“Que o meu empenho para salvar a nação da vergonha e da culpa seja o meu monumento, meu património, o meu legado”.
Se essas palavras fossem ditas por um político angolano, pelo menos um… imagine! Se fosse o Presidente da República, já que todos estão aglutinados em si… Mas não, essas palavras foram ditas por Edmund Burke, num contexto diferente do nosso apenas pela cronologia temporal, localização geográfica e as vítimas, pois, as atrocidades e o pisotear contra a sobriedade governativa são semelhantes.
O caso de Angola não tem que ver apenas com a má governação. Isso é consequência.
O problema, se analisado a fundo, tem que ver com o que ousamos chamar a negação da natureza comum entre humanos.
O pensamento que desencadeou a segregação, a escravatura, a estratificação racial, a categorização das raças, e todos os males que dele advieram, é o mal sobre o qual emperra o nosso país.
O reconhecimento e aceitação da nossa natureza comum é o fundamento sobre o qual se assentaria a igualdade e todos outros direitos conexos e afins, chaves para qualquer harmonização entre as relações humanas.
Destruída essa base, a real semântica da igualdade e liberdade propaladas são os seus antónimos.
Ao visitarmos as teses de Edmund Burke encontramos a receita para a boa governação.
O filósofo e teórico político irlandês defende conceitos interessantes.
A começar pela conduta de um estadista.
O filósofo faz a distinção entre “equidade” e “utilidade”, duas qualidades sobre as quais deve assentar-se a conduta política de um político/ estadista.
A primeira, a equidade, funda-se sobre “a nossa natureza comum”, a natureza humana que, ao reconhecê-la, leva o estadista a promover uma justiça “equitativa” e “imparcial”, portanto, funcional.
A segunda, a utilidade, está alicerçada no “temperamento e os hábitos temperados de uma nação”.
Nisso, só será possível alcançar os desígnios de uma nação próspera quando houver aposta na indústria, ensino, administração da justiça tudo que possa contribuir para a unidade do todo.
A nossa realidade está em rota de colisão contra esses princípios norteadores de uma boa governação.
A nossa indústria é tímida, não nos permite produzir carteiras e papéis, cujas matérias-primas temos de sobra, no entanto, exportamos para importar os seus derivados.
O ensino anda moribundo, o ensino superior público está parado há dois meses, e não se diz nada.
A justiça, no fim das contas, depende da vontade de um só homem.
Para não falar das fronteiras humanas que nascem diariamente entre actores que deviam pensar juntos o seu destino comum.
Isso tudo constitui consequências da falta de equidade e utilidade na conduta dos que dirigem o país, decorrente da negação da natureza comum.
Edmund Burke diz e muito bem que governar não é cultivar “especulações vazia ou paradoxos que afrontam o senso comum”.
Em Burke, a política deve ser “ajustada, não a raciocínios humanos, mas à natureza humana” que reconhece o valor do outro igual ao seu e, por isso, evita actos gravosos contra terceiros.
À luz de Burke, a receita para governar bem Angola é: Respeitar a intrínseca complexidade dos povos aos quais se destina a governação; Governar benignamente as suas liberdades, os seus códigos legais, as suas particulares formas de organização social e os seus seculares sentimentos de pertença e honra.
Por: ESTEVÃO CHILALA CASSOMA