Algumas unidades hospitalares, na ânsia de aumentar a sua carteira de clientes, reduziram de quatro para três horas as hemodiálises feitas a doentes com insuficiência renal, decisão que baixa a qualidade de vida dos mesmos e os torna “objecto de negócio” segundo a Associação que defende estes doentes
POR: Romão Brandão
A Associação de Defesa de Direitos dos Insuficientes Renais de Angola (ADIRA), na voz de Palmira da Silva, coordenadora da juventude, lamenta o facto de os doentes com insuficiência renal estarem a ser tratados como negócio. O seu lamento ocorre pelo facto de se ter registado um número elevado de doentes. Os pacientes precisam de fazer três sessões semanais em 4 horas diárias e há centros de hemodiálise que reduzem para três horas, de forma a que possam ter muitos doentes. A Junta Médica paga por paciente com insuficiência dos rins 80 mil Kz, por cada sessão. Agindo desta forma, reduzindo as horas de tratamento, diminui também a qualidade de vida do doente, segundo a coordenadora que falava em exclusivo ao OPAÍS.
“Eles querem receber mais pacientes para lucrar mais, pelo que, desta forma somos tratados com fins comerciais”. Os centros existentes não conseguem responder à demanda de pacientes com insuficiência renal, de acordo com a entrevistada. Por sua vez, o nosso jornal soube que o Ministério da Saúde está a trabalhar para abrir unidades de hemodiálise nos hospitais públicos, num esforço de combate à especulação de preços que se praticam nos centros privados. Está-se a trabalhar com os vários centros de hemodiálise na renegociação dos contratos existentes, para a adopção de um preço único e razoável, que ponha fim à especulação que se regista nos serviços. Neste processo estão os ministérios da Saúde e da Economia. Chamada a pronunciar-se sobre o assunto, a coordenadora da juventude da ADIRA disse ser uma mais-valia, pelo que ficam todos satisfeitos e engrandecidos em ter centros de hemodiálise públicos.
Entretanto, “não basta apenas abrir um centro público e não ter a qualidade de tratamento que precisamos, e não ter medicamentos básicos, senão vamos viver o que temos vivido nos centros privados”, sublinha. Manter a qualidade é evitar que o paciente com Insuficiência Renal (IR) não fique 12 meses sem medicação, por exemplo, como tem acontecido. “Nós, enquanto asso ciação, gostaríamos que o Ministério criasse uma Comissão Nacional de Acompanhamento dos Serviços de Hemodiálise”, defende, acrescentando que deve existir inspecção aos centros de hemodiálise, devemos ter dados estatísticos de quantos morrem semestralmente nestes centros, o que tem sido uma lástima. O nível de mortes destes doentes é bastante alto, também por falta de políticas públicas que os beneficie, bem como por falta de uma Lei que proteja o doente com IR. “Nós não temos onde ir nos queixar”, disse.
Presidente da ADIRA morreu
A Associação está sem presidente, de momento, porque Timóteo João Sebastião perdeu a vida na Segunda-feira, 5, vítima de paludismo. Segundo Palmira da Silva, o presidente, além de paludismo estava acometido com muita febre e problemas nos pulmões. De recordar que em princípio do mês de Janeiro, o então presidente da ADIRA queixou-se da falta de protecção legal ao doente renal crónico e defendeu a sua inclusão na Tabela Nacional de Incapacidades e Protecção. Aquela preocupação tinha sido apresentada também pelo facto de se registar um elevado índice de despedimentos entre as pessoas com insuficiência renal. Sem protecção legal, os pacientes serão discriminados, pelo que torna-se urgente e necessário o reconhecimento ao doente renal da sua condição de pessoa com deficiência, para beneficiar da protecção legal com base na Lei 21/12 de 30 de Julho, Lei da Pessoa com Deficiência.
Segundo o líder associativo, a falta de estruturas técnicas no país “tem comprometido a qualidade do tratamento” ao doente renal crónico, porque, observou, “não existe sequer um programa para definir os critérios básicos para a terapia renal substitutiva”. O reforço da capacidade de organização, melhoraria a acção de advocacia social, com realce para o debate público sobre a Lei dos Transplantes de Órgãos e consequente aprovação, constam das prioridades da ADIRA para 2018, que tenciona ainda construir já a sua sede social. Fundada em 2016, a ADIRA conta actualmente com mais de uma centena de associados e prepara para este ano a sua primeira assembleia ordinária, para eleição dos responsáveis para o próximo quinquénio e aprovar o plano estratégico da organização.