Com especialidade em Saúde Pública e Administração em Saúde, o médico radio-oncologista António Armando é docente da Universidade Privada de Angola (UPRA) há mais de cinco anos. Constituído presidente do Conselho Científico do Congresso Internacional de Medicina, a ser realizado pela segunda vez, no próximo mês de Julho, o entrevistado acredita que a actividade subordinada ao tema “A Saúde Pública: Transversalidade na Atenção Primária Sustentável” é de particular importância, ao ponto de despertar a atenção do Ministério da Saúde e de outros actores da área para assuntos relacionados com o sector
Avizinha-se o segundo Congresso Internacional da UPRA. Quais são os principais pontos que imprimem relevância nesta actividade?
Este Congresso terá lugar nos dias 5, 6 e 7 do mês de Julho, e será antecedido de cursos pré-congresso, que terão lugar nos dias 3 e 4 do mesmo mês. O objectivo do congresso é abordar a questão da saúde pública numa perspectiva transversal, tendo em conta os cuidados primários de saúde.
Pode enumerar os eixos de actuação do evento?
Sim. Nós temos dez eixos, que vão desde a atenção primária; sistema de informação; sistema de referência e de contra referência; vigilância sanitária, doenças crónicas não transmissíveis; doenças infeciosas e a saúde materno infantil. Esses são os eixos que nós temos. E, ao longo do Congresso, nós perspectivamos termos cerca de 11 conferências e 17 mesas redondas. Temos como convidados para preleção cerca de 63 entidades e para moderação 28.
Os convidados serão apenas nacionais?
Não. Teremos nacionais e internacionais. Dos internacionais te- remos docentes que virão do Brasil, de Portugal e também de outros países?
Quais foram os critérios para definição destes temas?
Acontece que a atenção primária é a base da saúde, porque lá é onde tudo acontece. Quando as pessoas adoecem, a maior parte vai aos cuidados primários de saúde. E considerando a importância dessa temática, no nosso Sistema Nacional de Saúde, fez com que a Universidade escolhesse esse te- ma. Como temos tido uma certa abordagem hospitalocêntrica, então, acreditamos que com este Congresso vamos despertar não só os nossos estudantes de medicina, mas também os profissionais de saúde e o próprio Ministério da Saúde.
A universidade está a oferecer à sociedade angolana uma oportunidade de revisitar aqueles conceitos que os profissionais de saúde tiveram ao longo da sua formação, mas também novos paradigmas que estão a emergir no mundo académico da saúde, porque o profissional tem de ser um indivíduo actualizado. A universidade está a trazer este elemento que acreditamos que vai contribuir não só na prevenção de doença, mas também no controlo. Será um momento importante e funda- mental para o nosso Sistema Nacional de Saúde.
Nesses termos, qual é a análise que faz dos cuidados primários de saúde no país?
A análise que eu posso fazer é que, felizmente, estamos numa abordagem incremental. Tem havido melhorias em termos de disponibilidade de serviço público de saúde. Se fizermos uma análise comparativa, em relação ao passado, hoje já temos mais unidades sanitárias a nível primário; já te- mos mais profissionais a actuarem a nível dos cuidados primários de saúde. Mas, como eu dizia, é numa abordagem incremental.
Não chegamos ainda ao nível desejado. Então, é preciso fazer esforços no sentido de continuarmos a trabalhar juntos numa abordagem multidisciplinar e intersectorial para podermos caminhar juntos. E a universidade está a jogar um papel muito importante para que se possa alcançar esses elementos que eu fiz referência. Não é só o congresso, a universidade forma técnicos de saúde de várias dimensões, desde médicos, fisioterapeutas, enfermeiros, dentistas, psicólogos clínicos. Para além da formação, nós também investimos na investigação e na extensão universitária.
Relativamente à extensão universitária, a instituição tem projectos em carteira? Nós temos projectos que vamos desenvolver este ano. Estes visam melhorar a situação de saúde da população que se encontra a nossa volta. Oferecemos também cursos de curta duração para actualizar os nossos profissionais, e outros da nossa praça que desejam melhorar os seus conhecimentos, para melhor actuação na área profissional.
Pode avançar mais detalhes relacionados com esses projectos?
Por exemplo, temos um projecto onde pretendemos conhecer o estado da saúde da população do Talatona em relação às doenças infeciosas, crónicas. Por exemplo, as relacionadas com a pressão arterial e as diabetes. Temos projectos também que visam melhorar o nível de literacia dessa população em termos de saúde. Estou aqui a falar da educação da saúde, porque a é um elemento fundamental e, ao longo do Congresso, vamos abordar essas temáticas.
Teremos convidados de referência, estamos a perspectivar a ministra da Saúde para fazer o discurso de abertura; teremos a representante da Organização Mundial da Saúde em Angola para abordar sobre as perspectivas dos cuidados primários da Organização Mundial da Saúde. Teremos a directora nacional de Saúde Pública, que é uma pessoa com domínio aprofundado sobre os cuida- dos primários de saúde. Vamos olhar para questão da saúde materno infantil no nosso país; quais são as experiências de outros países e que modelo podemos adoptar para melhorar a nossa situação. Os palestrantes vão apresentar as suas experiências.
Qual é o público-alvo da actividade?
Nós direcionamos esta actividade para todos profissionais de saúde. Sejam aqueles que actuam na área profissional ou na área estratégica. Mas, mais do que os profissionais de saúde, todos os profissionais que se interessam na matéria de saúde estão convidados, porque o próprio tema diz: Transversalidade. Vamos abordar, por exemplo, as determinantes sociais da saúde: a questão da água, do ambiente, da alimentação e da economia. São factores que condicionam a saúde. Essa transversalidade faz toda diferença. Isso pressupõe que teremos sociólogos, economistas e ambientalistas.
Então, existem critérios a cumprir para a participação?
Haverão pessoas que serão convidadas, como os palestrantes e os convidados especiais. Algumas pessoas, como se faz internacionalmente, poderão fazer aquisição do ingresso a um valor simbólico. É preciso entender que é um momento em que o individuo vai aprofundar os seus conhecimentos; que vai melhorar a sua abordagem na área clínica. É um momento rico para o profissional de saúde, então o valor que vamos cobrar é simbólico. Não acredito que as pessoas escusem de participar do congresso por causa desse valor. Temos certeza de que
haverá uma participação em massa.
No final, qual é o custo de inscrição?
Como eu dizia, nesse momento, essa parte está com a área da contabilidade. Não tenho informações ainda sobre os custos de participação.
Quantos participantes a universidade perspectiva receber?
Estamos a perspectivar receber cerca de dois mil participantes. Porque nós teremos quatro salas. O Congresso vai decorrer no HCTA. Temos uma sala com mais de 200 pessoas, temos mais duas salas de 80 e uma outra de 160 participantes.
As conferências vão decorrer em simultâneo?
Sim. Vão decorrer em simultâneo. Como haverá profissionais de várias áreas, então cada participante vai escolher as temáticas que são da sua área de actuação, ou da área que lhe interessar, para que não haja monotonia.
Em termos monetários, em quanto está a avaliado este congresso?
A parte do valor não posso precisar, porque eu estou na área científica. Mas, dizer que isso não será um custo, será um investimento. Nós vemos na perspectiva de investimento. Aliás, hoje, as universidades são obrigadas a investir na extensão universitária, na investigação científica e na formação de curta direcção. Então, nos estamos a cumprir as três directivas.
Na prática, quais são as soluções que este Congresso poderá trazer para se melhorar os cuidados primários de saúde no país?
Vamos trazer profissionais, ou seja, palestrantes de alto nível, que vão trazer o melhor que existe em cada área, e, ao nos trazer o melhor que existe em cada área, os participantes, sejam aqueles que estão no nível de execução, ou que estão no nível da concepção das políticas, vão ter esse conhecimento para depois implementarem nas suas áreas de actuação. Os gestores vão sair daqui com a perspectiva de que qualquer tecnologia que pensarem implementar nos seus serviços, ou até a nível nacional, terão de fazer esta abordagem. A avaliação tecnológica em saúde tem em conta se a tecnologia funciona; qual é o custo dessa tecnologia, e qual é a vantagem real que vai trazer em termos de cura, em ter- mos redução de morte e se o custo justifica.
A Organização Mundial da Saúde recomenda que se implemente aquela abordagem que são chamadas de custo efectivo, ou seja, aquela abordagem em que eu gasto pouco dinheiro, mas consigo obter bons resultados. Se o gestor não tiver essa dimensão, poderá fazer aquisição de alta tecnologia que vai custar muito caro à instituição, ou, às vezes, ao país, mas que na prática tem poucos benefícios.
Tendo em vista o volume de conhecimento que se pretende parti- lhar, está previsto um plano de reporte aos decisores do país?
Depois do final do Congresso, vamos fazer um relatório. Inclusive, todas as abordagens serão apresentadas numa revista. Há um aspecto que não fiz referência, é que vamos dar a possibilidade de as pessoas que desenvolveram as suas investigações científicas submeterem essas investigações. Nós vamos avaliar e classificar, e aquelas que forem relevantes terão oportunidade de apresenta- las. O melhor resumo terá direito a um prémio.
Qual será o prémio?
(Risos). Isso está no segredo dos deuses.
Os conhecimentos partilhados no primeiro congresso foram reportados aos que têm poder de decidir neste sector?
Sim. Porque nós elaboramos uma revista e todas abordagens estão nessa revista, que está a ser distribuída, gratuitamente. Então, os decisores têm acesso.
Consegue dizer se foram implementados e está a causar alguma mudança no Sistema de Saúde?
Eu acho que sim, porque, se olharmos para o Sistema Nacional de Saúde, há uma maior preocupação – não é que nós sejamos o único motivador disso – na questão dos cuidados primários de saúde. Recentemente, ouvimos que haverá um concurso público que vai incorporar um elevado número de profissionais que vai actuar na atenção primária de saúde.
Parece que está tudo dito a respeito desse evento, a não ser que tenha de acrescentar algum detalhe.
Gostaríamos de agradecer ao jornal OPAÍS, e dizer que a Univer- sidade está a promover esse mo- mento para partilha de conheci- mento. Convidamos todos os pro- fissionais de saúde a participarem. Muito obrigado!