Ricado kapuka é um dos poucos jovens do município da Catumbela, província de Benguela, que tem a arte como missão. Pintou o seu primeiro quadro aos 12 anos que ofereceu à sua mãe. Hoje, aos 42 anos, revela-se um criador aberto a diversos interesses, quer estilísticos como técnios e relata-nos a sua trajectória, e experiências no mundo das artes plásticas
Texto de: Augusto Nunes
Como é que Ricardo Kapuka se define socialmente?
S o c i a l m e n t e , Ricardo Kapuka é alguém atento ao seu meio e gosta de estar inserido na sua sociedade.
E artisticamente?
Arti sticamente exi stem momentos de algum isolamento ou introspecção, por motivos artísticos e criativos. Para mim, isso é algo mesmo necessário, ainda que por vezes.
Quando é que descobriu a vocação para as artes plásticas?
Esta vocação vem já desde a infância. É como que uma distracção em que crias o teu mundo interior, expressando-te através do traço e do desenho. E é algo que ficou até à minha vida adulta de hoje.
Quando é que pintou o seu primeiro quadro e o que retratou?
O momento em que considero ter pintado algo que posso considerar o primeiro quadro, foi quando estava entre os 12 e 13 anos. Pintei uma natureza morta, na qual retratava uma taça de vidro com frutas tropicais. Ofereci a obra à minha mãe.
Quando e onde realizou a sua primeira exposição? Não foi propriamente uma exposição. Foi entre 1987 e 1988, na sede da TPA de Benguela, e durante um programa regional semanal chamado “Dimensão 7”. Foi mais uma pequena mostra de alguns trabalhos de formato médio em papéis pintados a guache e acrílicos, do que outra coisa. E foi comentado pelo falecido artista plástico o Sr. Délio Baptista. Foi difícil a experência? Não foi difícil, pois eu fazia e faço arte por gosto e amor. Aliás, é uma paixão.
Quanto tempo levou a preparar as anteriores obras e quais foram as suas fontes de inspiração?
Naquela fase pintava sem restrições de tempo, praticamente não fazia outra coisa. Eu era um miúdo obcecado por melhorar tecnicamente, de superar-me a mim mesmo. Tive como inspiração principal a vida rural dos nossos povos.
Teve apoios, quem o ajudou a realizar a sua exposição?
O meu maior apoio tem sido a minha mãe e continua a sê-lo.
Como estão, em termos de exposições, Benguela e as outras províncias do país?
Uma das maiores dificuldades tem sido a falta de galerias de arte, espaços e salas para expor as obras dos nossos artistas. Tenho feito algumas mostras na minha província, tanto individuais como colectivas. Mas, mais do que em Benguela, tenho participado em actividades em Luanda. É claro que Angola inteira precisa de investir em novos espaços, para que a arte esteja mais presente e floresça.
O que mais o emocionou ou emociona nas artes plásticas?
Emociona-me o factor surpresa que a criação artística comporta, saber que se pode sempre fazer algo de novo, original e diferente. A imaginação como limite é uma regra para mim.
Acabou de inaugurar uma exposição na galeria do ELA – Espaço Luanda Arte. Como se sente, e que balanço faz desta exposição “Vida e Fé´?
Sinto-me feliz com a concretização do projecto desta exposição no ELA, pois é a minha primeira exposição individual em Luanda. Estou muito agradecido por tudo e todos que contribuíram para que tudo fosse possível, e tenho fé que muito mais ainda vai acontecer. Para quem quiser visitar a exposição “Vida e Fé”, estará exposta até ao dia 25 de Abril, bastando apenas que marquem a visita a qualquer hora de qualquer dia, dirigindose ao espaço na Rua Rainha Ginga nº 87, prédio DeBeers, piso 4, na baixa de Luanda.
Qual é o seu ponto de vista sobre as obras de artes plásticas produzidas actualmente no país?
Nos nossos dias fala-se muito em diversificação da economia, e eu quero acreditar que a cultura de forma geral, com isto, vai ganhar um lugar cada vez maior. Penso que quando se fala de “arte e cultura” temos de ter um olhar bastante abrangente, até na perspectiva das gerações vindouras – o nosso legado. O nosso património cultural, quem somos, como somos vistos, como seremos valorizados ou como devemos nos valorizar. Muitas questões que merecem uma discussão mais ampla.
Já agora, como está a Catumbela em termos de produção artística, refiro-me às artes plásticas?
A Catumbela é mais conhecida pelo Carnaval, com os “Bravos da Vitória”. Mas existem artistas nas mais variadas disciplinas. Contudo, volto a dizer que faltam espaços condignos para mostrarmos esses talentos.
E a província de Benguela no seu todo?
O que disse atrás também se lhe aplica: culturalmente, temos de valorizar o que é nosso. E se assim não for, quem o fará?
Projectos para o futuro?
Sou um artista com diversos interesses, quer estilisticamente como tecnicamente, podem esperar mais exposições e outras surpresas.
Sente-se um artista realizado?
É muito pouco provável sentirme artisticamente realizado, pois como artista a busca é eterna.
Quais foram os momentos mais marcantes da sua carreira ?
Nunca encarei ou analisei o que faço em termos de carreira, até porque não escolhi propriamente ser artista ou fazer arte. Penso que é mais o inverso: a arte escolheume. Como momento marcante guardo a minha primeira mostra de arte.
Entretanto, certamente houve momentos mais fracos?
Porquê? Não os chamaria “momentos mais fracos”, até porque a vida não é linear. Existem momentos bons, e menos bons, mas tudo faz parte da mesma viagem. É assim que vejo e aceito a vida, e não olho muito para o lado negativo. Afinal, também aprendemos com os erros.
Que lembrança guarda da sua infância?
Lembro-me a correr de carvão na mão, a riscar os muros com os meus rabiscos e a levar puxões de orelha pela brincadeira…
É o primeiro artista da família ou sofreu influência de alguém?
No meu lado materno, vejo muita gente com jeito nas mãos – mais directamente a minha mãe tem um tremendo jeito para toda espécie de trabalhos manuais. Já o meu tio, irmão mais novo da minha mãe, é arquitecto, incentivou-me, e continua a incentivar-me bastante na missão para com as artes.
Percurso artístico
Ricardo Kapuka nasceu na Catumbela, em 1976. Vive e trabalha na Catumbela. Estudos 2003- Desenho de animação 2D, Neuroplanet, Lisboa, Portugal. 1994- Artes gráficas, Centro Profissional da Amadora, Portugal.
Prémios
- 2016– Prémio Alliance Française – Ensa/Arte, Angola.
- 2016- 2º Grande Prémio “Ensa/ Arte” Pintura, Angola.
- 2012– Prémio “Ensa/Arte” Especial Províncias, Pintura, Benguela, Angola.
Colecções
Obras representadas em colecções particulares de Portugal, Canadá, e Angola, com destaque para a colecção de artes do Banco Caixa Totta, Angola.
Percurso
Autodidacta das artes plásticas. Residiu em Portugal entre 1994 e 2009.
1998/2002– Fez parte da juventude do Coletivo de Artistas Plásticos de Almada “IMARGEM” e participou em várias exposições colectivas em Almada, Portugal.
1987- Primeira mostra de trabalhos aos 11 anos de idade na sede da TPA, na província de Benguela (comentada pelo Sr. Délio Batista, artista plástico).
Exposições individuais
2016- “7 Dias/Antes e Depois”, Nuno Sacramento Arte Contemporânea, Ílhavo, Portugal. 2011- “Antes de Tudo”, Galeria Kanawa, Restinga do Lobito, Angola.
2011- “Pinturas de Kapuka”, Galeria Benamor, Benguela, Angola.
2010- “Pinturas de Kapuka”, Galeria Benamor, Benguela, Angola.
Exposições colectivas
2017- “A Figura Humana na Arte Angolana” Galeria da Sede do Banco Económico (Luanda, Angola).
2016- “Ensa/Arte”, Pintura, Benguela, Angola.
2013- “Bakalhau”, Pintura Escultura e Fotografia, Ílhavo, Portugal. Curadoria Nuno Sacramento, Arte Contemporânea.
2013- “Arte 100 Fronteiras”, Mostra de Arte Contemporânea do Lobito (MACLOB), nos Correios do Lobito, Angola,“Comemorações do Centenário da Cidade”, Mostra de Arte Contemporânea do Lobito (MACLOB), nos Correios do Lobito.
2012- “Ensa/arte”, prémio especial de Pintura, Benguela.
2010- “Leigos para o Desenvolvimento”, no Museu de Arqueologia de Benguela, Angola.
2010- “25 Anos da Xá de Caxinde”, Lobito, Angola.
2010- Exposição alusiva à visita da ex-1ª Dama de Angola, Ana Paula dos Santos, no Museu Arqueologia de Benguela, Angola.
2010- “Nós e os Outros”, com a Artista Eurídice Cruz Neto, no Museu de Arqueologia de Benguela.