“Esta medida pode levar à falência de muitas em- presas e, sobretudo, ao incumprimento salarial do pessoal, visto que muitas empresas estão a viver períodos difíceis e estão em situação de sobrevivência”, adverte o economista Eduardo Manuel, em declarações ao jornal OPAÍS.
Porém, para a AGT, os resultados alcançados até o momento são bastante animadores, pois trouxeram, à formalidade, comerciantes que estavam em situação irregular, permitindo-lhes o cumprimento das suas obrigações tributárias e evitando sanções como multas, confisco de mercado- rias ou encerramento dos negócios.
Apesar de a operação ter começado por causa das facturas e do IVA, a mesma serve igualmente para o cadastramento de estabelecimentos que operam à margem das leis fiscais e que outrora não pagavam quaisquer impostos, segundo apurou este jornal.
Para demonstrar a sua eficácia, a AGT diz, em documento a que OPAÍS teve acesso, que a sua equipa visitou 29.180 estabelecimentos comerciais e arrecadou adicionalmente o valor de mais de mil e 989 milhões de kwanzas.
E, por outro lado, passou notificações no valor de mais de 7 mil milhões de kwanzas, por terem sido constatadas diversas irregularidades, entre as quais a emissão de facturas que não cumprem como o estipulado no Código do IVA (CIVA).
O economista Eduardo Manuel entende que, ao serem notifica- das, terão que deixar de pagar o salário do pessoal e de efectuarem as despesas operacionais correntes, para somente terem que pagar as notificações.
Daí que recomenda a AGT que proceda à negociação com as empresas, para que estas possam pagar as notificações e continuarem a desenvolver a sua actividade laboral. Ao fazer uma análise da conjuntura actual, a fonte afirma que o combate à informalidade será um processo mais lento do que se tivéssemos em período de expansão económica, visto que os agentes económicos ligados ao comércio de bens e serviços optam pela informalidade, para evitarem os “custos da formalidade”, tais como licenças, impostos, INSS, entre outros, por questões de sobrevivência.
Maior controle dos contribuintes
No meu ponto de vista, esta medida devia ter sido tomada mais cedo, não só para ser feito um maior controle dos contribuintes, mas também para ajudar os contribuintes com os procedimentos para a emissão das facturas padronizadas com IVA, visto que muitos ainda desconhecem tal procedimento.
Por outro lado, na altura o cenário económico era melhor do que o actual, daí que, pelo facto da conjuntura económica se ter agravado, muitos contribuintes optaram por não emitir facturas padronizadas por questões financeiras.
“Isso é um indício de que o sistema foi aplicado numa altura em que os contribuintes não estavam preparados para implementar tal sistema, pelo facto de mui- tos já apresentarem dificuldades de tesouraria, devido à conjuntura económica que atravessa- mos”, frisou.
Acrescentou de seguida que “estes optaram por não o fazer para poder prosseguir com o seu negócio, sem terem que ajustar os preços ao IVA, sob pena de perderem clientes e agravarem a saúde financeira das suas empresas e, em consequência, terem que declarar falência”.
Por outro lado, afirmou que, no que toca à justiça fiscal, estas operações vão obrigar os contribuintes não só a adoptarem os procedimentos exigidos pela AGT, mas também a cumprirem com as suas obrigações fiscais.
No seu ponto de vista, a primeira coisa que tem que se fazer para que um sistema fiscal seja bem-sucedido é que a despesa fiscal seja bem discutida, seja bem apresentada, seja bem explicada e que as pessoas, os cidadãos, percebam que o dinheiro que pagam por seus impostos está sendo aplicado em coisas que lhes trazem mais vantagem se ficassem com esse dinheiro.
Para ser mais preciso, exemplificou que se o cidadão ver implementar uma estrada na sua zona de residência que o permitirá conseguir chegar facilmente aos vários locais, com recursos provenientes do imposto que pagou, conseguirá perceber que se não pagasse imposto, nunca conseguiria se fazer aquela estrada.
“Agora, se em vez da estrada tenho um conjunto de buracos, este é o primeiro incentivo para não pagar nada. Eu estou a pagar e não vejo nada em troca. Portanto, esta é a primeira condição para a implementação de um bom sistema fiscal”, frisou.
Heitor Carvalho sublinhou que é preciso mudar a despesa e ser rigoroso na despesa que se faz e, depois, fazer perceber esta necessidade dos impostos. Isso, por existir quem nunca sentiu essa necessidade, nem o Estado ensinou algo parecido com a necessidade de pagar impostos.
Possibilidade de perdão fiscal gera divergência
Os dois economistas ouvidos pela nossa equipa de reportagem divergem quando o assunto em análise é se há ou não necessidade de se aplicar perdão fiscal. Heitor Carvalho defende que não devem ser feitos perdões fiscais porque criam uma situação de benefício para quem não cumpre, colocando-o numa situação de vantagem relativamente àquele que pagou atempadamente, quando ambos são concorrentes.
“Isso distorce a concorrência na economia”, enfatizou. Sublinhou que o principal inimigo da economia é a informalidade e o não cumprimento de regras. Portanto, não deve haver perdão fiscal.
Mas daí até dizer que tem que destruir a informalidade vai um passo muito grande. “Nós não podemos destruir a informalidade. E isto tem que se perceber de uma forma muito simples. Se você tem 10% das pessoas a não cumprirem as regras, você usa o aparelho de Estado, o aparelho repressivo do Estado, para obrigar esses 10% a cumprirem”, exemplificou.
No seu ponto de vista, se, ao contrário, existirem 90% a não cumprirem e só 10% a cumprir, o problema não está nem em quem não tem problema, está nas regras que foram estabelecidas. Isso por serem regras que não têm relação com a realidade económica do país.
“Portanto, a primeira coisa para se mudar esse incumprimento, essa informalidade, o não cumprir as regras, entre as quais as regras fiscais, é mudar essas regras”, frisou. Heitor Carvalho considera que se deve fazer regras muito mais simples, muito menos exigentes, nomeadamente as taxas de imposto muito mais baixas, para que todos possam pagar e para que todos possam ser iguais e contribuir todos, não havendo uns que pagam e outros que beneficiam.
Para si, este é um trabalho grande que tem que ser feito e que não começou. “É preciso tirar esta ideia que temos de copiar as realidades fiscais de outros países. Precisamos de criar uma realidade que se adapte ao nosso ambiente económico. Não só fiscal, uma realidade de regulação também”.
O director do Centro de Estudos da Universidade Lusíada defende que as regras têm que ser passíveis de serem cumpridas por todos e, ao se cumprir as regras da formalidade, o produto que sai do cumprimento dessas regras não pode ser tão caro que a maioria dos angola- nos não possa comprá-lo.
Apontou assim este como sendo o problema da informalidade em Angola. “É que a nossa formalidade é de tal maneira exigente que os produtos que saem da formalidade não estão acessíveis ao bolso do consumidor angolano. E por isso, naturalmente, as empresas e os negócios caem na informalidade.
Produzem aquilo que os angolanos podem comprar com as regras que os angolanos podem comprar”. Por seu turno, o economista Eduardo Manuel é de opinião que, tendo em conta que as empresas estão a viver períodos difíceis, o perdão fiscal vai ajudá-las a manterem o seu negócio e se autofinanciarem para o desenvolvimento da sua actividade, bem como poderão honrar os seus compromissos com o pessoal, o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) e com os fornecedores.
“Posteriormente, poderão honrar com os pagamentos à AGT. Tudo deverá passar por uma negociação entre a AGT e as empresas”. Explicou que o principal factor externo que leva as empresas a contraírem dívida fiscal é a eleva- da taxa de câmbio do kwanza em relação ao dólar e ao euro, que tem levado ao aumento da inflação, devido ao aumento dos preços dos bens e serviços, cujo impacto tem sido negativo no poder de compra dos consumidores.
Em consequência, as empresas têm sofrido diminuições de receitas, levando-as a estabelecer prioridades, optando, por exemplo, por honrarem os seus compromissos com o pessoal ao invés de pagarem os impostos ao Estado.
Por outro lado, referiu que o sistema tributário angolano tem sido alvo de várias reformas ao longo dos anos, de modo que foram introduzidos mais impostos que também existem nos países mais desenvolvidos, como é o caso do IVA, Imposto Automóvel, Imposto Predial, entre outros.