O economista Yuri Quixina analisa nesta edição da Economia Real, o novo Plano de combate à pobreza, o apelo do ministro da Economia e Planeamento, que atribui aos governadores a responsabilidade de atracção de investimentos e outros temas
POR: Mariano Quissola / Rádio Mais
A actualidade política no Brasil foi marcada com a prisão de Lula da Silva que alega ter cometido o crime de tirar populações da pobreza.
Os réus têm argumentos. As pessoas que Lula disse ter tirado da pobreza estão a voltar à pobreza. Penso que Lula comprou a obediência dos pobres. Muitos deles choraram ao seu lado, no sindicato dos metalúrgicos. Essa tirada de pobres foi artificial.
O ‘regresso à pobreza’ terá sido falta de estratégia de continuidade dos projectos?!
Não. Faltou um modelo virado para a produção. O modelo económico de Lula assentou muito no consumo, porque o cenário macro-económico, na altura, era favorável. O Brasil foi a quinta maior economia nos BRICS através da matéria-prima.
Falemos de educação. Qual é o seu sentimento relativamente à greve dos professores?
É preocupante. Eu sou professor, embora noutro nível. Sabemos que a educação é fundamental para o desenvolvimento, mas não queremos dar a atenção merecida. É fácil resolver os problemas da educação, se o Governo dedicar-se só às suas funções e deixar que a economia seja feita pelas famílias e empresas.
A greve arranca 10 dias depois do prazo de execução do Plano Intercalar que também visava solucionar “os problemas prementes” da Educação. O que lhe parece?
Compreende-se, pois o Plano Intercalar não foi implementado nem pela metade e as poucas acções que foram executadas não são da economia real, são mais do sector financeiro.
Há correntes que apelam ao patriotismos dos professores, a julgar pelo momento de crise que o país vive. Concorda?
Aí, estamos a confundir o significado de patriotismo. Patriotismo não é ficar sem pão na mesa e as crianças morrerem por doença. Um professor cujo salário sofre a erosão da inflacção é patriota?
Qual é o seu conceito de patriotismo, afinal?
Patriotismo é fazer o bem e não o mal, para o país se desenvolver. Gostaria de lamentar e prestar homenagem ao responsável do sindicato dos professores em Benguela, que foi encontrado morto e pêsames à família, augurando que não voltem a acontecer situações do género noutras províncias.
No plano económico, o ministro da Economia e Planeamento, declarou no Namibe que a atracção de investimentos depende dos governos provinciais. Qual é sua visão?
Em parte. A atracção de investimentos nas províncias depende de uma política macro e não de um simples governador que, no fundo, é suplementar. O ministro quer fugir das suas responsabilidades. Quem aumentou os problemas na economia com políticas macro-económicas viradas para o consumo não foram os governadores. Quem aumenta o capital humano numa economia não é o governador. Na China foi o governo chinês, nos Estado Unidos foi o governo americano. Isso é política de Estado.
Está a ilibar os governadores de toda a responsabilidade da governação local?
A forma como está montado o modelo não dá prioridade aos governadores. A atracção de investimento estrangeiro tem a ver com políticas macro-económicas viradas para a produção, redução de custo de produção e política cambial. E isso não é da responsabilidade do governador. Lembro-me do antigo governador de Benguela, Isaac dos Anjos, que criticou a Administração Geral Tributária.
Mas o governador pode influenciar as estruturas de decisão para flexibilizar os impostos, por exemplo?
É o mínimo que ele pode fazer e sensibilizar o povo que dirige para alterar a mentalidade, valores, princípios e amor à produtividade.
Quer dizer que o discurso do ministro é um “jogo de empurra”?
É isso que dá a entender. Estamos a falar de um ministro muito importante, Economia e Planeamento. Penso que devia ter ajudado melhor os governadores.
No sector financeiro, a BODIVA negociou mais 60 mil milhões de Kwanzas no mercado da dívida pública. O que isso quer dizer?
Significa que o dinheiro que o Estado anda a tirar da economia tem aumentado cada vez mais. Significa que as famílias e as empresas não terão dinheiro. Significa que o mercado de capitais é do Estado. Se o Brasil fez ‘bolsa família’, nós estamos a fazer ‘bolsa banqueiro’. Os banqueiros fazem lucros com o Estado e através do Estado.
Ainda está à espera do balanço final do Plano Intercalar?
Penso que o Governo deve vir a público explicar se há uma outra filosofia. É fundamental comunicar com o mercado. O que falhou, o porquê e quais são as mediadas alternativas.
Enquanto isso surge o ‘Plano Integral de Desenvolvimento Local de Combate à Pobreza’. É esse o caminho?
Se esse plano estiver virado para a criação de emprego, sim. Agora, se for de distribuição de dinheiro aos pobres, estaremos a comprar a obediência e os sentimentos dos pobres , o que pode agudizar ainda mais a pobreza.
Parece que você não acredita em nenhum programa público. Por quê tanto cepticismo?
Não é cepticismo, o fundamental é estruturar e sistematizar as ideias. Temos muitos planos e programas. O programa-mãe deve ser aquele que liberta a economia para o crescimento.
Sugestão de leitura:
Título do livro: “A Lanterna na Popa”: memórias do economista, embaixador, ministro e deputado federal, um bem escrito panorama da política, do poder, e da economia, no Brasil e no mundo, nos últimos 50 anos. Autor: Roberto de Oliveira Campos. Ano da publicação: 1994 Volume 2