O antigo árbitro internacional, Brito Costa, em entrevista ao jornal O PAÍS, falou do desempenho dos profissionais na primeira volta do presente Girabola, Campeonato Nacional de futebol, bem como dos custos de deslocação, alojamento, alimentação e os prémios da arbitragem, normalmente, assumidos pelas equipas anfitriãs. Brito Costa, que entrou para esta profissão, em 1981, “operou” com Délcio Costa, Jorge Mário Fernandes, Domingos, Severino Cardoso Miranda(filho) e outros, tendo terminado a carreira em 2002
Como é que avalia a actuação dos árbitros no presente Girabola, visto que os treinadores, dirigentes e adeptos continuam a reclamar?
Antes de mais, muito obrigado ao jornal O PAÍS, respondendo à sua pergunta, devo dizer, com tristeza, que se ouviu via rádio, televisão e jornal inúmeras críticas sobre o desempenho da arbitragem na primeira volta do Girabola por parte de treinadores, dirigentes e jogadores. De facto, foi muito triste o que acompanhamos.
Não temos dúvidas que houve muitas falhas no lado da arbitragem.
Temos que ser sinceros, a arbitragem não esteve muito bem na primeira volta do presente Girabola.
Os árbitros vão a tempo de regressar melhor na segunda volta do Campeonato Nacional?
Na segunda volta, auguramos que a arbitragem seja melhor para o bem do futebol. Pois, neste momento, não sei se os árbitros terão beneficiado de algum refrescamento.
O ideal seria terem uma conversa e ir-se ao fundo para se saber por que razão é que a primeira volta não correu a contento e penso que há muitas razões.
Quais são essas razões?
É o seguinte: desde o meu tempo, em 1981, ano em que entrei, que a arbitragem depende dos clubes.
Quer dizer, os clubes anfitriões é que recebem as equipas de arbitragem pagam o transporte, alimentação, alojamento e o próprio prémio de jogo, portanto os árbitros estão condicionados ou dependentes das equipas que jogam em casa.
Esse é o modelo mais ideal?
Não é o modelo ideal, isto trás consigo muitos problemas, porque os árbitros ficam à mercê das equipas anfitriãs. Já se identificou essa falha há muitos anos.
Porquê que não se corrige?
Não posso saber as razões de fundo, mas deduzo que haja falta de vontade, outros interesses para que as arbitragens continuem a depender das equipas anfitriãs, porque há um ano, creio que no primeiro mandato de direcção da Federação Angolana de Futebol (FAF), encabeçada por Artur Almeida, já se tinha arranjado um patrocínio para subsidiar os custos.
O patrocínio continua ou está em banho-maria?
No primeiro mandato foi materializado, mas neste segundo tanto quanto saiba é que continua em banho-maria e daí assistimos a esta confusão, porque no primeiro mandato não foi tanto assim, terá havido um patrocinador que subsidiava as despesas da arbitragem e isto é o ideal à semelhança de outras paragens.
Quem era o patrocinador?
Não me estou a recordar agora, mas não só patrocinava a arbitragem como também as equipas do Girabola.
Que modelo serviria para Angola?
Pela experiência não só nossa, mas a dos outros países mais evoluídos, nomeadamente o continente europeu, hoje por hoje, as arbitragens são, digamos, independentes, podem é estar estruturadas pela federação, mas devem ser independentes.
No caso concreto de Angola, a arbitragem é um departamento da federação, mas a mesma FAF não custeia as despesas administrativas do sector, antes pelo contrário os árbitros são descontados.
Isso condiciona muita coisa.
Esses descontos nunca foram motivos de reclamação por parte da classe? Já houve litígio entre a Associação dos Árbitros e o Conselho Central da Arbitragem. A associação nunca concordou com esses descontos, uma vez que o Conselho Central é um órgão dependente da Federação.
Não é justo os árbitros que já ganham uma ninharia sejam mais descontados nesta ninharia para contribuírem para as despesas da própria arbitragem.
O que é que os adeptos deveriam saber?
Os adeptos devem compreender que os árbitros ganham aquilo que os clubes anfitriões pagam. Por exemplo, um árbitro vai ao Huambo para um jogo, implica que a equipa local é que assume todas as despesas, ou seja, custeia a deslocação, alojamento, alimentação e o prémio de arbitragem.
Quem estipula o prémio da arbitragem?
O prémio da arbitragem é estuplado pelo Conselho Central da Arbitragem e as equipas e, mediante reuniões, chegam a um entendimento.
Recentemente, o técnico do 1º de Agosto, Filipe Nzanza, fez duras críticas à arbitragem, foram justas ou não?
Quando alguém reclama é sempre por algum motivo e é como se diz na gíria, “não há fumo sem fogo”. Antes do técnico Filipe Nzanza, o qual auguro sucessos no 1º de Agosto, outros se haviam pronunciado.
Um deles é o mais velho Dionísio de Almeida, uma pessoa por quem tenho muito respeito e abalizada nesta área, pois no decorrer do jogo foi discordando das decisões do árbitro.
Ele foi dizendo que o árbitro estava a enervar os jogadores, daí que surgiu o primeiro cartão vermelho directo.
O mais velho Dionísio fez referência que foi excesso de zelo por parte do árbitro.
Aquilo desequilibrou o jogo em si.
No decorrer do jogo o árbitro foi tomando outras decisões e depois a outra expulsão, por acumulação, a um atleta do 1º de Agosto, não houve tanta reclamação, mas a equipa já não se encontrou e o Filipe, na minha opinião, teve razão em falar.
As notas dadas aos árbitros depois dos jogos engajam o Conselho Central ou somente os profissionais?
Os árbitros, quanto à pontuação, na maioria das vezes, eu acompanho, recebem a nota três e para dizer que esse que apitou o jogo do 1º de Agosto frente ao Interclube recebeu nota um, mas a maioria recebe a nota três, raras vezes recebem a nota quatro ou cinco.
A nota três é positiva?
A nota três é positiva, na medida em que a nota máxima é cinco, pois três está acima da metade.
A nota três não tem sido atribuída com algum desdém?
Não acredito tanto, pelo que acompanho, tem sido com justiça, talvez num ou outro caso seja feito com algum desdém, mas na maioria não.
O Conselho Central de Árbitros conta com instrutores à altura?
Há uma fornalha de instrutores formados pela Federação Angolana de Futebol (FAF) os quais têm respondido positivamente e são os que têm orientado os nossos árbitros.
Capacidade não lhes falta e de uma maneira geral têm uma formação acima da média, diferente do nosso tempo, por isso têm a obrigação de fazer mais e melhor do que noutro tempo.
Por isso, é importante verificar se os factores internos e externos que contribuem para que a arbitragem não esteja no seu melhor.
A “quota” de árbitros angolanos, muito reduzida, para as competições internacionais tem muito que ver com o desempenho interno?
Penso que nos falta “lobbies” na Confederação Africana de Futebol (CAF) para podermos ter mais profissionais nas grandes competições. Isso não acontece infelizmente, por isso somos prejudicados.
Temos que trabalhar mais “lobbies”.
Anteriormente, tentamos marchar para essa direcção, no tempo do Farah Adu, fez algumas apostas na arbitragem angolana e um deles foi o árbitro assistente Adão Simão, que infelizmente partiu no ano passado, e depois surgiram outros como Hélder Martins, o Jerson Emiliano.
Para o nosso país é pouco.
E o desempenho do nosso futebol?
Pode ser um factor condicionante.
Há sempre uma pergunta polémica e quem está de fora nem sempre responde. Há ou não corrupção na arbitragem angolana?
Essa é uma velha “maka”.
Pessoalmente, já falei muito sobre isso, já recebi ameaças.
Não há rosto, mas a culpa não pode e nem deve morrer solteira. Isso é reflexo da própria sociedade em si.
Não deve haver alguma pressa em se condenar os árbitros.