orienta o uso para o masculino ou feminino.
Como também, é a realização que nenhuma estranheza oferece e se orienta por algum fundamento normativo. Essa análise encaixa-se dentro de uma “perspectiva neutra” que alguns topónimos ainda corsevam.
Para nós, a título de exemplo desta neutralidade, que ainda se registra em certos topónimos, é o nosso país Angola e a sua capital Luanda. Falamos “Estou EM Luanda”, “Vivo EM Luanda”, “Sou DE Luanda”,”Sou DE Angola”… O mesmo acontece com Benguela, Cacuaco, Viana, Malanje, Mbanza Congo, Catatete, Cabiri, Menongue, Cabinda, Ndalatandu, etc., pois sem determinação de artigos.
Em seu Guia Prático do Português correcto, Moreno (2011, p.70) esclarece-nos sobre essa realidade, fundamentando que “nosso idioma nem sempre usa o artigo antes dos nomes de lugar (países, estados, cidades): moro em Alagoas, mas na Bahia; venho de Portugal; mas do Japão, e assim por diante.” Aqui fica a ideia bem clara de que nem sempre determinamos os nomes que indicam lugares geográficos.
Na mesma linha de pensamento, Moreno (2011, p. 68) acrescenta: antes de nomes geográficos, o uso do artigo às vezes é obrigatório, em outras, é facultativo. […] Os nomes das cidades geralmente não é acompanhado do artigo, em Português, observando-se nomes que não seguem, como dita a regra geral, e outros que admitem que venham com artigos (seguindo o costume da maior parte dos falantes) […] O uso popular (e, muitas vezes, histórico) regista a possibilidade de incluir um artigo antes de certos locativos), Moreno (2011, p. 69).
Nota-se que o uso popular se acostumou com a tendência de determinar sempre o acompanhamento de artigos aos nomes, tendo em conta a estrutura em uso da língua portuguesa.
Como a língua portuguesa se desfez mesmo da estrutura de construção frásica do latim onde existia essa real netralidade dos topónimos, temos sempre essa tendência de determiná-los, sobretudo, quando usados com determinantes possessivos: MINHA, TUA, NOSSA Luanda; MINHA, TUA, NOSSA Angola.
E AGORA PERGUNTO EU… Assim que subiu à categoria de município, como CAMAMA será particularizado: Município DO Camama ou Município DA Camama? Se for para determinar uma só realização, eu sugiro que seja melhor “DO Camama”. Soará, sem sombras de dúvidas, da melhor maneira, quando dissermos “NOSSO Camama”.
Para Camama, nesse quisito, eu prefiro determiná-lo como masculino: meu, teu, nosso Camama, ao invés de “minha, tua, nossa Camama”. Esta última, assim como em mim, acredito que em muitos pode beliscar os ouvidos.
Não temos dados probatórios do ponto de vista estatístico que faz menção ao número de falantes que prefere DO ou DA, mas adianto deduzir que, em função do que abonatóriamente escuto, a realização “NO/DO Camama” vence com percentagens imensuráveis.
Como se pode provar, fora da TPA e do Cemitério, encontramos essa determinação em quase todas as referências: Casas NO Camama, Moradores DO Camama, Bazar DO Camama, Topo DO Camama, Solar DO Camama, Rotunda DO Camama , Paragem DO Camama I, Administração DO Camama… No táxi, ouvimos Rotunda DO Camama e quase nunca rotunda DA Camama; Fico na paragem DO Camama e quase nunca fico na paragem DA Camama.
O que será que está na base desta tendência, alegadamente minoritária, desta determinação feminina? Vale considerar que, talvez, um estudo sobre a etimológia do nome, ou um estudo na perspectiva diacrónica, algo que não aprofundamos, remeter-nosia para alguma razão desta particularidade feminina.
Apesar de desconhecemos esses estudos em torno do nome, avançamos dizer que não vemos razões morfo-lexical que levaria os partidários DA Camama preferirem usar o topónimo desta forma, principalmente se essa dedução partiu da tendência de determinar o género feminino das palavras em função da vogal temática desinência dos nomes (vogal final).
Enganamo-nos se pensarmos que a lógica determina que Camama é feminino por ter a desinência nominal em (a). Pois, embora em minoria, a língua nos mostra certos substantivos que têm essa desinência nominal, mas são masculinos, como por exemplo: telegrama, dilema, lema, semba, problema etc.
No mundo dos nossos topónimos também encontramos exemplos, tais como: Luena, Kilamba, Bulatumba, Talatona, Cassenda, Ukwa, Malueca, Cazenga, Sambizanga, Benfica, Palanca, Calomboloca, Tombwa, etc.
Por uma questão de eufonia acostuma-nos a determiná-los como masculinos. Achar que devemos consagrá-lo feminino, perderiamos muito tempo até desacostumar a maioria, além de soar estranho para muitos ouvidos já acostumados com a determinação masculina.
Pela força da maioria, aconselha-se que Camama deve ser determinado como masculino, e não perderiamos nada com isso, já que é assim que a maioria tem dito: estou NO Camama, vivo NO Camama, sou DO Camama, NOSSO Camama, tal como determinamos Kilamba, que também será município, e Talatona que prevalece.
Como vemos, mesmo com a força da TPA e do cemitério, as pessoas não se deixam levar. Pelo que tudo indica, essas instituições é que se precisam converter. A língua já nos mostrou várias vezes que, em certos casos, por ironia do destino, o uso popular é um elemento diferenciador que determina o que prevalece.
Desse jeito, recomendamos que a Administração deve mesmo aconselhar a TPA e a direcção do cemitério a se reverem. Já é hora de pensarmos num tratamento uniforme deste futuro município.
Por: JOÃO DA SILVA