O novo primeiro-ministro da Guiné, Amadou Oury Bah, reconheceu, ontem, que os militares que tomaram o poder pela força em 2021 devem permanecer em funções pelo menos até 2025, se- gundo a agência de notícias francesa (AFP)
A madou Oury Bah, nomeado para o cargo pelos militares há duas semanas, é o primeiro alto funcionário a considerar, abertamente, o incumprimento do compromisso, assumido sob pressão perante a Comunidade dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), de organizar eleições antes do final de 2024.
A falta de progressos no sentido de uma transferência de poder e a situação interna tornam a realização de eleições, ainda este ano, cada vez mais duvidosa.
“Há muitas contingências”, disse Amadou Oury Bah numa entrevista à estação de rádio francesa RFI transmitida ontem. “Num contexto de fragilidade económica e financeira, é preciso trabalhar para a estabilização e a calma política, para que possamos examinar e aplicar as etapas do calendário com relativa serenidade”, declarou.
“O objectivo é terminar este processo e penso que 2025 é uma boa altura para o coroar”, afirmou.
O primeiro-ministro traçou um quadro sombrio da situação do seu país, que “enfrenta muitos desafios ligados a situações calamitosas”.
Referindo-se à explosão do principal depósito de hidrocarbonetos que matou 25 pessoas em Dezembro e causou graves perturbações na actividade económica, o primeiro-ministro justificou os desafios que o Governo tem pela frente, devido ao actual panorama em que “a exigência social que não foi satisfeita durante muito tempo” está agora “a aumentar novamente”, agravada pela inflação e pelo seu “impacto na vida dos guineenses que lutam para sobreviver”.
A Guiné, pobre apesar dos consideráveis recursos minerais e naturais, sofre de falta de combustível e de cortes de electricidade. Este país tem vindo a ser governado por regimes autoritários.
Em Fevereiro, realizou-se uma greve geral para obter a redução do preço dos produtos alimentares de base, o fim da censura dos meios de comunicação social e a libertação de um sindicalista da imprensa.
Foi o primeiro movimento do género durante a ditadura. A crise é acompanhada de uma repressão de todas as formas de protesto, da proibição de manifestações, da censura de várias estações de televisão e de rádio.
Os líderes da oposição foram, também, detidos, perseguidos ou forçados ao exílio. Os militares que derrubaram o Presidente civil Alpha Condé, em Setembro de 2021, comprometeram-se perante a CEDEAO a entregar o poder a civis eleitos até ao final de 2024, no final de um período dito de “transição”.
O primeiro-ministro fez eco do argumento dos militares de que precisavam de tempo para reconstruir o Estado e levar a cabo reformas profundas para pôr termo à instabilidade crónica e ultrapassar “alguns atrasos” na aplicação do calendário.
A Guiné é um dos países da África Ocidental onde os militares tomaram o poder pela força desde 2020. Também no Mali, a junta renegou o seu compromisso de abandonar o poder no início de 2024.
No Burkina Faso, o regime militar indicou que a realização de eleições no verão de 2024, como anteriormente prometido, não era uma “prioridade”.
No Níger, após o golpe de Estado de Julho de 2023, os militares limitaram-se a uma vaga declaração de transição de três anos, que nunca foi renovada.