Volvidos cerca de um ano desde a redução do Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) de 14 para 5% em 20 categorias de produtos alimentares de amplo consumo, o economista José Sapi entende que ainda não está a ter o impacto desejado para as famílias angolanas. O também economista Eduardo Manuel tem entendimento contrário e fala em aumento do poder de compra da população de baixa renda, embora muitos bens da cesta básica ainda dependam de importações
A redução do Imposto sobre o Valor Acrescentado representou, para José Sapi, uma boa iniciativa, mas, apesar dessa condicionante, pensa que tal medida ainda não se tem reflectido positivamente na vida do consumidor final. Para sustentar a sua tese, recorre a um exemplo de um investidor que tem de pagar o IVA ao adquirir um produto o qual coloca no seu supermercado à disposição do consumidor.
Contas feitas, esclarece, o produto final acaba por ficar mais encarecido. “Irá ficar um determinado preço, tendo sempre em conta o tipo de imposto que ele pagou para ter o produto lá em stock ou nas prateleiras”, ilustra Sapi.
O economista sublinha que, olhando para a economia real, se percebe logo a tendência de aumento de preços de produtos da cesta básica, o que, em certa medida, deixa famílias numa posição de aflição, por estarem, sistematicamente, a perder o poder de compra.
“Parece ser um elemento que está a surgir em contramão”, adverte o especialista, realçando que o sucesso da economia depende de outros elementos, alguns dos quais faz questão de os elencar. “Por exemplo, os produtos que são fornecidos ao mercado angolano não têm sido suficientes, olhando para a questão da procura.
Havendo esse desequilíbrio entre a procura e a oferta, a probabilidade de número de pessoas interessadas em adquirir um bem é maior”, reforça. Ao jornal OPAÍS, ressaltou que esses factores, que menciona acima, têm vindo a assolar a vida da população no que se refere ao acesso a bens, fundamentalmente os de primeira necessidade.
‘Importação não desacelera produção’
O economista nutria esperança de que o decreto exarado pelo Presidente João Lourenço sobre a redução do IVA, fruto da boa vontade do Chefe de Estado, fosse ter reflexos positivos na vida do cidadão final, mas acabou por se esbarrar na escassez de produtos no mercado.
De sorte que, defende, a melhor forma de combater aquilo a que chama de «fenómenos económicos» é, de resto, abrir o país para a importação. Sapi coloca o acento tónico nesta questão para advertir que o país, em função do seu quadro produtivo, ainda não se deve dar ao luxo de abandonar, de todo, a questão relativa à importação de produtos.
“Temos que abrir as importações, principalmente daqueles produtos que temos em pequenas quantidades. Você não pode, por exemplo, proibir a tua mulher de ir pedir o sal à vizinha quando você não dá dinheiro para ela comprar. Isso acontece com as economias”, resume o especialista.
Diz compreender as razões de haver um certo receio quando o assunto é importação, mas vê nessa medida a via de baixar preços de alguns produtos e, por conseguinte, aliviar a vida do cidadão comum, sem, no entanto, comprometer a «política proteccionista do Estado», cujo objectivo seja o de fomento à produção nacional.
“É falsa a ideia de que a importação belisca a produção interna. Colocaram-nos na cabeça de que, quando estás a apostar fortemente na produção nacional, se importares vais desacelerar a produção nacional. Não é verdade. É possível, sim, uma coabitação entre a importação e a produção nacional’’, realçou.
Exemplifica que o Brasil, apesar de ser um grande produtor de arroz, está entre os que importam esse tipo de cereal, para não criar ruptura de stock e proporcionar equilíbrio no mercado. “E, outrossim, que é bastante importante: nós temos vindo a discutir se Angola tem ou não liquidez. A melhor forma que nós temos de resolver problema de dinheiro só tem que ser por uma via, o perdão económico”, defende.
Aumento do poder de compra
O também Economista Eduardo Manuel enfatizou que a redução do IVA aumentou o poder de compra da população de baixa renda para alguns produtos, embora muitos bens da cesta básica ainda dependam de importações.
Para Eduardo Manuel, a redução do IVA contribuiu para o aumento das receitas fiscais do governo, pois a diminuição dos preços resultou em maiores vendas dos produtos da cesta básica, impactando positivamente as receitas das empresas.
Destacou que a capacidade do governo em financiar programas sociais e estruturais aumentou, mas o impacto seria maior se houvesse uma diminuição nas taxas de câmbio do Kwanza em relação ao dólar e euro. O especialista acredita que a redução do IVA, a longo prazo, será um desafio e uma oportunidade para o governo.
Desafio pela necessidade de receitas imediatas e oportunidade por provocar o aumento das receitas e a redução das despesas operacionais das empresas. O economista enfatizou ainda que os empresários tiveram apenas que adaptar a sua facturação à nova taxa do IVA, o que resultou em custos operacionais, visto que isso envolve alterações de facturas e rótulos de preços.
“Mas estes custos foram compensados com a diminuição do IVA e as operações diárias não foram afectadas, pelo contrário”, aclarou. No que ao aumento dos custos de produção diz respeito, Eduardo Manuel sublinha que, devido ao aumento da taxa de câmbio e dos combustíveis, tem levado os empresários a não terem alternativas, senão aumentar os preços dos bens e serviços.
“Neste momento, os preços dos bens e serviços ainda continuam ‘reféns’ da evolução da taxa de câmbio do Kwanza em relação ao dólar e euro”. É recomendável, acrescentou, que se continue a intensificar o investimento no sector não petrolífero, através do financiamento às micro, pequenas e médias empresas. A política de financiamento à economia não deverá depender apenas dos bancos comerciais e de investimentos.
POR:Constantino Eduardo, em Benguela e Francisca Parente