A nova presidente do Sindicato Nacional dos Professores (SINPROF), Hermínia do Nascimento, não aceita que o Ministério das Finanças (MINFIN) se fie nos argumentos de não haver verbas para os concursos públicos de ingresso ao Ministério da Educação, condicionando-os a uma estratégia de vagas que surgem, no sistema, por falecimentos, aposentadoria ou por outros tipos de invalidez parcial ou total.
“É utilizado esse dinheiro, porque há necessidade de recrutar outros. Isso é um autêntico desrespeito à classe e é desumano. Quando é para resolver a nossa situação, os nossos dirigentes sempre nos dizem vocês também são muitos”, reclamou a presidente do SINPROF.
Segundo ironizou Hermínia do Nascimento, foi com base nessas invocações que, para os docentes do subsistema do ensino superior, se conseguiu duplicar o salário, por serem poucos, enquanto aos muitos não se deu nem dez por cento”.
A líder sindical, para quem a sua classe é tida pelos governantes como a dos enteados, adiantou que os subsídios de direito dos professores rondam entre três e cinco por cento, já que os 12,5 por cento consegui- dos nas negociações recentes e a custo de muita reivindicação e paralisações de aulas, foi, logo a seguir, engolido pelo Imposto de Rendimento de Trabalho (IRT).
“Pareceu-nos uma espécie de nos darem com uma das mãos e tirarem-nos com a outra, até porque, além do imposto, a inflação surgiu depois do aumento”, reparou a sindicalista.
Hermínia do Nascimento frisou que, pela franqueza que os sindicalistas de proa nutrem, a sua organização não pode aceitar que, para algumas coisas, o Governo tenha dinheiro, ao ponto de ir buscar reforços e verbas adicionais, a fim de se adquirir isto e aquilo, enquanto para o sector da educação nunca há dinheiro.
“Para o nosso Executivo, o que se aloca para a Educação é sempre uma despesa, não um investimento, e porque nos consideram muito, julgam que representa um peso enorme nas contas do Estado”, realçou a presidente do SINPROF, que encontra nisso a razão de, actualmente, Angola ser o único país da região austral de África que continua com a percentagem de um dígito, no Orçamento Geral do Estado (OGE).
Classificando este cenário como sendo vergonhoso, Hermínia do Nascimento revelou o de- sassossego que a turma sindical angolana acusa, quando tem de sentar com os outros. Referiu que países com menos recursos do que Angola, inclu- sivamente aqueles que a nação de Agostinho Neto, no espírito de irmandade, ajudou a alcançarem as suas independências, já estão com dois dígitos para a Educação no OGE.
“Nós não podemos ser pais que deixam de dar de comer aos seus filhos, para sustentar os do vizinho, a menos que entre estes últimos haja também os nossos”, ironizou. Questionada se a indiferença de posição orçamental, nas cimeiras internacionais, tem sido justificada, Hermínia do Nascimento esclareceu que a comitiva sindical angolana tem a responsabilidade de actualizar os parceiros internacionais sobre veracidade do assunto e de pedir apoio e solidariedade a essas organizações internacionais, a ver se conseguem influenciar o seu país.
“Como é que nós queremos um ensino de qualidade com a miséria de salário que se recebe”, questionou-se a entrevistada, tendo acrescentado que, por incrível que pareça, a maioria do dinheiro alocado para o sector da educação serve para pagar salários.
Em nome da classe que defende, reiterou que, em momento algum, podem aceitar que lhes digam que se incrementou o salário dos professores e, por causa disso, vão ficar dois ou três me- ses sem receber os vencimentos.
“Então, para outros gastos, não ficamos três meses, mas só mesmo quando é na Educação e há dinheiro para outros concursos”, questionou a sindicalista, tendo adiantado que os gastos de que se refere são avultados, ao ponto de rondarem milhões de dólares.
Ministra Grilo, o consulado mais aberto ao diálogo
Dos consulados que passaram pelo Ministério da Educação, a nova presidente do SINPROF considera que a do ministro António Burity da Silva foi a que mais mostrou dificuldade de negociar, não só ao nível da sua estrutura mais alta, mas até ao das então direcções provinciais da Educação, que, segundo ela, não facilitavam.
“A relação entre o sindicato e a estrutura local era completa- mente bloqueada. Não nos viam como parceiros, mas como integrantes de alguns partidos na oposição”, acusou Hermínia do Nascimento, que disse ter sido também nesse consulado em que o SINPROF, em forma de retaliação por parte do MED, sofreu um bloqueio total na quotização dos seus filiados.
Nessa altura, a defensora dos professores do ensino geral, revelou ter ouvido de alguns dirigentes do ministério reitor da educação e do ensino em Angola que haviam de suspender ou cancelar todo tipo desconto e que os sindicalistas teriam filiar, novamente, os professores.
“Fomos obrigados a fazer isso e ficamos longo tempo sem arrecadar nada, porque o ministério não quis. Foi o chefe do departamento dos recursos humanos do Ministério da Educação tomou essa decisão”, salientou.
A interlocutora do Jornal OPAÍS referiu que, às vezes, essas medidas de retaliação fortificam mais os reclamantes, porque tal medida despertou no colectivo do SINPROF uma outra vontade de trabalhar, ao ponto de terem conseguido refiliar o pessoal ora cadastrado, o que permitiu contarem, actualmente, com descontos directos no salário dos professores das 18 províncias de Angola filiados no SINPROF.
Reconheceu, a par disso, que ainda não se descontam todos os seus filiados, tendo prometi- do continuarem a lutar para que tal aconteça. Para Hermínia do Nascimento, a maior abertura, nas negociações entre o SINPROF e o MED, regista-se no consulado actual da ministra Maria Luísa Grilo, a qual, segundo avançou, não tem tido autoridade total para resolver os problemas à mesa, por haver itens que dependem de outros ministérios.
“Mas depende, sobretudo, de quem gere as finanças e que constantemente diz que não há dinheiro, abrindo mão, quando se registam paralisações”, ressaltou. Curiosamente, é na gestão da ministra considerada pelo SINPROF como a mais dialogante em que aconteceram mais greves, mais paralisações e, consequentemente, mais descontos nos salários dos professores.
Relativamente a esse recurso das paralisações das aulas, por greve, Hermínia do Nascimento disse que não é prioridade da sua gestão, no quinquénio 2024- 2029, como não foi em nenhum consulado, mas considera-o como um instrumento de pressão útil, nos casos em que as negociações não encontrarem consenso.
“É necessário olharmos para a Educação com os olhos de ver. Temos de entender que a Educação é prioridade, em qualquer parte do mundo, até nos países com menos recursos financeiros do que nós”, lembrou a presidente do SINPROF.
Aclamada autêntica negociante do SINPROF
No SINPROF desde 1993, a senhora que já ocupou os cargos de tesoureira, secretária-geral e de vice-presidente considera-se autêntica negociante de acordos vencidos, pelas vezes sem conta que já encabeçou diálogos com o Ministério da Educação (MED).
“Eu chefiei, ao longo desses anos, a comissão de negociação com o Ministério da Educação (MED). Eu era a chefe de equipa negocial com o MED, primeiro como secretária-geral e, depois, quando ascendo como vice-presidente”, informou, para garantir que a sua ascensão não é obra do acaso.
Hermínia acredita que os professores sabem que ela e a equipa negocial nunca defraudaram. Mas sublinhou que, quando se vai para uma negociação, se submete, automaticamente, a mudanças. “A posição da equipa não deve ser completamente estática, imutável, porque negociar é arte e ciência, onde não se ganha tudo, há cedências de ambas as partes.
Há recuos, porque, às vezes, é necessário recuar-se, para se avançar melhor e firme”, aclarou. Finalmente, apelou aos colegas a esperarem por uma Hermínia aguerrida, que, em função das circunstâncias, se doará para, com a sua equipa, encontrarem as melhores soluções, de modo que os professores não continuem na desconfiança.