O chefe da secção política da embaixadora da união europeia em Angola,Paulo Simões barros, revelou ontem, em Luanda, que as debilidades que o país apresenta no combate ao comércio ilegal de marfim e outros produtos da fauna, provenientes de países vizinhos, tem facilitado a passagem destes com destino aos mercados internacionais
O diplomata fez essa afirmação quando discursava na abertura do workshop sobre fluxos financeiros ilícitos, associados aos crimes contra a vida selvagem, que arrancou ontem e termina amanhã. Para demonstrar a relevância do evento, Paulo Barros salientou que a temática ambiental constitui uma das principais, senão a principal preocupação da humanidade no século XXI.
“A natureza no planeta encontra-se num declínio global a um ritmo sem prece- dentes, com um milhão das cerca de oito milhões de espécies ameaçadas de extinção. As alterações climáticas e a perda de biodiversidade são dois dos desafios mais importantes que enfrentam”, justificou. Explicou que, a agravar esta situação, assiste-se a um recrudescer da actividade criminosa do comércio ilegal de espécies selvagens.
Este comércio é uma das causas da perda de biodiversidade, do enfraquecimento considerável das populações selvagens da fauna e flora, e em alguns casos, levando-as à extinção. Segundo Paulo Barros, no caso particular de Angola, esta situação é particularmente grave. Na medida em que várias espécies selvagens estão ameaçadas de extinção, devido às pressões relacionadas com o assentamento de populações humanas, o qual tem também favorecido o aumento da caça furtiva e de comércio ilegal de espécies de vida selvagem, favorecendo a criação em cativeiro.
Por outro lado, disse que a densidade e diversidade de animais selvagens a nível local está em declínio e um dos principais factores é a caça furtiva, favorecida pelo comércio ilegal de animais selvagens, que desde o período póscolonial passou de uma actividade de subsistência a uma actividade comercial de pequena, média e grande escala.
“O comércio das espécies tem sido efectuado em diferentes mercados nacionais, incluindo na via pública. Angola apresenta igualmente debilidades perante o comércio ilegal de marfim e outros produtos da fauna provenientes de países vizinhos que passam pelo território nacional, com destino aos mercados internacionais”, esclareceu. Paulo Barros reconheceu que as autoridades competentes no sector do ambiente têm efectuado esforços no sentido de mitigar esta situação. Como prova, contou que foram criados alguns santuários para albergar os animais recuperados da posse ilegal.
Citou como exemplo a Palanca Negra Gigante, em vias de extinção no país, que também beneficia de um projecto de protecção. O diplomata da União Europeia em Angola considera que a gestão de recursos naturais do país é bastante preocupante carecendo, sobretudo, de meios para fiscalização. Para sustentar o seu ponto de vista, esclareceu que a guarda-florestal tem um número claramente insuficiente de efectivos, carece de formação adequada, de meios logísticos, de veículos de transporte, instrumentos de fiscalização, de discussão e de combate modernos e eficazes, bem como orçamentos adequados às suas responsabilidades.
Para si, as instituições competentes na área da justiça carecem das mesmas dificuldades de meios. As autoridades têm feito algum esforço para um maior controle da caça furtiva com a formação de mais fiscais, de pessoal a nível dos tribunais e a própria tipificação do crime ambiental no Código Penal. “O país continua a apresentar fortes debilidades e necessita de apoios adicionais para prevenir e combater a criminalidade nestas matérias, ao nível do reforço da fiscalização, legislação e campanhas de sensibilização junto da população”, frisou. Acrescentou de seguida que “algumas entidades privadas e organizações não-governamentais (ONGs) que lutam pela conservação da biodiversidade angolana têm igualmente manifestado preocupação relativamente a este fenómeno”.
Crimes contra a vida selvagem impacta negativamente as comunidades locais.
O secretário de Estado para o Ambiente, Iury Santos, ressaltou que Angola possui uma rica diversidade biológica, com indicadores que o colocam como um dos países mais importantes do continente africano. Essa diversidade está sob constante ameaça devido aos crimes contra a vida selvagem que não apenas representam uma perda irreparável da biodiversidade, mas também impactam negativamente sobre as comunidades locais e a economia do país.
O governante revelou, ao discursar no referido acto, que os indicadores actuais de Angola apontam para desafios significativos no combate aos crimes ambientais, com um aumento preocupante no tráfico de espécies ameaçadas, bem como no comércio ilegal de produtos derivados da vida selvagem. “Estas actividades criminosas, afectam a integridade dos ecossistemas angolanos e contribuem para o financiamento de redes criminosas transnacionais”, enfatizou. De acordo com o secretário de Estado, perante o cenário complexo, é fundamental que os profissionais angolanos envolvidos na protecção da vida selvagem sejam munidos com as ferramentas adequadas para identificar, investigar e descontinuar os fluxos financeiros ilícitos, provenientes destas actividades criminosas.
Enaltecido compromisso de Angola
Já a coordenadora residente da União Europeia em Angola, Zahira Virani, enalteceu o compromisso do nosso país em combater tais práticas. No seu ponto de vista, o desafio de transformar o mundo, através da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, centra-se numa visão de cooperação entre instituições governamentais e sociedade civil. “Esta agenda é ambiciosa não apenas pela abrangência dos 17 objectivos de desenvolvimento sustentável, mas também pelo apelo a uma resposta conjunta da participação dos vários actores da sociedade”, manifestou.
Manifestou ainda que o conclave contou com a participação de experientes profissionais da polícia e do ministério público do Peru que compartilharão suas experiências e boas práticas no combate aos crimes contra a vida selvagem. Zahira Virani considera que o workshop não só reforça a cooperação sul-Sul contra o crime organizado, mas também é um sinal do compromisso de Angola em combater este flagelo. Apelou igualmente aos órgãos de justiça que fossem firmes e intolerantes no combate aos crimes, no seu discurso do ano judicial de 2024.