O Ministério da Agricultura justifica, na decisão, que existem condições para a produção local dos referidos produtos e subprodutos de origem animal, que estará vetado à importação e não serão emitidas licenças.
Na lista dos produtos proibidos, para bovinos, estão miudezas, dobradas, rins, fígado, rabinho, cabeça, coração e pulmões, enquanto para aves constam a asa de peru, galinha e pato, moela, coração, dorso (carcaça), pescoço e fígado.
Nas aves, estarão ainda proibidas a importação de coxa, coxa de galinha rija, coxa de peru e coxinha. No que diz respeito à lista de produtos de origem suína, fazem parte a cabeça, máscara, orelha, focinho, rabinho, esterno, fígado, pescoço, coração e as miudezas.
Entretanto, o economista Ciel da Conceição diz que, com esta decisão, se vai diminuir, significativamente, a pressão do volume de divisas que é gasto para importação desses produtos. O consumo local fará com que se precise menos de moeda estrangeira para importação deste produto e, consequentemente, abrirá espaço para que o Banco Nacional de Angola e a banca comercial canalizem as divisas para outros sectores.
Ciel da Conceição acredita, ainda dentro dos benefícios, que os produtores nacionais de bovinos, suínos e aves serão encorajados a produzir o suficiente para abastecer o mercado interno. Adicionalmente, aponta que se vai recrutar mais força de trabalho, principalmente para jovens e, com isso, tirar do desemprego muitos angolanos que se encontram nesta situação.
Sublinha, todavia, que haverá necessidade de se fazer investimentos em unidades de processamento para se colocar os produtos no mercado. Olhando para as possíveis desvantagens, diz que, se produção nacional não conseguir compensar o volume que for deixado pela importação, a medida imediata será o aumento de preços nos produtos, o que vai aumentar a factura do consumidor.
Por outro lado, explica que haverá, igualmente, consequências nas estruturas que suportam o negócio da importação, como a actividade dos despachantes, que registará baixa nos primeiros meses da medida.
Em relação ao tempo, Ciel da Conceição entende que, se os produtores nacionais não forem avisados previamente, poderá se registar constrangimentos, pois o tempo mínimo para a preparação de infra-estruturas de apoio e o próprio crescimento dos animais não devia ser abaixo de três meses.
Medida proteccionista
Já António Celestino, também economista, entende que, para um país que pretende aumentar o consumo interno e alavancar as suas próprias indústrias, do ponto de vista teórico, a medida tem razão de ser.
Mas chama atenção que pode comprometer o posicionamento de Angola a nível internacional, na qualidade de membro da Organização Mundial do Comércio (OMC), tratando-se de uma medida proteccionista, pois esta organização internacional tem como um dos objectivos liberalizar o comércio e criar maior integração.
António Celestino concorda que Angola tem condições para a produção local destes produtos, justificando que a base fundamental é a existência desses animais, mas fala na falta de infra-estruturas de transporte e na transformação de criadores de pequena escala para criadores de grande escala.
Chama atenção que, inicialmente, o mercado interno poderá registar problemas no que diz respeito aos preços destes produtos, mas, a longo prazo, a indústria local vai alavancar, desde que o Governo faça a sua parte, criando e melhorando as infra-estruturas necessárias.
“Esta medida vai afectar a vida dos angolanos”
Quem se opõe à medida do Ministério da Agricultura é o economista Heitor Carvalho, que sublinha que, em todo o mundo, existe a venda de subprodutos de animais, apontando os casos do Brasil, China, Quénia, Rússia e até os Estados Unidos da América. Heitor Carvalho diz que não é real a justificação do Ministério da Agricultura de que existe condições para a produção local dos referidos produtos, “porque conheço as condições e posso lhe garantir que não existe”.
Mas, para este economista, o fundamental é que, mesmo que existam as condições que se ponham protecção aduaneira de forma a proteger a produção local. “Não se justifica permitir que se importe, por exemplo, um boi inteiro, mas não podes importar um fígado de boi.
Podes importar um frango inteiro, mas não podes importar a coxa de frango”, disse, acrescentando que “esta medida não faz sentido, pois ninguém no mundo comercializa apenas produtos inteiros”.
O também responsável do Centro de Investigação Científica da Universidade Lusíada de Angola (CINVESTEC) entende que a medida, nos moldes em que foi tomada, estará a proteger a ineficiência e vai encarecer ainda mais os produtos nacionais em comparação aos importados.
“Com a falta de importação, os piores produtores nacionais vão aumentar ainda mais os preços dos produtos. Então, temos que ter a coragem de dizer para se acabar com esta decisão, porque vai fazer mal aos angolanos”, sustentou. Reforça que os alimentos representam 8% da nossa balança da importação e, caso se queira poupar as divisas, deve-se acabar com os subsídios aos combustíveis, que representam quase 14% da nossa importação, com 2,3 mil milhões de dólares em nove meses.
“Ponham taxas sobre o vinho, sobre o whisky. Isso não afecta a vida dos angolanos nem a inflação. É no combustível e importação de materiais de construção que temos de poupar e não na mesa dos mais pobres, com a proibição de importação de produtos básicos”, disse.
Aconselha a se deixar crescer a produção interna, protegendo os eficientes e a se proibir a importação de “coisas desnecessárias e não de coisas necessárias”, acrescentando que, com boas políticas aduaneiras dos que produzem bem, a produção interna vai crescer e, paulatinamente, vai se substituindo a importação.