Em respeito a esse valor cultural da tradição dos povos de Cabinda, a nova governadora, Suzana Fernanda Massiala de Abreu, depois de ser empossada e apresentada, na segunda-feira, a vários estratos da sociedade na província, foi ontem ao Tchizo, para cumprir o ritual da bênção tradicional dos Bakama, com vista a ser assegurada pelo poder dos ancestrais.
Segundo o chefe interino dos Bakama do Tchizo, Manuel Morais, é muito importante que esse ritual seja feito, porque “fortifica a própria entidade, dá mais visão ao seu trabalho do dia-a-dia como governadora”.
“Este ritual marca um momento muito valioso para nós, e todo governante tem uma óptima referência quando chega nessa localidade, porque é um momento singular que só acontece uma vez e, caso for reconduzido, aí sim, vem cumprir o ritual pela segunda vez”, referiu aquela autoridade tradicional.
Como a actuação dos Bakama está envolto de grande secretismo, houve determinados momentos em que a actividade esteve restrita apenas na pessoa da governadora Suzana de Abreu, o secretário da Cultura, Ernesto Barros André, e ao administrador municipal de Cabinda, Guilherme Pereira, quando estes se dirigiram no santuário dos Bakama para o ritual da bênção e do aconselhamento dos mascarados.
Segundo explicações da autoridade tradicional, Manuel Morais, é proibida a entrada de pessoas estranhas no santuário dos Bakama, sobretudo os órgãos de comunicação social, na medida em que o que está lá dentro não pode ser divulgado, porque “a tradição dos Bakama é uma sociedade secreta que não pode ser revelada ao público”.
Para o secretário provincial da Cultura, Ernesto Barros André, o ritual da bênção tradicional dos Bakama representa o valor cultural da tradição cultural dos povos de Cabinda. “Todos os governadores que chegam à província de Cabinda são submetidos, obrigatoriamente, a esse ritual, para serem assegurados pelos nossos ancestrais.
É nesse sentido que os governadores nomeados respeitam esse valor cultural que nós temos a nível da província de Cabinda e, tão logo chegam, têm passado no Tchizo, cumprindo esse ritual da bênção tradicional, com vista a serem assegurados pelo poder dos nossos ancestrais”, sublinhou.
Depois da cerimónia da bênção, a governadora Suzana de Abreu descreveu o acto como sendo uma aula de cultura, um ritual cultural igual a qualquer outro como académico, religioso ou social. Por isso, a governadora Suzana de Abreu lançou um repto: “Nós, os Cabindas, gostamos de desprezar um pouco este ritual dos Bakama. Cada povo tem os seus rituais e essa é a nossa identidade cultural.
Vamos olhar para esse ritual dos Bakama com um valor cultural que merece ser apoiado no quadro da nossa cultura, porque é isto que nós somos”. Para a nova governadora de Cabinda, durante o ritual da bênção tradicional dos Bakama, saíram ensinamentos, lições de liderança e de convívio e lições de como ser uma boa pessoa.
“Aprendi tanto hoje como se nunca tivesse oportunidade de aprender com os Bakama, como aprendi hoje. Estou muito grata pelos conselhos e lanço aqui outro repto aos académicos para começarmos a escrever e publicar isto, porque não podemos deixar de viver e vivenciar aquilo que nos identifica como cabindas. Vamos valorizar a nossa cultura.”
Quem são os Bakama?
Os Bakama constituem um dos mais notáveis símbolos da cultura tradicional da província de Cabinda. São uma instituição secreta de carácter excepcional, cujas exibições se reflectem no baluarte da pureza e da moral da sociedade, segundo apurou o OPAÍS.
São temidos por terem o poder de amaldiçoar. Através de rituais próprios, intercedem junto dos antepassados para apaziguar e regular os conflitos que afectam os sagrados valores éticos, morais e culturais, de acordo com as nossas fontes.
Dizem ainda que a sua origem é remota e praticamente desconhecida, já que se torna difícil determinar com alguma certeza e rigor a sua proveniência quer no tempo quer no espaço. Sabe-se apenas que, os Bakama estiveram, no passado, ligados ao culto “Lusunzi”, um génio da terra, que servia de intercessor entre Deus e os homens.
A sociedade secreta dos Bakama está envolto num mundo misterioso. Os seus segredos não podem transpor as barreiras do grupo. “Qualquer pessoa pode fazer parte desse grupo? Não. Só podem integrar indivíduos que têm uma ligação directa às pessoas ou aos familiares daquele círculo tradicional e aquele mundo cultural”, esclarecem.
De salientar que actualmente estão identificados cinco grupos de Bakama nas localidades de Tchizo, Povo-Grande, Ngoio, Chinzazi e Sussu, mais concretamente nas regiões que constituem a etnia Bawoio, que parte da aldeia de Buco-Mazi ao Yema, na fronteira sul da província de Cabinda com a RDC.
Os Zindunga do Tchizo são os mais notáveis e referenciados em toda província. Nas cerimónias, se apresentam num total de onze mascarados e quando convocados em circunstâncias próprias actuam quer em público, quer em privado.