O Vila Clotilde celebrou, a 25 de Março do corrente ano, setenta anos de existência ao serviço do basquetebol, esgrima, assim como golfe. Depois de ter chegado às meias-finais da 45.ª edição do Campeonato Nacional, caindo aos pés do «todo poderoso» Petro de Luanda, nos playoffs, a melhor de cinco jogos, o emblema, sob o comando técnico de Edvaldo Eduardo, escreveu nas páginas do basquetebol nacional que pode, nos próximos tempos, fazer «mossa» às equipas com maior número de títulos e troféus nas provas sob a égide da Federação Angolana de Basquetebol (FAB)
O Futebol Vila Clotilde destaca-se no mosaico desportivo nacional por dispor de uma enorme tradição no que concerne à formação de jogadores. Deste emblema, fundado a 25 de Março de 1953, saíram atletas como Gerson Domingos (Petro de Luanda), Sadraque Nganga (Boise St dos Estados Unidos), Leonel Paulo (Sangalhos de Portugal), Pedro Bastos e Alexandre Jungo (Petro de Luanda) que, actualmente, têm vindo a dar cartas no Velho Continente, assim como a nível nacional, isto é, no Nacional da bola ao cesto, vulgo Unitel Basket.
O conjunto, que tem as suas instalações na rua da Liga Africana, na capital do país, terá sido criado por Fernando Simões, como sendo uma filial do Futebol Clube Barreirense de Portugal. Inicialmente, a agremiação movimentava apenas o futebol. Volvido algum tempo, a direcção do clube incorporou no seu ‘cardápio’ as modalidades de ginástica, andebol, xadrez, hóquei em patins, sendo que o basquetebol era a que mais se evidenciava. O que fez com que o clube conquistas- se o Campeonato Nacional de juniores da categoria por nove vezes consecutivas, na década de setenta.
Num período em que os angolanos buscavam se livrar das mãos do colono português, situação que terá forçado o elenco de Fernando Simões a abdicar de algumas modalidades, nomeadamente andebol, futebol, hóquei, ginástica e xadrez. Pouco depois, Fernando Simões, que, para além do desporto, se dedicava ao exército, terá sido morto em combate durante o período colonial. Esta situação obrigou a que a equipa fosse a eleições, com Carlos Ferreira a ser eleito como o «homem forte» da agremiação.
Mas o seu consulado foi marcado por situações devastadoras. Tudo porque a massa associativa não se sentia confortável com a liderança de Carlos Ferreira. Por via disso, Júlio Carlos Abrantes assumiu a presidência em 2020, cargo no qual se mantém até hoje. Neste momento, a agremiação engloba as modalidades de karaté, esgrima, basquetebol e golfe. Assim sendo, o basquetebol reúne 250 atletas (apenas masculinos), karaté (20), esgrima (60) e golfe (5).
Júlio Abrantes: “Sobrevivemos de receitas provenientes e aluguel dos nossos imóveis”
O presidente do FC Vila Clotilde, Júlio Abrantes, fez questão de assinalar a este jornal que o seu elenco tem vindo a debater-se com demasiadas contrariedades para manter vivo o projecto. O dirigente chegou mesmo a alertar para a necessidade de as entidades públicas e privadas estenderem a mão ao clube com patrocínios, sob pena de a agremiação vir a desistir das provas realizadas pela Federação Angolana de Basquetebol (FAB).
Sem «papas na língua», o responsável referiu que o clube tem treinado nas condições de há vinte anos, acrescentando que não merece continuar nas mesmas condições em virtude do seu historial no panorama desportivo angolano. Adicionalmente, o dirigente sublinhou que o recinto carece de cobertura, tendo realçado que em período de chuvas os atletas, sobretudo dos escalões de Sub-10 e 14, têm treinado em situações desumanas. Reforçou ainda que o pavimento não dispõe de segurança, o que tem colocado em causa a integridade física dos atletas. Júlio Abrantes disse, sem filtros, que caso o seu elenco venha a dispor de condições nos mais diversos sectores, poderá mesmo, nos próximos tempos, vir a ombrear com os melhores clubes do Nacional da bola ao cesto, nomeadamente Petro de Luanda, Interclube e 1º de Agosto.
“Treinamos em péssimas condições e isso é muito triste porque temos história no basquetebol angolano. Precisamos de apoios. Quando tivermos um bom recinto e mantivermos os nossos jogadores, teremos hipóteses de aspirar coisas maiores, uma final e, se calhar, um título”, começou por dizer. Instado a revelar como a direcção tem custeado as despesas do clube, o dirigente sublinhou que o FC Vila Clotilde continua a resistir por conta das receitas provenientes de aluguel de imóveis próprios que dispõe nas imediações da Liga Africana, nomeadamente a «Churrasqueira Bala Bala», assim como o parque de estacionamento de viaturas junto ao Banco Sol. “O nosso dinheiro vem destas receitas. E vale sublinhar que não é grande coisa. São verbas que nem sequer servem para cobrirmos as nossas despesas. Só para teres noção, um desafio no Pavilhão da Cidadela custa cento e vinte mil kwanzas”, disse.
Investimento sem retorno financeiro
Desde a sua criação, o FC Vila Clotilde continua sem obter retorno financeiro com a perda de atletas, situação que tem vindo a agastar a direcção sob a liderança de Júlio Abrantes. O responsável disse que o clube não tem chegado aos lugares cimeiros quer na Taça de Angola, quer no Nacional da bola ao cesto, porque tem sofrido a cada ano uma «sangria» com a saí- da de jogadores.
“O Interclube, 1º de Agosto e Petro de Luanda já levaram alguns dos nossos atletas e nem sequer recebemos um tostão. O clube da polícia, por exemplo, prometeu que iria pagar algum valor. Mas a resposta tarda em chegar. São adultos, mas não cumprem com os compromissos. É bastante vergonhoso. Nesta sequência, a equipa do Inter prometeu-nos vinte bolas, por forma a colmatar as saídas de alguns dos nossos atletas. Verdadeiramente, recebemos apenas dez. Chegaram até a dizer que passaríamos a realizar os nossos jogos no Pavilhão 28 de Fevereiro, dado que o nosso recinto não se encontra em condições.
Tal não aconteceu. Já se passaram dois anos e não há sequer um pronunciamento por parte da direcção de Alexandre Canelas”, lamentou. O dirigente aproveitou a ocasião para sublinhar que a sua relação com os clubes não é das melhores. Disse que os responsáveis do Petro de Luanda, Interclube e 1º de Agosto têm agido de má-fé contra o seu clube, acrescentando que estas equipas aliciaram boa par- te dos seus atletas no sentido de abandonarem o Vila Clotilde. Adiantou que boa parte dos atletas que têm vindo a dar cartas no mosaico desportivo nacional e no continente europeu saíram sem que o seu elenco tivesse sido contactado por aquelas formações. “O nosso grande problema é que não temos uma Lei que proteja os clubes de formação.
Os clubes como Petro, Inter e 1º de Agosto têm de ter mais respeito pelos clubes pequenos. Temos de ser responsáveis. Se queremos um jogador, temos de falar com o atleta e, de seguida, com a direcção do clube para que se possa acertar os termos do contrato. Há atletas que chegaram a mentir os treinadores estarem doentes só para deixarem de jogar pelo Vila Clotilde, resultante do aliciamento daquelas equipas que acabei de citar.
O nosso desporto não deve continuar assim. Assim não iremos a lado nenhum”, disse. Inconformado, Júlio Abrantes prosseguiu nos seguintes termos: “Os dirigentes do Petro, Inter e 1º de Agosto são pessoas de má-fé. O que eles apresentam nos ecrãs das televisões é tudo treta”, referiu. Por outro lado, o dirigente desportivo mostrou-se insatisfeito com o facto de a Federação Angolana de Basquetebol tardar em implementar uma lei que proteja os clubes formadores, no caso de perda de jogadores virem a ser remunerados.
Edivaldo Adriano: Estado actual do basquetebol nacional é péssimo
O líder do FC Vila Clotilde considerou «extrema- mente negativo» o estado actual do basquetebol nacional. Júlio Abrantes não tem dúvidas de que enquanto o governo continuar a apoiar as tais «equipas grandes, Petro, 1º de Agosto e Interclube», o basquetebol nacional nunca irá renascer das cinzas. “Pedimos igualdade de direitos entre os clubes, no que diz respeito aos apoios. O basquetebol não é feito apenas por aquelas equipas. Temos de olhar para frente. Por outro lado, o nosso basquetebol carece de triplistas, pelo que precisamos, também, de trabalhar a componente defensiva”, disse Júlio Abrantes.