O registo frequente de desmantelamentos de centros ilegais de mineração de criptomoedas pode ser considerado como um sinal de que a Administração Geral Tributária (AGT) carece de mecanismos para travar a entrada de equipamentos que suportam essa actividade, como processadores, placas de vídeo e fontes de alimentação, de acordo com o jurista Arlindo Chimbuenjo
O especialista explicou que muitos dos países que consideram ilegal a mineração de criptomoedas tiveram de adoptar diversas medidas, nomeadamente, fiscalização rigorosa que abrange identificar e desmantelar operações deste género e de controlo das importações. “Reforçar a fiscalização alfandegária é um modo para impedir a entrada de equipamentos de mineração no nosso país”, frisou, salientando que recomenda às autoridades angolanas a segurem pelo mesmo caminho.
Arlindo Chimbuenjo esclare- ceu que a actividade de mineração de criptomoedas foi criminalizada somente no ano passado, através da implementação da Lei 3/24 de 10 de Abril – Lei sobre a Proibição de Mineração de Criptomoedas e outros Activos Virtuais.
Este diploma legal esclarece que criptomoeda é qualquer forma de moeda virtual ou digital que utiliza a criptografia para transacções financeiras ou comerciais, ao passo que mineração de criptomoedas consiste no processo de gerar, validar e incluir novas transacções na blockchain.
Segundo a fonte, os autores deste tipo de delito, classificado como crimes contra o sistema financeiro, o ambiente e a Segurança Energética Nacional, arriscam-se a apanhar uma pena que varia de três a 13 anos, conforme estabelece o Código Penal Angolano.
“A tipificação deste crime surge num contexto em que urge a necessidade de protecção do sistema eléctrico nacional, face à actividade de mineração de criptomoedas, em razão do respectivo potencial de consumo intensivo de energia eléctrica, susceptível de colocar em risco a segurança energética nacional”, frisou.
Para ser mais preciso, o advogado enfatizou que, em salvaguarda do interesse do Estado, a referida medida deve ser punida com a pena de prisão de três a oito anos, quem, de qualquer forma, utilizar qualquer licença de instalações eléctricas para fins de mineração de criptomoedas e outros activos virtuais. E, por outro lado, estabelece uma moldura penal maior, de 3 a 12 anos, para quem, de qualquer forma, fizer a ligação de equipamentos de mineração de criptomoedas e outros activos virtuais ao Sistema Eléctrico Nacional.
O mesmo se aplica aos cidadãos que forem apanhados transportando tais equipamentos para os países vizinhos, como aconteceu, recentemente, com alguns que foram detidos em flagrante pelos efectivos do Serviço de Investigação Criminal (SIC) a exportarem material de mineração de criptomoedas de Angola para a República Democrática do Congo (RDC).
Abalo ao sistema financeiro De acordo com a fonte, pode afectar também a estabilidade do sistema financeiro nacional, com maior incidência para a proliferação de circulação inter- nacional de moedas virtuais, ou criptomoedas, não emitidas pelo Banco Central.
Arlindo Chimbuenjo explicou que a proibição da mineração de criptomoedas cinge-se no sentido de evitar a circulação de moedas virtuais não emitidas por Bancos Centrais como também a protecção do sistema eléctrico nacional.
No seu ponto de vista, é também um meio para se atender à necessidade de se garantir um ambiente de certeza e segurança jurídica alinhado aos padrões internacionais, no âmbito da prevenção, mitigação e repressão de práticas que violam a ordem e os interesses públicos, associadas a crimes contra o ambiente, contra a segurança energética nacional, emigração ilegal, branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, entre outros.
Reparação de máquinas de mineração “taxada” como crime
Em relação à detenção de alguns cidadãos chineses por montarem uma oficina de reparação de máquinas de mineração de criptomoedas, o jurista esclareceu que a posse deste material também constitui, por si só, um crime cuja moldura penal vai de um a cinco anos. Neste caso, quem tiver esses materiais em posse, em princípio, poderá ser investigado e julgado pelo respectivo crime.
“Apesar de a lei criminalizar a posse dos materiais utilizados para mineração de criptomoedas, e em obediência ao princípio da legalidade, salvo melhor opinião, não constitui crime a reparação de tais máquinas”.
Arlindo Chimbuenjo salientou que a Lei 3/24 também penaliza as pessoas colectivas, como empresas, associações e fundações, que estiverem envolvidas neste tipo de delito, com uma pena de multa de 150 a 450 vezes o valor da taxa de licenciamento ou com a pena de dissolução, consoante a gravidade dos factos, como se fazer a utilização indevida de licença de instalações eléctricas, interferir no Sistema Eléctrico Nacional.
“Outrossim, para as pessoas singulares, poderão igualmente lhes ser aplicadas penas acessórias como proibição de exercício de função, suspensão de exercício de função e, no caso de cidadãos estrangeiros, a expulsão do território nacional”.
Facilidades de se branquear capitais afligem autoridades judiciais
H á um consenso entre os membros dos Conselhos Superiores das Magistraturas Judicial e do Ministério Público de que a mineração de criptomoedas, um fenómeno recente no país, deve ser comba- tida tendo em conta os prejuízos que pode causar às instituições do Estado.
Para o Ministério Público, a prática de tais crimes constitui motivo de preocupação por ser um veículo privilegiado para o branqueamento de capitais e causar graves prejuízos ao sistema de produção e distribuição de electricidade, segundo o titular da pasta, Hélder Pitta Grós. Em declarações recentes, afirmou que a prática deste tipo de delito está entre os crimes de domínio económico-financeiro, entre os de corrupção e criminalidade conexa.
Os dados da PGR indicam que só no ano passado foram despoletadas 565 investigações de crimes desse domínio, que resultaram em 202 pessoas acusadas de tais práticas. A mesma preocupação sobre estes crimes foi manifestada pelo presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial, Joel Leonardo, no momento em que ambos intervieram na abertura do ano judicial que decorreu na província do Uíge.