A morte de Rita Lee deixou a todos, principalmente a quem tem entre 50 e 60 anos, uma grande comoção.
Há cada vez mais heróis nossos a morrer.
A única diferença é que, enquanto eles antes morriam de overdose por viverem demasiado depressa, hoje morrem de cancro como nós. Será que já não são imortais.
Imaginemos assim.
O maluco beleza dá as boas-vindas a Rita Lee com um sorriso largo “Rita, você me traz ‘Ouro de Tolo’ quando penso em como você viveu tanto tempo.
Lá embaixo, a vida segue e nós, aqui em cima, só podemos observar.”
Ao lado, Cazuza esboça um sorriso encantado.
“Verdade, Rita. Mas é também um fato que ‘O Tempo Não Para’ e, mesmo aqui de cima é fascinante ver como nossa arte assume uma existência autônoma após a partida.
Talvez nossas mortes precoces tenham intensificado a apreciação por nossas melodias, nossas letras.”
Em nosso cenário imaginado, Raul Seixas, Cazuza, Renato Russo e Cartola acolhem Rita Lee em um éden musical.
Os ícones da música brasileira, cujas vidas foram ceifadas prematuramente, lamentam a perda, mas também expressam um vislumbre de inveja pela longevidade dela.
A forma e o modo como a morte é confrontada pelos artistas exerce um forte impacto na maneira como, depois, nos recordamos deles.
Se, por um lado, a morte prematura os envolve em uma aura de tragédia e romantismo, conferindo-lhes uma qualidade quase mítica; por outro, a carreira longeva permite a construção de um acervo vasto e evolução na sua arte, enriquecendo o legado, o que quase permite seccionar a sua carreira em diferentes fases, com autonomias diferentes.
Ninguém tem dúvidas que o Caetano Veloso de “Transa”, “Noites do norte” ou “O meu coco” pertencem a épocas e a “vidas” diferentes.
Será por isso mesmo que os artistas que viveram menos tenham deixado uma marca forte e ninguém tem duvidas que, com o seu desapareciemneto permaturo, ficamos sempre a perder.
Há, entretanto, na atualidade, um terceiro elemento nessa equação: a tecnologia.
A era digital desempenha um papel fundamental na preservação e disseminação da obra desses artistas, perpetuando-a e tornando-a praticamente úbicua, disponível para as futuras gerações.
Também por isso, hoje mais que nunca, a arte transcende a vida e a morte.
A despeito de terem vivido mais ou menos, nossos grandes ídolos conseuiram imortalizar-se e as suas obras estão aí, servindo-nos de lembrete.
A vida é sempre efêmera, a arte é sempre eterna. Como amantes da música, precisamos aprender a lidar com a morte de nossos ídolos.
Afinal, eles são seres humanos como nós, submetidos à mortalidade.
Valorizar e preservar o legado artístico por eles deixado é a melhor forma de honrar suas memórias.
Mas, para cada um de nós, mesmo que não o formulemos conscientemente, o mais trágico é perceber a “outra” dimensão do impacto da morte dos nossos heróis.
Como eles também representam a nossa juventude, o seu desaparecimento coloca-nos a todos mais perto da morte.
Esse é soco no estomago.
Por: JOSÉ MANUEL DIOGO