A tristeza abalou a comunidade ilhoa, em particular, e da província de Luanda, em geral, com a partida para a eternidade de António Custódio, então presidente do grupo carnavalesco União Mundo da Ilha, para a sua última morada, no cemitério de Sant’ Ana, na passada Quarta-feira, 12.
Na sede da agremiação, familiares, amigos e representantes de alguns grupos carnavalescos da capital recordavam os últimos momentos que estes partilharam com o finado, não só ao nível de exibições, mas também, de concertações.
Com um ambiente pouco comum ao que os ilhéus e não só estavam acostumados, cenário idêntico, encontramo-lo ao longo daquele perímetro, sobretudo no areal da praia, localizado na parte frontal da agremiação, onde Custódio, era também recordado com canções que marcaram algumas conquistas do grupo, e as mais recentes levadas à competição na recém-realizada edição 2024, do Entrudo, nas duas categorias.
Para espantar a tristeza e recordar condignamente o presidente pelos feitos em prol do fortalecimento do União Mundo da Ilha, as anciãs, muitas delas, antigas bailarinas desta formação, que desde então dedicaram a sua juventude ao Carnaval de Luanda, vestidas a bessangana, exaltavam-no frequentemente com gestos moderados, típicos do carnaval, demostrando a sua força e dedicação.
Apesar de alguma limitação em termos de mobilidade, por força das suas idades, apoiando-se nas varas canadianas, mesmo sentadas, as antigas bailarinas não se cansavam de exibir os toques do Semba carnavalesco que foram presenteando aos foliões da cidade capital durante vários anos. Uma delas é a anciã Madalena José, de 84 anos, antiga vocalista do União Mundo da Ilha.
Consternada com a perda do seu responsável, lamentou o infortúnio, mas não se fez derrotar psicologicamente pela perda e exortou os membros desta formação a seguirem o seu exemplo.
Apoiada também numa vara canadiana, devido a alguma fragilidade nos membros inferiores, a anciã salientou, que nem sempre os homens são recordados pela perda ou pela sua passagem para a outra dimensão, mas, pela grandeza, pelo exemplo, pela responsabilidade, pela força e pela energia que foi transmitindo ao longo do tempo ao seu elenco, sobretudo aos bailarinos.
“As pessoas passam e as suas obras permanecem para sempre. Estamos a exaltar o nosso líder da melhor forma e seguimos em frente com coragem e determinação”, realçou.
Revigorada, e exibindo os toques de varina, típicos nas suas representações competitivas, anciã Madalena realçou que é com a força energética e comprometimento que todos os seus associados podem manter uma instituição intacta, à qual todos pertencem e se revêm.
“Estamos conscientes que perdemos um líder. É doloroso, mas, não podemos parar por aí. O União Mundo da Ilha não cruza os braços.
Da mesma forma como o presidente Custódio se engajou nos destinos e no fortalecimento do nosso grupo, também o faremos, e quem vier a substituí-lo também deverá mostrar trabalho. Temos forças suficientes e estamos preparados para os próximos desafios.
O União Mundo da Ilha está preparado”, disse a anciã. Na verdade, era comovente encarar alguns cenários, mas também reconfortante, tendo em conta as idades que estas anciãs têm, e vê-las exibir ainda hoje, os toques que aprenderam durante a sua mocidade, na pista marginal de Luanda, tornando-se hoje uma marca registada, no que ao Entrudo da cidade capital se refere.
Quatro dias de vigília
F oram quatro dias de vigília partilhada, desde a sua partida, no dia 09, com outros grupos carnavalescos, ao ritmo do Semba executado ao vivo, pese embora não tenha sido em condições a que muitos de nós fomos habituado a apreciar em momentos de alegria.
Quem também não se fez esperar para recordar as qualidades do líder do União Mundo da Ilha foi a Tia Isabel, por sinal, sua irmã.
A nossa interlocutora recordou que o seu irmão, quando pequeno, além do desporto que sempre praticou, tinha um certo fascínio pela dança de carnaval.
Saía sempre da Samba para a Ilha dançar o carnaval e assim foi seguindo a cadência do antigo presidente que também já partiu para a eternidade até enquadrar-se.
Pela sua eficiência, Custódio foi ,com o passar do tempo, eleito presidente do União Mundo da Ilha, função que exerceu até ao seu último dia de vida.
Antigos companheiros também o recordaram como um homem exemplar. É o caso de Manuel Gonçalves, Vice-governador provincial de Luanda, para o Sector Político Social, lamentando a perda, admitiu que nunca estamos preparados para nos despedirmos para sempre de alguém, mesmo sabendo que somos seres mortais e que faz parte da vida.
Triste desabafou, “Meu kadiave, meu chapa, meu companheiro das lides culturais e artísticas Babel Custódio, vives em mim. Paz à sua alma…”.
Porém, os desabafos, as lembranças e o reconhecimento não pararam por aí. Prosseguindo, Domingos de Brito, representante da APROCAL, na cidade ferro-portuária do Lobito, ao solidarizar-se com a família, lamentando igualmente o infausto acontecimento, exprimiu os seus sentimentos de pesar pela perda irreparável do seu membro.
“Que a sua alma descanse em paz entre o esplendor da luz perpétua”, adiantou. Já Adilson Panela, representante do grupo carnavalesco Juventude Unida do Kapalanga, endereçou em nome do seu colectivo as mais sentidas condolências à família, pela morte do seu ente-querido, Ti Mano, presidente do União Mundo da Ilha.
“Fomos surpreendidos por tão triste acontecimento que retira de forma uma ilustre figura do Carnaval de Luanda, dos nossos convívios.
Neste momento de dor, luto e consternação, a Direção do Grupo Carnavalesco Juventude Unida do Kapalanga endereça à família enlutada, amigos e pessoas muito próximas ao malogrado, os seus sentimentos de pesar e solidariedade”, argumentou.
Por sua vez, a cantora e vocalista do grupo União Mundo da Ilha, Tunicha Miranda, indagada quanto ao passamento físico do presidente desta formação carnavalesca, considerou a morte do responsável uma perda enorme para todos quantos com ele partilharam os melhores momentos, situação que no seu entender poderá ressentirse nos próximos anos.
Visivelmente triste e consternada, a cantora disse sentir-se desamparada, uma vez que o presidente da formação a que pertence deixa uma orfandade cultural muito grande, por representar uma figura de proa que inspirava grande confiança ao União Mundo da Ilha.
Recorde-se que o União Mundo da Ilha, de quem António Custódio foi o presidente, foi fundado em 1968 por habitantes indígenas, e é um dos grupos de Carnaval mais antigos de Luanda. Possui na sua galeria 14 títulos e usa nos seus número danças populares como a Varina e o Semba e canções em kimbundu.
António Custódio
Antigo praticante e dirigente de andebol, António Custódio, era um dos nomes mais sonantes do carnaval de Luanda, liderando um dos mais respeitados e o mais premiado grupo carnavalesco da capital, o União Mundo da Ilha.
Em vida, António Custódio era visto como um líder resiliente, inovador, criativo e que pautava pela fusão do tradicional e o moderno, permitindo a inserção de dezenas de jovens no conjunto, assim como novos esquemas e estilos dançantes.
Além da dança e do desporto, Mano era um empresário bem-sucedido no ramo das bebidas, tornando-se um dos maiores fornecedores de bebidas aos estabelecimentos da Ilha de Luanda e promotor de eventos culturais, com destaque para desfiles de danças carnavalescas nas ruas da ilha do Cabo e arredores.