Acusadas de feitiçaria, abusadas por pastores, por alegado tratamento espiritual, e abandonadas por progenitores por separação e ainda queimadas por acusação de roubo de dinheiro de familiares, crianças chegam ao Lar Infantil Kuzola traumatizadas
O Lar de Infância Kuzola, em Luanda, acolhe, anual- mente, mais de 500 casos de crianças desamparadas e violentadas.
Neste momento, tem 53 crianças no berçário, abandonadas pelas próprias mães, de acordo com a chefe do departamento pedagógico da instituição, Elisa Sampaio.
Quem trabalha na protecção da criança neste lar retrata com lágrimas as histórias das crianças que chegam ali, com queimaduras, acusadas de feitiçaria e abandonadas pelos pais. Mas este jornal não foi autorizado a fazer fotografias das mesmas, para preservar a integridade.
Parentes próximos, como padrastos, tios, e até pastores, em nome de cura espiritual, são os que mais violentam as crianças, quando deviam ser os protectores, como nos fez saber Elisa Sampaio.
“Como um pastor vai brincar com os órgãos genitais de uma criança? E um pastor que devia ser um exemplo moral?” questiona, com lágrimas no canto do olho, para mais adiante acrescentar que são traumas com as quais as crianças crescem.
Os números de violência sexual são alarmantes, 400 mil registos de 2021 a 2024, e ocorrem maioritariamente no seio familiar. “Quem devia proteger a criança são os verdadeiros predadores, até pastores que alegam cura espiritual propõem-se a usar as partes genitais das crianças”, disse.
No meio da conversa com a chefe do departamento pedagógico da instituição, Elisa Sampaio, não faltaram lágrimas, por se mostrar muito sentida com o que passam muitas crianças que buscam amparo no Lar Kuzola.
O Lar Kuzola acolhe crianças desamparadas, abandonas pelos progenitores e acusadas de feitiçaria, dos zero aos 14 anos de idade, via de regra, trazidas pelas administrações municipais, Polícia Nacional e Tribunais de família. Chegam com trauma e a necessitarem de acompanhamento psicológico, enfatizou Elisa Sampaio.
No Lar, há uma equipa multidisciplinar, cujo objectivo é prestar uma melhor atenção aos petizes, mas conta apenas com uma psicóloga, o que, de acordo com a nossa entrevistada, é insuficiente para atender mais de 500 crianças por ano.
Enquanto não recrutam mais psicólogas, tem parceria com outras instituições, nomeadamente o Hospital Psiquiátrico de Luanda que, quando possível, disponibiliza alguns dos seus profissionais.
Por outro lado, segundo referiu, cada funcionário do lar, desde a cozinheira ao vigilante, é treinado para dar ajuda emocional às crianças por via de uma conversa positiva, por exemplo, ou interpelação amigável, para que se sintam realmente acolhidas.
No Lar kuzola, há também histórias positivas. Por exemplo, a de crianças que depois dos 14 anos idade, de saída, por força do decreto presidencial, os pais aparecem. Mas há outras, as que se casaram no Lar, dois casos, e os que foram enviados para estudar no exterior do país, por via de bolsas de estudos patrocinadas por empresas.
O Lar de Infância Kuzola é uma instituição de carácter social, criado pelo decreto presidencial n.º 189/12, que tem como objectivo o acolhimento, a protecção e educação da criança. Recebe crianças perdidas, abandonadas, órfãs e violentadas.
POR:José Zangu