Recentemente a Lusa avançou uma notícia dando conta de que uma empresa pública angolana, acusada de estar há mais de 51 meses sem salários, apresentou a possibilidade de suspender os contratos de trabalho com alguns dos 400 trabalhadores com objectivo de não agravar as dívidas. Entretanto, a União Nacional dos Trabalhadores Angolanos (UNTA) – Confederação Sindical considerou ilegal a pretensão da direcção da Empresa.
POR: Fortunato Paixão
O secretário-geral da UNTA, Manuel Viage, recordou que a Lei Geral do Trabalho “não prevê a modalidade de anular ou suspender” o vínculo jurídico- laboral com trabalhadores para “posterior reenquadramento. O que pode apenas existir é a figura do despedimento coc«lectivo, para sua concretização é preciso que os direitos dos trabalhadores fiquem completamente salvaguardados, salários em dia, as indemnizações e impostos na Segurança Social”.
Ora, o empregador é obrigado a retribuir o trabalhador pelo trabalho prestado. O incumprimento deste dever dá lugar a vários cenários nos termos da LGT, designadamente, a rescisão do contrato de trabalho por motivos imputáveis ao empregador ou a reclamação dos créditos junto da Sala de Trabalho do Tribunal Provincial de Luanda. Todavia, os trabalhadores continuam a prestar o seu trabalho, não obstante de não terem os salários em dia. Com efeito, pelo que se vê nem os trabalhadores pretendem rescindir os contratos de trabalhos e nem a empresa pretende despedir os trabalhadores, porém, quer suspender os vínculos laborais. Então, coloca-se a questão de saber, se nos termos da Lei Geral do Trabalho, a intenção da referida empresa procede ou não. Ora, a relação de trabalho constitui-se, executa-se e extingue-se.
Durante a execução o contrato pode suspender- se ou por motivos relativos ao trabalhador ou empregador (artigo 189.º e 192.º da LGT). Logo, de acordo com o artigo 184.º da LGT, há suspensão da relação jurídico-laboral sempre que, com carácter temporário, o trabalhador esteja impedido de prestar o seu trabalho por factos que lhe respeitem mas não lhe sejam imputáveis, ou o empregador impedido ou dispensado de receber o mesmo trabalho. Relativamente ao empregador, o grande ponto de interesse, para suspender a relação jurídico-laboral de todos ou parte dos trabalhadores da empresa ou centro de trabalho por: i) verificação de razões conjunturais, motivos económicos ou tecnológicos de duração temporária; ii) calamidade, acidentes e outras situações de força DR maior, como a interrupção do fornecimento de energia ou de matérias- primas que obriguem ao encerramento temporário do centro de trabalho ou a diminuição temporário da laboração; iii) encerramento temporário do estabelecimento para obras, para a instalação de equipamentos ou por determinação das autoridades competentes.
(Veja-se o artigo 193.º da LGT). Assim, ocorrendo uma das situações acima previstas, a empresa pública em epígrafe deve comunicar à Inspecção Geral do Trabalho (IGT) e ao Centro de Emprego (CE) da área do centro de trabalho, até 15 dias antes de dar o início da suspensão da prestação de trabalho, salvo nas situações de calamidade, acidentes ou situações de força maior (artigo 194.º). Com efeito, a aludida suspensão da relação jurídico-laboral, nos termos em que se apresenta, relativamente ao empregador, faz cessar a obrigação de pagar salários. Entretanto, a suspensão dos vínculos laborais não pode ultrapassar o período máximo de seis meses.
Logo, cessando o impedimento, a referida empresa deve afixar no centro de trabalho a informação da data do retorno ao trabalho e notificar os trabalhadores com contratos suspensos, por meio apropriado (Rádio, Televisão ou Jornal), para retomarem o trabalho, contando-se da data dessa notificação, o prazo de cinco dias úteis. Na hipótese da suspensão ultrapassar o prazo máximo, a empresa pode, mediante a autorização da IGT (a autorização deve ser objectiva, tendo em conta os factos que motivaram a suspensão), declarar os contratos extintos por caducidade, pagando aos trabalhadores todos os créditos (salários, remuneração das férias e subsídio de férias e de natal) e uma compensação calculada nos termos do artigo 236.º. Portanto, cumprindo todos os requisitos acima referidos, nada obsta que a empresa suspenda os contratos de trabalho, num período máximo de seis e posteriormente reenquadre os trabalhadores.