Quatro e trinta da manhã, o telefone ladrava na banca, levanto-me da cama e dirijo-me logo ao quarto de banho a fim de fazer as primeiras higienizações do dia.
Minutos depois, estou bem vestido e pronto para um pão e um bom chá Kaxindi bem quentinho, pois tenho de ir renovar o B.I, só quem é mwangolé sabe o que esse processo nos causa, o documento é nosso e de carácter obrigatório, mas para tratarmos é preciso matar o dia todo, se o chefe lá no salo não compreender a nossa situação, é uma falta garantida e um desconto no kumbu que já é koxito.
Eu ainda acho que esta situação deve já constar no contrato de trabalho angolano, o funcionário, cinco em cinco anos, terá um dia para tratar o B.I, caso não, organizem bem este sector a fim de ser mais dinâmico. Voltando ao assunto do meu dia, cinco horas e trinta minutos bem certinho marca o relógio que está no meu magrelo pulso, estou no tempo certo para sair.
Esse é um dia muito problemático, se sair cedo demais, os donos do bairro vão te desmontar por completo, se sair tarde, acabas por não conseguir tratar o santo documento e correr o risco de teres duas faltas consecutivas num único mês, caso voltes no dia seguinte.
Estou dentro do nosso famoso azul e branco com destino a qualquer identificação dentro da nossa cidade de Luanda.
Depois de um longo percurso, paramos na Shoprite com o objetivo de fazer descer uns e fazer subir outros. Um ambiente tranquilo circulava dentro das avenidas do azul e branco, até ser quebrado por um senhor ao meu lado: mô kasule, passa só o teu jornal, quero ver algumas notícias de hoje! pediu humildemente o senhor que aparenta estar na casa dos cinquenta anos de idade.
não vou te dar o meu jornal, senhor! Compraste a tua mandioca com jinguba, será que te pedi? Ou não notaste que eu também queria?
Quando comprei, o mais velho me deu olhada, agora queres ler o jornal? Come a tua mandioca com jinguba, assim estarás sempre actualizado com as notícias.
respondeu o jovem com os nervos à flor da pele em plena manhã ― eeeeeeerrrrréeeeehh!!! Ó mano, é preciso responder assim ao senhor?! Ele não é culpado se a tua noite não foi boa ou se não te deram a maçã das cinco horas. ¬ ― interviu uma jovem talvez de vinte e nove anos de idade já com sorriso no rosto. ― oi, jovem, assim és já a defensora?
Se não me deram lá às cinco horas, nunca é demais me dares das seis horas, também não é mal. ― respondeu o jovem já meio humorado e para aumentar a curiosidade do senhor que havia lhe pedido o jornal, passou fazer o relato noticioso do jornal. ― é meu Deus, esse país está assim?! wawéé afinal esse também roubou?! Ficamos todos curiosos e com vontade de ler o jornal deste dia, então decidi descer nos congolenses e caminhar até a identificação junto à cidadela desportiva, assim reservaria uns cem kwanzas para comprar o jornal que já me deixou curioso e pena do senhor por não termos o mesmo destino para partilhar comigo o jornal.
Depois de um tempo chego à identificação e encontro uma fila longa onde eu ocupava o número 53 logo nos primeiros raios da manhã, alguns me relataram que haviam passado a noite ali mesmo a fim de serem os primeiros a serem atendidos, o outro disse que hoje parecia dia de sorte, porque há dias que a esta hora já estaria no número 100 ou 120 na lista de presença.
Oito horas, pontualmente, começou o atendimento, percebi que era mesmo um dia santo, começarem a atender oito horas, é um fenómeno nunca visto por mim, ou talvez um elemento do executivo venha aqui dar um olhar e depois bazar dar o relatório.
Treze horas e cinquenta minutos, acabei de ser atendido e como não dava para dar um pulo ao salo, decidi regressar em casa e relaxar um pouco. Soltei alguns passos a fim de pegar o táxi, chego ao largo da igreja Católica, junto à cidadela desportiva, o anúncio do vendedor de jornal sobre as manchetes de cada jornal que ele tinha, despertou a minha atenção e de todos que lá passavam e compravam. ― Pastor adia o culto de libertação e é apanhado na hospedaria da rua da Dira pela serva que se fazia acompanhar do obreiro, página 8.
Ainda no mesmo jornal, candidatos do concurso público de ingresso na AGT sentem-se chumbado pelo péssimo sistema de rede, lembram o episódio do mano Abel e rebolam-se ao chão em lágrimas.
No outro jornal, torneiras de Noé reprovam projectos milionários de requalificação no país, página 11. ― anunciava, o vendedor de jornal, todas as notícias frescas e de forma detalhada. Sempre que anunciava, pegava um jornal diferente, então, percebi a razão de tanta enchente na busca dos jornais que ali se encontravam.
Como alguém que gosta de ler e estar sempre actualizado, decidi comprar alguns jornais, pois os anúncios eram bastante chamativos.
Parti para o meu destino, não tinha muito tempo a perder aí para ler o jornal, pois queria chegar cedo a casa e querer descansar um pouco a fim de preparar a cabeça para o dia seguinte suportar os berros do chefe devido à minha ausência naquele dia de trabalho e, por outra, não poderia ler os jornais com temas daquelas dimensões logo naquele lugar, afinal são temas que merecem boas leituras e levantam debates.
Chego a casa, já com tanta ansiedade para ler os jornais, a minha mente fica baralhada e sem saber qual jornal começaria primeiro.
Comecei logo com o que mais me atraia sobre o pastor, dirigi-me para a página 08 do jornal em destaque e não vejo nenhuma notícia relacionada ao pastor, procuro ver logo o outro jornal e não encontro, igualmente, as notícias que o vendedor relatou.
Fico fora de mim e com nervo agarrado às mãos e com vontade de voltar ao vendedor e receber os meus kwanzas, afinal o gajo é mesmo um boca esquadra, nada que ele disse está no jornal, o gajo burlou-me e papou o meu kumbu.
Por: KHILSON KHALUNGA