Antes de chegar ao Rio de Janeiro, para a reunião do G20, o ministro das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, afirmou à mídia brasileira que uma das prioridades para o Kremlin é o fortalecimento do papel do BRICS e que Kiev tem de levar em conta as prioridades de segurança da Rússia
De acordo com uma entrevista exclusiva aos jornais Valor e O Globo, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, deixou claro o desejo da Rússia de fortalecer a relação com o Brasil, com ênfase no BRICS e o apoio do Kremlin à proposta feita pelo governo brasileiro, em 2023, de criar um grupo de amigos para mediar a paz entre Ucrânia e Rússia.
Quando questionado sobre o papel do G20, Lavrov afirmou que o grupo foi criado como um formato económico e que a decisão “se deveu ao facto de os EUA terem enfrentado uma grave crise financeira, em 2008. Naquela época, as maiores economias conseguiram encontrar soluções eficazes.
Ao mesmo tempo, ficou claro que não se podia confiar em um único centro de pujança económica. Portanto, nos últimos anos, o G20 tem travado um diálogo sobre a reforma e a restauração da eficiência das instituições económicas globais”.
Para o chanceler, a dinâmica positiva do fórum se deve ao facto de países de mercados emergentes estarem demonstrando independência, marcando a sua posição no quadro de interesses globais, adicionando que a adesão da União Africana foi uma grande conquista neste sentido.
Lavrov destacou ainda que a agenda da presidência rotativa brasileira nesta organização está em consonância com os planos da Rússia no BRICS, que ela preside em 2024, e que os seus desafios devem seguir, provavelmente, no mesmo caminho para a elaboração de “soluções equilibradas para a transição energética, a transformação digital, o restabelecimento das cadeias de fornecimento, o acesso aos recursos energéticos e aos alimentos.
É importante que os países do G20 se comprometam a não usar a economia como arma e a evitar a competição injusta”. “A partir de 1º de Janeiro de 2024, a Rússia assumiu a presidência rotativa do BRICS.
O programa para 2024 inclui mais de 200 eventos. Vamos contribuir para que os novos membros se integrem nos trabalhos do bloco de forma orgânica”, afirmou Lavrov. Sobre a operação militar especial, o chanceler salientou que para “uma solução sustentável e justa da crise ucraniana, as suas causas principais devem ser eliminadas”.
Para ele, o Ocidente deve parar de encher a Ucrânia de armas, e Kiev deve parar com as hostilidades, readoptar o seu status neutro, de não alinhamento e não nuclear, respeitando os direitos e as liberdades dos seus cidadãos, bem como reconhecendo as novas realidades territoriais e a situação “no terreno”.
“Nem Kiev nem o Ocidente demonstram a vontade política para a resolução do conflito. Não temos escolha: a operação militar especial continuará até que os seus objectivos sejam alcançados”, garantiu.
O chefe da diplomacia russa disse ainda valorizar a disponibilidade do Brasil em promover a busca de uma solução por meios políticos e diplomáticos, lembrando que em Abril de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva propôs a criação de um “grupo de amigos para mediar a paz” e que a Rússia “analisa com muita atenção a iniciativa dos nossos amigos brasileiros”.
Lavrov criticou mais uma vez a “fórmula” para a paz de Vladimir Zelensky, que “representa um ultimato inaceitável para a Rússia, e [os oponentes em Kiev e no Ocidente] rejeitam categoricamente outras iniciativas, inclusive a brasileira.
Para começar, Kiev terá que suspender a proibição de diálogo com Moscovo, que ela impôs a si mesma”, assim como a União Europeia (UE). “Os países da União Europeia impuseram a si mesmos a sua inimizade com a Rússia.
Cabe a eles decidirem o que fazer com essa sua escolha. Considerando a intenção de Bruxelas de nos infligir uma ‘derrota estratégica’, não podemos falar sobre as perspectivas de restabelecimento das relações.
Se os países europeus abandonarem a sua política russofóbica e apresentarem ideias realistas sobre novos princípios das relações, nós as estudaremos”, afirmou Lavrov.
Sobre a corrida eleitoral nos EUA, o diplomata afirmou que a Rússia não tem ilusões e não espera que a política antirrussa expressa por Washington mude em tão breve.
“Estamos prontos para trabalhar com qualquer líder em quem o povo norte-americano confiar. O que é importante para nós não é a pessoa de um político, mas a sua política em relação à Rússia.
O presidente Vladimir Putin disse isso alguns dias atrás numa entrevista na televisão”, concluiu.