A lista de espera de pessoas com queloides, no Hospital Neves Bendinha, está com cerca de 200 pacientes aflitos para fazerem a cirurgia. Apesar de ter profissionais e equipamentos para tal, o problema reside no tratamento da doença pós-cirurgia, uma vez que só existem no país dois aparelhos para tal, mas que se encontram avariados
De modo a evitar que a queloide reapareça, depois de o paciente passar por uma cirurgia deve fazer o tratamento com radioterapia, num aparelho específico para estes casos, que infelizmente no nosso país existem apenas dois: um no Instituto Angolano de Controlo de Cancro e outro na Clínica Girassol.
Segundo o médico-cirurgião plástico Nsingui António, do Hospital Neves Bendinha, esta é a realidade de muitos doentes com queloide que a unidade tem recebido, que chega os 200 pacientes, desde lombo na orelha, pacientes que se envolveram em lutas com arma branca ou que já tenham sido operados. Os doentes, com idades compreendidas entre os 15 e os 40 anos, são maioritariamente mulheres, por conta do furo na orelha para a colocação de brincos. Nsingui António explicou que o tratamento de queloide não depende apenas da cirurgia. Existem outros que são coadjuvantes, dentre os quais corticoides (anti- inflamatório não esteroide), placa e gel de silicone.
“O queloide com tamanho considerável, inicialmente, os pacientes não são submetidos a tratamento cirúrgico, mas sim a tratamento com corticoides, de modo a diminuir o tamanho e a consistência, facilitando assim a realização da cirurgia. Depois da intervenção cirúrgica, o paciente deve ser acompanhado para evitar o reaparecimento”, disse em entrevista exclusiva ao jornal OPAÍS.
Em caso de queloide gigante, depois da cirurgia os pacientes são orientados a fazer a radioterapia, mas “a nível do país existem apenas dois lugares, o IACC e a clínica Girassol, que têm este aparelho específico, mas que actualmente estão avariados”, sublinhou. O entrevistado tem pelo menos sete pacientes muito aflitos, que aguardam por uma cirurgia, mas não pode fazer nada. Uns estão a entrar em depressão, mas como especialista tenta conscientizá-los de que não adianta fazer a cirurgia sem ter a garantia do pós-tratamento, porque senão a infecção reaparece e em maior proporção.
Comichão é o que mais preocupa os pacientes
Enquanto se aguarda pelo conserto dos aparelhos, os pacientes recebem tratamento coadjuvante com corticoide para evitar o aumento da patologia, porque, quanto mais o doente vai coçando, o tamanho do queloide aumenta. Os queloides gigantes, por norma, ocupam uma parte da face e as injecções aplicadas não fazem efeito. A maior preocupação dos pacientes é a comichão, o desconforto e a estética, uma vez que o olhar constante da população incomoda o paciente e em muitos casos compromete a vida social deste.
Submetido a cinco cirurgias para retirar queloide
Foi em 1997 que o cidadão Eugénio António, de 56 anos de idade, registou o primeiro aparecimento de queloide no seu corpo. Inicialmente parecia uma borbulha normal, mas dois anos depois foi aumentando de tamanho e viu- se na necessidade de fazer a primeira intervenção cirúrgica. Só a cirurgia, como disse anteriormente o doutor Nsingui, não foi suficiente e Eugénio António viu reaparecer a patologia. Assim, em 2003 foi operado pela segunda vez, em 2010, pela terceira vez e, em 2014, pela quarta vez.
Em 2017, quando foi acompanhar a esposa a dar a luz, ao sair da maternidade Augusto Ngangula, avistou-se com uma enfermeira que o aconselhou a se dirigir ao hospital Neves Bendinha. Nesta unidade sanitária foi atendido pelo doutor Nsingui António que, depois de várias consultas, o submeteu a uma nova cirurgia, isto em 2021, como fez questão de sublinhar o entrevistado já com um semblante alegre. Eugénio António não voltou a ter a patologia, tem dado sequência ao tratamento e agradece o acompanhamento do especialista.
A sua auto-estima voltou, não sofre mais bowling, sobretudo por parte de crianças que corriam para ver ou voltar a ver o rosto coberto de queloide. “Sinto-me outra pessoa, apesar de não estar totalmente curado. Estou feliz com o atendimento que tenho recebido”, frisou, realçando que procurou saber junto da família se alguém teve queloide, mas os anciões disseram que não, razão pela qual defende não ter adquirido a doença por questões genéticas.
Burlado na procura de solução para o seu problema
Outro paciente com queloide é Samuel Sebastião, que veio da província do Uíge para encontrar tratamento da patologia na capital do país. Antes de chegar em Luanda, conta que foi burlado por pessoas que se fizeram passar por médicos. “Pediram para enviar saldo e, de seguida, mandaria uma equipa de médicos a minha busca em casa para ser submetido à cirurgia”, disse. Samuel pediu empréstimo de sete mil kwanzas, que comprou saldo e enviou os códigos aos malfeitores, tal como tinha sido orientado.
Aguardou pela equipa médica e depois de mui- to tempo deu-se conta de que tinha sido burlado. Explicou que convive com a enfermidade há dois anos, sente muita comichão, regista aumento considerável, sai pus e água com mal odor. Um dos irmãos de Samuel conta que a situação do seu parente tem sido muito difícil para todos. Há quatro meses que o acompanha em diferentes unidades sanitárias em busca de melhorias, além do facto de a situação financeira não ser das melhores.
Pelo facto, almeja que o seu irmão seja operado o quanto antes, de modo a ver ultrapassado este sofrimento. Na família, o queloide é hereditário: a mãe tem. Além de Samuel, mas dois irmãos têm. Entretanto, o caso mais grave é o de Samuel.