A jovem Elvira Zonga, de 33 anos de idade, mais conhecida por “Xica”, perdeu a vida no seu bairro, Rangel, na última sexta-feira, por disparo de arma de fogo feito por um agente da Polícia. Se não fosse o telefone do seu sobrinho, que tinha sido roubado por um outro jovem do mesmo bairro, a polícia não seria chamada a intervir e não haveria o desentendimento e consequente morte da jovem, que tinha viagem marcada para Portugal
Sexta-feira, 23 de Agosto do corrente ano, rua da Dona Amália, distrito urbano do Rangel, província de Luanda. Cenário calmo, ambiente de convívio, até que um dos sobrinhos de Elvira Zonga queixa-se ao irmão desta de ter-lhe sido roubado o telefone, há instantes, no bairro.
Identificado o grupo de assaltantes, o tio foi ter com estes, uma vez que eram conhecidos no bairro, no sentido de recuperar o artigo. Houve confusão, segundo Laudimira Zonga, de 29 anos de idade, irmã da vítima, e, na altura, passava um carro-patrulha, pelo que os agentes se viram obrigados a intervir.
Detiveram um dos assaltantes e o colocaram na carroça, porém, enquanto tentavam deter o irmão de Laudimira, que no caso devia apenas acompanhar a polícia para prestar queixas do roubo de telefone, o agente usou brutalidade, o que fez com que Elvira Zonga interviesse em defesa do irmão. “Neste momento, o gatuno do telefone aproveitou a oportunidade e fugiu.
A polícia, revoltada, culpou a minha irmã da fuga do gatuno e insistia que tanto ela, quanto o meu irmão, subissem na carroça. Ela negou, o polícia puxou a blusa ao ponto de rasgar e deixá-la com os seios à mostra.
Quando ela tenta entrar no beco, para buscar o casaco e se cobrir, um outro polícia voltou a lhe puxar e disparou”, conta Laudimira. A interlocutora disse que antes de disparar, o polícia disse “prefiro perder a farda e estragar a vida dela”. Assim que foi atingida, Elvira Zonga, antes de cair inanimada terá dito: “fizeste isso por quê?”, de seguida, caiu batendo com a cara no esgoto.
Quem também foi atingida com um tiro é a mãe da vítima, Esperança Manuel, na região do ombro, tendo a bala atravessado. Esperança apenas deu conta que foi atingida minutos depois de ver a sua filha no chão, aliás, pensava que o sangue na blusa não era dela e que tinha sido atingida por uma coronhada.
Foi socorrida no Hospital Militar e lá soube que no quarto ao lado estava o polícia agredido pela população. Sobre este agente, Esperança disse que a família não tinha como conter a emoção da população, uma vez que todos viram o que o seu colega fez com a “Xica”.
Para além do facto de estarem a lamentar a morte de “Xica”, a família está preocupada com o facto de terem sido detidos o irmão desta, um primo e mais um jovem do bairro, que nada tem a ver com o problema.
Embora a acção tenha acontecido no Rangel, o caso está na esquadra da Petrangol, no Sambizanga, situação que a família também não entende. “Eles eram oito agentes, viram mesmo o gatuno do telefone a fugir e agora estão a tratar o meu filho mais velho como marginal, quando perderam o verdadeiro bandido.
Agora, estão a culpar o meu filho de ter partido os vidros do carro da polícia e participado na agressão ao agente, mas ele já não estava. Se eles quiserem prender, que prendam todos do bairro”, disse.
Xica era a quinta filha de um total de 10, teria completado 34 anos no dia 13 de Outubro, deixa dois filhos (uma de 12 e um de cinco anos), e o noivo estava à sua espera, em Portugal.
“São polícias com comportamentos animalescos”
A irmã mais velha de Elvira, Madalena Domingos, concorda que autoridade tem de ser respeitada, mas isso não dá o direito de tirar a vida de sua irmã, pois nem sequer fizeram tiro de aviso. “Se achou que ela estava remitente, teria pelo menos disparado na perna ou o quê, mas não no peito.
Quando você é autoridade e faz o tiro dizendo que vai estragar a vida, é porque já tinha intenção de matar”, sustenta. Madalena Domingos levantou a suspeita de que o agente que fez o disparo, uma vez que também vive no bairro, já tinha alguma reserva contra “Xica” e terá se aproveitado da situação para lhe tirar a vida.
“São muitos jovens que entram na polícia e já levam comportamentos animalescos. É mais um que só entram para sujar o nome da Polícia. O inocente que foi parar no hospital ainda lhe disse para não fazer isso, mas ele insistiu ao ponto de disparar contra a moça”, sustenta ela.
Uma análise minuciosa aos candidatos que querem ser polícia, desde a condição física à condição mental, é o que sugere Madalena Domingos, porque “muitos estavam na bandidagem e hoje encontraram um emprego na Polícia, mas não deixaram o comportamento antigo”