Todas as músicas foram escritas e gravadas há mais de dez anos, antes mesmo de o músico partir para Cuba, de onde regressou doente em 2013. O lançamento será feito em dez das 18 províncias do país, mas é no Parque da Independência, em Luanda, onde o kudurista vai proceder à assinatura de autógrafos
O lançamento do último disco de Kuduro da carreira do músico Sebem será lançado, amanhã, em todas as províncias do país, como garantiu o próprio em entrevista ao OPAIS.
Serão, no total, nove faixas musicais inéditas, que farão parte daquela que será a última obra discográfica da carreira de Sebem, um dos fundadores do estilo e dos mais controversos kuduristas de todos os tempos, Embora o lançamento esteja previsto para dez das 18 províncias do território nacional, será no Parque da Independência, em Luanda, que o artista vai estar presente para autografar a obra que terá uma quantidade total de 35 mil cópias que estarão disponíveis aos seus fãs.
Todas as músicas foram escritas e gravadas há mais de dez anos, antes mesmo de o músico ter ido a Cuba, em Novembro de 2013, para participar nas comemorações do dia da Independência Nacional naquele país e onde teve uma crise de saúde.
Na altura, Sebem, autor do hit a “Felicidade”, sentiu fortes dores de cabeça ainda em palco, mas conseguiu continuar a actuação.
O primeiro diagnóstico foi de que tinha um tumor na cabeça. Em seguida, os médicos consideraram que o kudurista tinha um parasita no sistema nervoso, uma doença rara provocada pela larva Ténia Solium e que pode entrar no organismo através da ingestão de água ou alimentos.
De lá para cá, o músico foi submetido a vários procedimentos médicos, estando submetido, actualmente, a uma cadeira de rodas e processos terapêuticos incentivos.
“Esse disco foi uma surpresa até para mim”
Hoje, a recuperar-se da doença, Sebem disse que também foi surpreendido com a proposta de lançamento do disco que, conforme afirmou, não estava nos seus planos.
Referiu que se sentiu surpreendido quando foi confrontado pelo productor executivo da obra, Pandy Santana, que disse ter em sua posse nove músicas suas inéditas gravadas, tendo de seguida proposto que fossem compiladas num único disco.
Ainda apavorado e a poucas horas do lançamento da obra discográfica, Sebem diz que, até ao momento, a “ficha não caiu” por não se lembrar do estúdio nem as circunstâncias em que gravou as músicas.
“Fiquei muito surpreendido quando o Pandy Santana me deu a ouvir as músicas. São coisas de que já não me lembrava, mas que ele guardou ao longo destes dez anos. Mas estou feliz. Estou a receber muita força dos meus amigos e colegas”, frisou.
Por dentro do disco
Para além do estilo Kuduro, Sebem, cujo estado emocional e a qualidade da fala registou melhorias significativas e surpreendentes, disse que o disco vai contar igualmente com músicas do estilo Sungura e Semba, mas todas cantadas em português.
“Quando o Pandy Santana me meteu a ouvir as músicas, eu fiquei malaike. Perguntei para mim mesmo: xé, eu é que fiz esses sons.
Não acreditei, mas gostei muito da ideia, apesar de eu não querer mais fazer Kuduro”, destacou. Para além de Pandy Santana, Sebem disse que o lançamento do disco só está a ser possível graças ao empenho e apoio de muitos dos colegas que estão a dar o pouco de si para que a obra seja materializada. “São muitos que estão a me apoiar.
Pessoas que eu não contava que um dia me poderiam ajudar, mas que estão a dar aquela garra”, disse.
Manter o nome
Depois de muitos anos fora dos palcos, Sebem assegura estar preparado para retornar ao mundo da música, embora reconheça as suas limitações.
Disse ainda que este regresso à Praça da Independência vai ser o momento ideal para manter o nome e a fama que ostenta há anos.
“É engraçado que, mesmo depois de muitos anos fora da música, as pessoas estão ansiosas para me ver.
Estou a receber mensagens e telefonemas de muita gente que está ansiosa para o dia chegar. Vai ser uma bomba”, garantiu.
Reconhecimento do estilo
Sebem, que tem uma grande legião de fãs, pediu aos seus admiradores que apareçam de forma respeitosa aos locais de venda, sobretudo no Parque da Independência, onde estará para a assinatura de autógrafos.
Salientou que, só de forma ordeira, é que se poderá, uma vez mais, demonstrar à sociedade que o Kuduro, apesar de ainda ser discriminado, é o estilo da maioria devido, sobretudo, ao número de pessoas que arrasta.
O músico reconhece a baixa que o Kuduro teve com a sua ausência, do Tony Amado e com a mais recente morte de Nagrelha.
Mas defende mais trabalho com qualidade para se continuar a fazer o estilo de modo a se alcançar o reconhecimento e a devida valorização.
Mostrou-se ainda preocupado com a qualidade e conteúdo das músicas que, no seu entender, deviam ser mais trabalhadas, e não apenas a vontade de fazer dançar. “Eu entendo a saída do país de Tony Amado.
Aqui em Angola, se não és reconhecido pelo Governo, já não serás reconhecido por ninguém. E o Tony Amado não tinha muita coisa, como eu.
Mas é preciso que os que ficaram saibam fazer bem o seu trabalho no Kuduro”, defendeu.
O fim de uma longa jornada
Apesar de considerar que ainda tem muito a dar na música circular, com realce para o Kuduro, Sebem disse ter chegado o momento de pôr fim à carreira e dedicar-se à composição e interpretação de estilo gospel.
O reforço desta intenção, explicou, visa agradecer àquilo que considerou de “milagre que Deus operou na sua vida desde que teve o problema de saúde”.
Disse que a luta para voltar ao estado normal é diária, mas valoriza pequenos gestos e ganhos, desde o facto de poder andar sozinho pela sala, mesmo que na cadeira de rodas, comer, ir a casa de banho, lembrarse de coisas do passado e poder falar e ouvir com mais qualidade e segurança.
Todos esses ganhos, indicou, não seria possível se não tivesse Deus na sua vida, por isso sentiuse na necessidade de glorificar através da dedicação à música gospel.
Conforme afirmou, é que, apesar das dificuldades que passa por não ter a sensibilidade toda recuperada, ainda assim se sente acarinhado pelos amigos, fãs, famílias e pelo Governo, a julgar por todos os apoios que recebe.
O músico entende que, se não fosse “Deus no comando”, hoje, talvez, não estaria a viver nas condições em que se encontra, com o mínimo de dignidade e condições.
“Por isso é que eu disse ao Pandy Santana que não quis mesmo mais voltar a cantar Kuduro. Quero levar uma vida normal e com Deus.
É que, apesar de estar numa cadeira de rodas, tenho uma casa, sustento e uma vida normal, coisas que muitos não têm”, reconheceu.
Família, legado maior, apesar de desestruturada
Enquanto conversava com OPAIS, Sebem, de 48 anos de idade, emocionou-se ao falar da família, sobretudo das filhas.
Disse ser um pai que procura, a todo tempo, esquecer-se das suas dificuldades para abraçar a família, embora reconheça que esta esteja desalinhada com aquilo que é a sua vontade.
Disse que, mesmo estando na situação em que se encontra, alguns membros da família, sobretudo a filha mais velha e a mãe, têm pautado por atitudes nada abonatórias, o que não ajuda para a seu bem-estar emocional.
“Mas ainda assim eu perdoo. Prefiro não guardar rancores, porque isso acaba prejudicando a mim mesmo. Então faço um esforço de esquecer os problemas que a Suely e a minha mãe criam”, apontou.
“É o Sebem numa outra versão”, diz produtor da obra
Por seu lado, o produtor executivo da obra discográfica de Sebem, Pandy Santana, disse que as músicas que compõem o disco foram gravadas em 2013, no âmbito de um projecto seu em colaboração com o cantor Jeff Brown.
Na altura, frisou, a ideia era “explorar” o talento de Sebem além do Kuduro e pô-lo a fazer outros estilos.
Entretanto, gravou-se a maquete inicial, mas depois, no mesmo ano, Sebem teve de ir a Cuba, onde aconteceu o fatídico acontecimento.
Ainda assim, de acordo com Pandy Santana, estava-se a trabalhar para que em 2017 o projecto fosse lançado, desejo que foi impedido porque, na altura, Sebem não apresentava melhorias significativas no seu estado de saúde.
“Por isso é que achámos por bem adiar o lançamento, porque não valia a pena lançarmos um disco cujo autor estava naquelas condições difíceis de saúde.
Então decidimos esperar até que a situação do Sebem melhorasse”. Todavia, dada a melhoria e evolução no estado de saúde, Pandy Santana referiu que se achou por bem retornar o projecto com o envio da maquete para o exterior do país, onde foi trabalhada para que se tenha a qualidade exigida pelo público.
O produtor executivo disse ainda que o disco vai custar 1.500 kwanzas, e parte dos valores vão ser entregues a Sebem, enquanto o restante vai pagar os custos da produção da obra. “Na verdade, essa obra é o Sebem numa outra versão.
E é um investimento privado que tem custos. Mas o Sebem terá a sua parte. Isso, pelo menos, está assegurado”, atestou.