A Secil Marítima, empresa especializada no transporte marítimo de passageiros e carga, anunciou, publicamente, que vai alterar, a partir de 1 de Novembro do corrente ano, as tarifas de serviço de transporte de passageiros.
Com este incremento das tarifas das viagens marítimas nos referidos percursos pela SECIL, vai complicar de forma drástica o problema da mobilidade para a população cabindense, segundo as reacções da população colhidas pelo jornal OPAÍS sobre o impacto que a medida trará.
O professor universitário Raul Tati considera que a medida vai impactar negativamente na vida da população local, já que as novas tarifas colidem frontalmente com a capacidade financeira da população que tem optado por esta via.
Disse também que a decisão faz tábua rasa ao problema da descontinuidade geográfica “tão propalada nos discursos oficiais.” Atendendo à sua condição de insularidade, a população local tem apenas a via aérea e a via marítima para a sua mobilidade.
“Razão bastante para que as tarifas sejam acessíveis até ao último pobre da província”, defendeu Raul Tati. No seu entender, quando se opta por preços proibitivos, grande parte da população está a ser excluída desses serviços.
“Isto é mau”, lamentou. Aliás, Raul Tati defende que a política de subvenção das passagens áreas para Cabinda, assumida e implementada pelo Titular do Poder Executivo em 2018, devia ser o modelo das passagens marítimas pelo mesmo motivo.
“Não faz sentido, por um lado, desagravar as passagens aéreas e, por outro, agravar as passagens marítimas”, disse Raul Tati, sustentando que a decisão da SECIL provavelmente tenha algo a ver com a sustentabilidade das suas operações e para a saúde financeira da empresa. Mesmo assim, sublinha: “Cabinda é um caso particular. Foi dito pelo Presidente João Lourenço. As decisões devem atender a esse quesito.
Não são os cidadãos de Cabinda que têm de assumir o ónus da descontinuidade geográfica. É um assunto do Estado.” Por isso, afirma que a subvenção das passagens áreas está alinhada com as responsabilidades do Estado e a SECIL vai ter que seguir o mesmo caminho.
Noutra vertente, o nosso entrevistado vê como solução do problema, transformar Cabinda numa região autónoma para mitigar a excessiva dependência económica, política e administrativa da capital.
“Enquanto mantivermos este modelo onde tudo depende de Luanda, a necessidade de contínua mobilidade impõe-se. O fluxo actual de passageiros tem muito que ver com essa dependência”, referiu Raul Tati. E concluiu: “É muito provável que a empresa SECIL não tenha ponderado todos estes aspectos. Neste sentido, cabe ao governo atender ao grito de socorro das populações de Cabinda”.
Apelo ao Executivo
Para o jurista João Domingos Marques, a alteração dos preços é uma medida que deixa muito a desejar para uma população que já sofre bastante com as questões de mobilidade. Segundo disse, o Estado não tem como finalidade ganhar lucros, mas criar empresas públicas para garantir serviços à população.
“Mas olhando para a Secil Marítima, a empresa parece estar mais preocupada em aumentar o preço de passagem, o que se configura num paradoxo, na medida em que inverte aquilo que é o papel do Estado.”
Por isso, defende a necessidade de o Executivo fazer uma reflexão aturada sobre o assunto, atendendo as particularidades da província, uma vez que Cabinda não tem ligação terrestre com o resto do país.
“Quando se estipula qualquer preço é preciso olhar essa questão. Aliás, na transportação aérea há alguma sensibilidade, porque o preço praticado em Cabinda difere em relação às outras províncias.”
No seu entender, o aumento dos preços da transportação marítima parece ser uma situação paradoxal quando se pensa em baixar o valor do voo. “É preciso que haja um equilíbrio”, referiu, aconselhando a empresa a rever a medida tomada, atendendo a especificidade da província.
“É preciso que o Estado ponha mão e tenha alguma sensibilidade com esse povo e reveja esta questão dos preços da transportação marítima”, sublinhou.
Outros cidadãos ouvidos por este jornal como José Tembo, Ernesto Brás e António Puati também alinham no mesmo diapasão, referindo que o reajuste dos preços complica ainda mais a vida da população de Cabinda que já se encontra numa situação de enclave.
Razões da subida dos preços
A empresa justifica a alteração dos preços com o aumento dos custos operacionais, reforçando o seu compromisso em garantir a segurança e o conforto dos passageiros durante as travessias.
Silvano Araújo, membro da comissão de gestão da Secil Marítima, já havia dito em entrevista a este jornal que o serviço de transportação de passageiros na rota de Cabinda é o que menos rentabilidade dá à empresa por se tratar de uma actividade de cariz social devido a questão da descontinuidade da província de Cabinda com o resto do país.
“A Secil tem realizado e continuará a fazê-lo, apesar das limitações que existem”, assumiu. Segundo disse, o preço do bilhete praticado não é subvencionado e o mesmo foi definido com base naquilo que é a capacidade da população e também para cobrir os custos possíveis das operações ligados ao combustível, salários, tripulação, gastos correntes e de outras acções operacionais, visto que a Secil opera em terminais portuários que exigem pagamentos de emolumentos.
POR:Alberto Coelho, em Cabinda