A redução dos subsídios de instalação e de estímulo atribuídos, bem como a atribuição de residências de apoio aos gestores públicos, de forma a diminuir os gastos públicos, poderá garantir ao Executivo uma folga financeira para investir em sectores prioritários e que carecem de maior urgência, com vista a proporcionar uma vida melhor aos angolanos, afirmou, ao jornal OPAÍS, o economista Mateus Congo
O especialista considera assertiva a exclusão na lista de encargos financeiros do Estado dos subsídios de manutenção de residência e de reinstalação, alegando que vai contribuir na redução do peso financeiro dos cargos públicos.
Conforme noticiou este jornal na sua edição de quarta-feira, o Executivo vai limitar, a partir deste ano, o salário para funcionários públicos em acumulação de funções nos sectores Educação, Ensino Superior e Saúde, estabelecendo que só pode ser no máximo de 50% da remuneração da categoria em que está enquadrado e deve passar ao vínculo de colaborador.
“Nas situações em que é admissível, por inerência de funções, a acumulação em diferentes Unidades Orçamentais, a remuneração deve ser inferior a 100% do salário base”, lê-se no documento a que o jornal OPAÍS teve acesso.
Por outro lado, aplica restrição às regalias de todos os órgãos do sistema orçamental e empresas que beneficiem de recursos do OGE, em 25% o subsídio de instalação para todos os beneficiários e em 50% o subsídio de estímulo, cujo pagamento deve ocorrer em parcela única.
Solicitado a analisar o assunto, o economista Mateus Congo afirmou que o país tem uma máquina pública, sobretudo relacionada com cargos de direcção e chefia, que é demasiado burocrática pelos gastos que o Estado faz com manutenção de residências e a aquisição e manutenção de viaturas.
Invocou também que há necessidade de se proceder a uma reorganização do parque automóvel do Estado, no sentido de se perceber até que ponto precisa-se ou não de se continuar a adquirir estes meios de transporte.
Para o nosso interlocutor, urge a necessidade de se fazer um inventário sobre o parque automóvel do Estado, de modo a aferir se há um excesso de viaturas topo de gama, pelo facto de existirem fortes indícios de que alguns gestores não estão a evitar desperdícios e a má gestão.
“Nós temos estado a verificar alguns governos provinciais e até ministérios a fazerem certos investimentos que vão em contramão à necessidade de se melhorar a qualidade da nossa despesa pública. Estamos, no fundo, a dizer que não estão a evitar desperdícios e a má gestão”, afirmou.
Mateus Congo explicou que ao se adquirir bens ou serviços que não são essenciais para o organismo e, sobretudo, para a vida das pessoas, se está passar a mensagem de que são despesas que não impactam positivamente as finanças públicas.
“Executivo deve repensar a aquisição de viaturas topo de gama”
O economista é de opinião que o Executivo deve repensar se há efectivamente necessidade do Estado continuar a adquirir viaturas topo de gama para os mais variados titulares de cargos públicos, sejam estes da administração central ou da administração local.
Uma acção que considera ser fundamental para se ajustar à particularidade dos bens que são entregues aos titulares de cargos públicos.
“Convenhamos que os carros de alta cilindrada, os carros topo de gama, são um peso excessivo para as finanças públicas”, frisou.
Acrescentou de seguida que “o Estado pode efectivamente adquirir carros mais modestos, que respondam às necessidades da função e poupar algum volume financeiro que vai servir para investimento noutros sectores que, nesta altura, são prioritários para a vida das pessoas como da educação, da saúde e infra-estruturas”.
Segundo a fonte, existem muitos bens adquiridos pelo Estado, ainda dentro do período de vida útil e em bom estado técnico que são passados para a esfera privada, muitas das vezes em desrespeito aos padrões definidos legalmente para a amortização.
Por outro lado, advoga que se deve não só acompanhar como estas reduções estão a ser feitas, como garantir também uma melhoria e, até, mais responsabilização por parte dos entes que gerem orçamentos públicos.
Um processo que passa por haver maior responsabilização, sobretudo na prestação de contas por parte desses entes.
Em relação ao apelo para se reduzir os custos com consultoria externa, sublinhou que os entes públicos continuam a recorrer em demasia a esse serviço, quando já existem no país especialistas que podem fazer e bem o trabalho que é feito pelas consultoras externas.
A título de exemplo, contou que há jovens angolanos que foram ao exterior fazer cursos de pós-graduação nas mais variadas áreas que, uma vez retornados, podem servir de consultores, de assessores para os mais variados entes públicos.
“É hora de começarmos a valorizar cada vez mais os especialistas nacionais, atribuir mais responsabilidades aos jovens pesquisadores, investigadores e tecnocratas nacionais porque não deixam nada a dever quando comparados com os especialistas de outras geografias”, frisou. Salientando que se deve recorrer ao exterior, quando não houver especialistas nacionais.
Sem subsídios de manutenção de residência e de reinstalação
Quanto à retirada dos subsídios de manutenção de residência e de reinstalação, o especialista alerta que se deve fazer o devido acompanhamento pelo facto de existirem titulares de cargos públicos que, depois de cessarem as funções, se apropriam das casas de funções.
O que tem feito com que o Estado se veja na obrigação de adquirir uma nova residência para atribuir ao seu substituto. “Isto ocorre também com as viaturas.
O que, de certa forma, indica má gestão ou péssima qualidade da despesa pública, porque o Estado não pode adquirir ou continuar a adquirir bens para uma função que, depois, até antes do prazo de vida útil deste bem, seja passado da esfera privada das pessoas”, argumentou.
Para pôr fim a estas práticas, de acordo com a fonte, o Executivo tem de melhorar os mecanismos de controlo da passagem dos bens públicos da esfera do Estado para a esfera privada, posteriormente ao exercício da função.
“Há necessidade de se continuar a melhorar os mecanismos de controlo, de entrega dos bens aos titulares de cargos públicos, sejam estes habitacionais ou automóveis”, enfatizou.
Mateus Congo defende que os titulares de cargos políticos, magistrados e outros beneficiários, que quiserem colocar à disposição da sua residência, devem adquiri-las com os seus próprios recursos financeiros.
“Esta medida deve ser incentivada, deve ser louvada, porque nós costumamos dizer que temos um Estado demasiado pesado e o peso vai ser reduzido ao cortarmos estas gorduras”, desabafou, sublinhando que o Estado não deve comprar uma viatura e atribuir à residência de deputado, governador, ministro ou magistrado.
Os três pilares que suportam a despesa pública
O especialista alerta que é importante que se faça melhor aproveitamento desta gordura que vai retirar. No seu ponto de vista, uma boa despesa pública estará sempre relacionada com eficiência, transparência e responsabilidade.
Estes três elementos são princípios que devem nortear os gastos públicos, no sentido de permitir que haja melhoria na alocação de recursos e nos serviços públicos.
Para si, as medidas que têm estado a ser tomadas para controlar e garantir a eficiência das despesas públicas são positivas na medida em que permitem que os entes públicos, sobretudo aqueles que fazem despesas públicas, consigam melhorar a qualidade das despesas públicas.
Ao fazer uma análise sobre a qualidade das despesas públicas em Angola, considerou que temos uma despesa pública ainda de má qualidade por diversos factores, entre os quais, o facto de as despesas não estarem em linha de conta com as prioridades do país. Isso por serem muitas as despesas realizadas que não se reflectem os anseios das pessoas.
Sindicato dos Professores de Ensino Superior congratula-se com a medida
O secretário-geral do Sindicato Nacional dos Professores de Ensino Superior, Eduardo Peres Alberto, disse que a pretensão do governo em retirar os subsídios aos docentes com dupla efectividade iniciou há quatro ou seis anos, com a promoção da política de combate à dupla efectividade, o que considera ser positivo por se tratar de uma violação flagrante da lei.
No entanto, salienta que, em contrapartida, o diálogo entre a entidade patronal, que é o Governo, e os trabalhadores deve ser a melhor via para que este possa exercer o seu direito de escolher qual é a instituição que pretende continuar a trabalhar.
“A escolha dos trabalhadores é fundamental para que não prejudiquemos mais a qualidade do Ensino Superior, que já deixa muito a desejar por falta de investimentos sérios do Estado”, desabafou.
O líder sindical apela às autoridades governamentais a realizarem uma campanha de auscultação dos gestores também.
De salientar que, entre as medidas de controlo e eficiência da despesa pública que o Executivo pretende implementar, está também a suspensão dos direitos à subvenção mensal vitalícia aos beneficiários remunerados de forma cumulativa, salvo se o beneficiário optar por receber exclusivamente a subvenção mensal vitalícia.
“É proibido indexar regimes remuneratórios à moeda externa e a indexação das despesas variáveis à moeda externa”, lê-se no documento, ao qual OPAÍS teve acesso.
Dívida pública acima de 60% do PIB
Oeconomista afirmou que a dívida pública está situada acima de 60% do Produto Interno Bruto (PIB), o que à partida demonstra que as despesas públicas, até certo ponto, podem ser insustentáveis ou podem pressionar as finanças públicas, no sentido de realizar investimentos que respondam efectivamente às vidas das populações.
No seu ponto de vista, isso coloca, à partida, desafios a quem realiza os investimentos e elabora a estratégia de desenvolvimento do país, porque ao não se registar crescimento económico pressupõe dizer que os desafios para aplicar as outras variáveis da equação crescimento económico versus desenvolvimento socioeconómico.
“Felizmente, no último ano, tivemos um crescimento económico que pode ser considerado satisfatório, se olharmos para a taxa de crescimento populacional, mas, nos últimos anos, temos estado a verificar que o nosso crescimento económico se situa sempre abaixo do crescimento populacional”, frisou.
Mateus Congo explicou que uma boa despesa pública vai sempre ser um elemento que promove a redução dos níveis de endividamento.
“E hoje, quando olhamos para os níveis de endividamento do nosso país, vamos perceber que exige das finanças públicas e até de toda a sociedade um olhar prudencial na medida em que os níveis são altos”, frisou.