A precariedade dos serviços, a escassez de gaveta e esquemas de valores monetários cobrados, sobretudo para as mortes extra- hospitalares, asfixiam as poucas morgues espalhadas em Luanda, muitas delas sem o mínimo de condições para dar tratamento ao processo de conservação dos corpos
É uma corrida frustrante para muitos familiares a luta por uma vaga nas morgues de Luanda, quando a “infelicidade” bate a porta na hora conservar os corpos dos seus entequeridos. A precariedade dos serviços, a escassez de gaveta e esquemas de valores monetários cobrados, sobretudo para as mortes extra- hospitalares, asfixiam as poucas morgues espalhadas em Luanda, muitas delas sem o mínimo de condições para dar tratamento ao processo de conservação dos corpos que lá vão parar.
Como constatou a reportagem do OPAIS, a realidade não é nova, mas persiste, sob olhar das autoridades, apesar de o Governo Provincial de Luanda ter aposta- do, nos últimos tempos, na reabilitação, apetrechamento, melhoramento e extensão das morgues. Apesar destes investimentos, os esquemas continuam a marcar o dia-a-dia nestas unidades, o que retira a paciência dos familiares enlutados e que lutam pela “boa conservação” dos corpos dos seus entequeridos.
A situação torna-se mais com- plicada quando a pessoa morre fora do hospital em que estão agregadas as morgues. Para os cidadãos que morrem nessas condições, como em casa, na via pública ou nas estradas, os seus familiares encontram muitas dificuldades e burocracia para conseguirem algum espaço, o que faz com muitos são “chegados” aos bolsos pelos funcionários destas morgues. A Morgue Central, a do Américo Boa-vida, Kapalanga, Ccuco e dos Cajueiros constam da lista de maior reclamação dos cidadãos que são forçados a recorrerem aos serviços prestados nestas unidades.
Muitos chegam a desembolsar valores que rondam entre os 10 e os 40 mil Kwanzas para verem o corpo dos seus parentes conservados. E, para quem não tem dinheiro, acaba por ver os restos mortais dos seus parentes em situações desumanas, ‘acantonados’ no chão ou misturados com outros corpos. “Tive uma neta que morreu no táxi enquanto a levávamos ao hospital. E quando chegamos, nos Cajueiros, não aceitavam colocar o corpo na morgue. Tive de pagar 20 mil kwanzas só para ter a menina na gaveta. Mas, ainda assim, antes de pagar, passamos por uma humilhação que não desejo a ninguém, nem mesmo ao meu pior inimigo”, desabafou António Moreira.
Distância chocante
Outra situação que retira a paciência dos cidadãos prende-se com a distância das morgues, que não acompanhou o crescimento populacional e dos bairros que diariamente nascem em Luanda. As morgues dos hospitais municipais, construídos, na sua maioria, em 2012, nomeadamente do Cazenga, Ka- palanga, Cacuaco e Sambizanga, não respondem à procura, o que faz com que os familiares vagueiem de um lado para outro, cima a baixo, com os corpos dos seus entequeridos para conseguir espaços. Em muitas situações, os corpos são transportados em situações precárias, estatelados em carrinhas abertas, motorizadas de três rodas (vulgo Avô veio) e em outras condições difíceis, representando, assim, um desrespeito à memoria do falecido e atentando à saúde púbica.