Conhecido pelas suas posições, o presidente da Associação Industrial de Angola (AIA), José Severino, fala, nessa entrevista, da necessidade de se adoptar medidas de crescimento económico para acompanhar o crescimento demográfico. Apesar de não acreditar nas metas avançadas pelo Governo para se alcançar a auto-suficiência alimentar, diz ser positivo o surgimento do PLANAGRÃO, PLANAPESCAS e o PLANAPECUÁRIA e apela para que outras áreas com potencial para produzir café, sisal e outras culturas não sejam esquecidas. O economista entende que é um desrespeito à Constituição quando se entrega talhão à população para a auto- construção dirigida
Como olha para o actual momento económico e social do país?
É um momento muito desafiante, porque nós tivemos sete anos de estagnação económica e sete anos em contra ciclo de crescimento populacional. Se o país tivesse crescido o mínimo que um país nas nossas condições teríamos crescido no mínimo a 30%, uma média de 4,5%. Portanto, o nosso fosso económico e social é a soma desses dois factores, e a situação é extremamente desafiante porque isso redunda num défice de qualidade de vida e sem crescimento económico é difícil combater o desemprego. O Governo e to- dos nós temos que ter a apreciação e consciência rigorosa que não podemos gerir a crise. Quem gere a crise são países estruturados que têm baixas taxas de desemprego, segurança social e educação dos seus filhos garantidas.
E o que um país como Angola deve fazer com a crise?
Angola não deve gerir, mas combater a crise…
Com que armas?
Com várias armas, e posso citar algumas, como a medida de abertura nos vistos como foi feito agora. É uma medida de combate à crise, porque nós precisamos crescer para recuperar esse défice. Para acompanhar o crescimento demográfico nos anos que se seguem precisamos crescer no mínimo a 12%. Crescer a este nível com base nos nossos recursos passa muito por melhorar a nossa educação e o nosso serviço de saúde, onde há até esforços extraordinários em infra-estruturas, mas a qualidade não está a melhorar, e sem termos uma melhor capacitação do capital humano dificilmente sairemos da crise. Há ganhos na saúde, mas a morte é muito presente nas nossas famílias e parece que é preciso agregar outros valores de fora para termos melhorias na educação e na saúde. Uma das medidas que precisa- mos no sector produtivo, e é uma iniciativa que a AIA tem lançado há 12 anos, é o de termos na área técnica a formação dual (estratégia de aprendizado que se baseia na colaboração entre escolas profissionalizantes e empresas locais ou internacionais, que permitem a formação de um aluno e futuro profissional).
Teríamos outros resultados com a formação dual?
É o que fez a maior economia da Europa, a Alemanha, é o que fez o Brasil para resolver o problema da habitação com muitos especialistas de qualidade. E nós estamos a resolver o problema da habitação com quem? Com chineses e portugueses…
E quem poderia operacionalizar esta formação dual?
O Ministério da Educação diz: “Severino, gostaríamos de ser líderes nesses projectos, mas temos muitas outras preocupações”. A AIA quer liderar, mas quando a AIA pede a isenção de impostos para que as empresas possam investir em condições para termos formação dual, até hoje não conseguimos que o Governo crie condições, porque você para receber jovens tem que ter condições, financiar a alimentação, uniforme, seguro, equipamento e um mestre que os oriente. Por isso, estamos a pedir ao Governo que faça um despacho para que as empresas possam investir em condições para terem o processo de formação dual, que começa quando o jovem entra no primeiro ano do ciclo médio. É assim que a Alemanha cresceu.
Voltando a crise, ela está a ser mais sentida na cozinha com a alta de preços dos alimentos. Acha que o PLANAGRÃO, PLANAPESCAS e o PLANAPECUÁRIA são caminhos para a diminuição do défice alimentar e atingir a auto-suficiência alimentar, até 2027, como prevê o Governo?
É um desafio porque nós temos um défice, como você diz, quer em qualidade, quer em quantidade. Nós temos sérios problemas de nutrição e estamos a ver com o Ministério da Saúde o problema das diabetes, o problema das cirroses, crianças com tromboses (…). É um desafio porque a população cresce, e se cresce algumas bocas têm que ser alimentadas. Não acredito que o PLANAGRÃO e os PLANAS resolvam o problema da nutrição até 2027, porque a população cresce e há um défice, mas é uma excelente iniciativa para combater o défice que nós temos, isto é, reagiu-se diante do problema que nós temos, o que quer dizer que não se está a gerir, está-se a combater. Portanto, bem-vindo aos PLANAS, mas para termos auto-suficiência alimentar ainda estamos longe, porque nós temos que ver os índices alimentares de acordo com os indicadores da FAO.