Jovens jogadores, com habilidades técnicas e criatividade com a bola, cobram 10 a 150 mil kwanzas por jogo em torneios de futebol de rua, uma prática que tem ganhado, cada vez mais, notoriedade nas mais diversas zonas da província de Luanda. Segundo apurou esta reportagem, os valores muitas vezes servem para o pagamento da renda de casa e suprir outras necessidades
Presente nas periferias de algumas províncias do país, sobretudo em Luanda, jovens talentosos, geralmente aos fins-de-semana, demonstram suas habilidades em campos improvisados, com dribles incríveis e jogadas inspiradoras.
A maioria dos jovens encontra nesta actividade não apenas uma forma de entretenimento, mas também uma fonte de sustento, tanto para si mesmos, quanto para suas famílias.
Os praticantes de futebol das comunidades, tratados por talentos de rua, encaram os torneios como principal fonte de renda, uma vez que o retorno financeiro é imediato através do contrato por jogo ou o tempo de duração do certame, bem como muitas vezes recebem também o incentivo monetário do público.
No entanto, o montante recebido pela maioria dos fazedores desta modalidade tem sido suficiente para atender às necessidades básicas. Muitos utilizam os ganhos para suprir vícios, enquanto outros optam por investir no conhecimento nas mais diversas áreas do saber.
Os atletas entrevistados por este jornal afirmaram que não têm intenção de abandonar a “funguiça”, como é tratado nos bairros, pois nela encontram meios para expressar suas emoções e criatividade.
Além disso, muitos vêem essa modalidade como uma forma de escapar das más influências e evitar caminhos negativos, como o envolvimento em actividades criminosas. Para obter alguns ganhos extras, os atletas precisam de impressionar o público com movimentos que envolvem elementos de dança, acrobacias, assim como malabarismos em campeonatos.
Através da prática da “funguiça”, muitos jovens descobrem talentos e desenvolvem habilidades que jamais imaginaram possuir. Aliás, alguns desses jogadores passaram por equipas federadas do país, mas não tiveram o sucesso desejado e outros, por lesões, reencontraram o ganha pão em torneios das comunidades, nomeadamente Taça Ngoló, Gira Cacuaco, Gira Gindungo, Gira Sonef e Gira Terra Vermelha.
Por exemplo, o grupo “staff” Setuca e 300 são constituídos por muitos talentos de futebol de rua que, aos fins-de-semana, espalham a alegria em vários campos pelados da cidade capital em troca de verbas.
Segundo apurou esta reportagem, os organizadores dos torneios de futebol mais mediáticos muitas vezes exigem que todas as equipas que participam na prova devem ter no plantel um “funguiceiro”, de modo atrair mais público no recinto desportivo.
Ou seja, com um bom número de adeptos nos campos, as feirantes comercializam mais os seus produtos, o que permite a organização arrecadar mais receitas, uma vez que as comerciantes pagam de dois a 10 mil kwanzas.
“Consigo ter lucros com os torneios
O atleta João Sozinho afirmou que tem obtido muitos lucros com esse desporto, acrescentando que tem investido na sua própria formação académica.
No entanto, adiantou que não depende desta modalidade para suprir as suas necessidades, realçando que tem participado no campeonato provincial de Luanda ao serviço da Matilha FC.
Quanto aos ganhos, João Sozinho referiu que não há um valor exacto, explicando que tudo depende do contrato celebrado entre o clube e o jogador.
Manuel Matos “Watará” paga renda de casa graças aos torneios de futebol de rua
Em declarações a este jornal, o jogador Manuel Matos “Watará” disse que, para jogar numa determinada equipa, em alguns torneios de futebol salão das comunidades, celebra contrato que varia de 100 a 150 mil kwanzas.
O jovem, que também já tentou a sorte no escalão sénior da Académica do Soyo, garantiu que graças aos contratos rubricados com diversas equipas dos bairros da capital angolana tem conseguido pagar o arrendamento da casa onde vive.
Watará, de 30 anos, que se notabilizou como craque do futebol de rua no Grémio FC, explicou que cada peladeiro tem a sua forma de fazer contrato. “Por dia, eu posso jogar em dois campeonatos sem nenhuma dificuldade”, garantiu Watará.
Cassamba: “o dinheiro que ganho tem servido para suprir as necessidades da família”
O atleta Francisco Cassamba fez questão de afirmar a este jornal que tem conseguido sustentar a família com a prática dessa modalidade.
Francisco Cassamba ressaltou também que o montante inicial para quem pratica essa modalidade varia de 15 a 20 mil kwanzas por parte do público e do contratante. “O valor inicial é de 15 ou até mesmo 20 mil.
No entanto, o contrato assinado com as equipas também é determinante. O público tem apoiado, mas de forma irregular”, afirmou Francisco Cassamba.
Questionado sobre o que tem feito com os ganhos provenientes dos truques com a bola, o jogador destacou que tem investido em formações. Além disso, Francisco Cassamba acrescentou que os ganhos obtidos têm servido para custear as despesas de casa.
Praticante há nove anos, referiu que se sente satisfeito com essa actividade, mas ressaltou que seu objectivo é representar uma equipa no Campeonato Nacional de futebol da primeira divisão, Girabola.
Francisco Cassamba, de 29 anos, que também actua na Escola do Bairro Novo, em Viana, disse que tem vindo a trabalhar arduamente para a concretização deste objectivo.
No entanto, fez questão de assinalar que não consegue contrato com uma formação da prova rainha do futebol nacional, por falta de oportunidade. “Gosto de participar dos espetáculos nos campeonatos.
Tenho tido lucro com isso e estou satisfeito. O pouco que recebo serve para custear muitas coisas. Mas sempre quis representar uma equipa do nosso Girabola. Não consigo até agora, por falta de oportunidade. Já lutei tanto”, disse Francisco Cassamba.
Dibala Setuca faz contrato por jogo em função da distância do palco do torneio
O jogador de futebol salão de rua, Dibala Setuca, fez saber ao jornal OPAÍS que o contrato que rubrica com algumas equipas depende muito da distância do local do torneio.
Dibala Setuca, um dos atletas mais ‘malabarista’ dos torneios de futebol de rua, afirmou que cobra por jogo 10 a 15 mil kwanzas, sendo que o valor mencionado é apenas para jogar.
Quanto aos custos de transporte e alimentação, Dibala Setuca adiantou ser responsabilidade da direcção do clube. Em poucas palavras, Dibala Setuca afirmou que o dinheiro que ganha mensalmente chega para suprir algumas necessidades.
“O meu objectivo não é só ajudar as equipas que represento a ganharem jogos, mas gosto também de dar ‘show’ para animar o público”, disse.
Por: Kiameso Pedro e Mário Silva