“Thambwé” é a denominação do projecto que visa dar maior visibilidade àquilo que é o património musical cokwe, que culminou com a exposição multidisciplinar, preenchida com fotografias, áudios, vídeos, instrumentos musicais, patente na sala de exposição do Instituto Camões, em Luanda
O projecto apoiado pelo Procultura, Embaixada de Espanha em Angola e pela Fundação Terra Aberta (Bruxelas) foi desenvolvido na província da Lunda-Norte durante dois anos, e teve como base de pesquisa o Museu Regional do Dundo, apresentado na passada Terça-feira, 27, ao público.
Durante o trabalho que contou com a colaboração de músicos locais foi feita a digitalização e recuperação do fundo fonográfico do museu, com 640 músicas, das quais 416 do estilo cokwe, coordenado pelo etno-musicólogo e compositor espanhol David López Sáez.
Foi possível através deste projecto a criação da escola de música tradicional, no Museu Regional do Dundo, com o objectivo da transmissão do património musical cokwe, através deaulas de percussão, canto, dança, kisanji. Participaram nas aulas 30 alunos entre os dez e 20 anos de idade.
As aulas de canto foram ministradas pelos músicos (professores) Bernardo Muatxissengue, na área se percussão, Rogério Muquena, canto, Mateus Chela, dança, Moisés Lengue, tocador de kisanji, Muhitxiqueno Cavula, assistente de percussão, seleccionados através das suas trajectórias musicais.
Nas aulas foram transmitidas canções cokwe de fitas magnéticas do Museu, digitalizadas pelo projecto: músicas antigas gravadas pela extinta Companhia de Diamantes de Angola – Diamang, em meados do século 20.
Nas lições de percussão estiveram em destaque os principais batuques da cultura cokwe, nomeadamente ngoma ya kasumbi, ngoma ya kasasulwilo, ngoma ya xina.
Por sua vez, na dança os diferentes movimentos usados nos ritmos como ciyanda, akishi e cisela. Já nas aulas de kisanji foi ensinada a forma tradicional cokwe de tocar este tipo de instrumento. Uma outra escola criada foi a de construção de instrumentos musicais na Aldeia de Cambuaji, município de Lóvua.
David López Sáez, que interagiu com os aldeões disse que a primeira missão foi ir à procura dos músicos, dos melhores que podiam ser os professores, baseando-se na sua trajectória, ao mesmo tempo conhecedores da tradição.
Também dos artesãos identificados pelo projecto. “Fomos até às aldeias localizar os artesãos, aqueles que produzem instrumentos tradicionais. O primeiro objectivo era para fornecer à escola de instrumento.
Também fomos à procura de músicos na Lunda-Norte para fazer vídeos, que perfizeram quatro grupos que estão apresentados na exposição”, explicou.
O etno-musicólogo realçou que o projecto pode ser resumido em três eixos; recuperação, transmissão e a divulgação do património musical cokwe.
Referiu que na exposição é apresentado à mostra do resultado alcançado pelo projecto. Aponta como um dos principais resultados a digitalização do fundo fonográfica do museu, já que a ideia era de trazer este material à vida. Então, a melhor forma de o fazer foi através de uma escola, com a transmissão das músicas antigas.
“Na exposição temos a música original, do outro lado a interpretação da música pelas crianças da escola. Temos ainda a escola de instrumento na aldeia Cambuaji, que fica a 60 quilómetros do Dundo.
A ideia era de fazer a escola naquela aldeia e beneficiar os jovens que, de alguma forma, são capacitados ao aprender um ofício, ao mesmo tempo que valorizam a sua cultura”, apontou.
Maior incentivo aos cidadãos
David López Sáez, que interagiu directamente com os cidadãos durante o projecto com os cidadãos nesta localidade, refere que possui um acervo cultural muito rico, senão mesmo um dos mais ricos do país.
Um património que considera interessante, mas observa que merece algum incentivo, ou mesmo apoio para poderem trabalhar.
“Os músicos não têm incentivos, as pessoas não conhecem os instrumentos musicais, principalmente os jovens. Então, acho que é preciso um trabalho de valorização”, asseverou.
Ao falar do estado actual do Museu Regional do Dundo, David, com uma expressão constrangedora, disse que a instituição praticamente não funciona.
Que a mesma fisicamente está deteriorada, sendo que as peças não estão conservadas e “a biblioteca dá pena ao entrar ali. Um espaço onde não existe um ambiente de trabalho.
É como um elefante a caminho do cemitério, já que se encontra em estado de abandono físico e moralmente”.
Apoio institucional
Presente no evento, o Embaixador da Espanha em Angola, Manuel Lejarreta, avançou que as fitas magnéticas foram cedidas pela empresa nacional Diamang, dos anos 60.
Entre as várias instituições realçou o Fundo Musical Tradicional do Conselho Superior e Investigação Cientifica de Espanha, sedeada em Barcelona, que procedeu à digitalização e a recuperação das fitas magnéticas que serão entregues ao Museu Regional do Dundo.
“Gostaria de dizer aqui à Cooperação Espanhola, principalmente ao Conselho Superior de Investigação Científica que foi um grande prazer colaborar nesta ocasião.
Porque todos sabemos a importância da cultura, a importância das artes que prevalecerão para sempre. Trata-se não somente de digitalizar mas também de recuperar a cultura cokwe, muito interessante, que tem muita força nesta terra angolana”, enfatizou.
MINCULTUR enaltece iniciativa
Em representação do ministro da Cultura e Turismo, Filipe Zau, Alice Beirão, consultora, apresentou uma mensagem de agradecimento, que prestigiou a inauguração da exposição, resultante deste projecto de divulgação do património musical cokwe.
Alice Beirão em nome do dirigente do Ministério da Cultura e Turismo (MINCULTUR) enalteceu o facto de o projecto ter alcançado em termos de digitalização e recuperação do fundo fonográfico do museu, um dos resultados mais significativos apresentado na exposição que recorre à fotografia, vídeo, áudio para trazer a música cokwe até à capital do país.
A consultora lembra que o MINCULTUR foi parceiro fundamental neste projecto e enaltece os resultados das pesquisas efectuadas que permitiu aos músicos e artesãos desenvolverem habilidades e capacidades através das aulas de canto, batuque, dança e kisanji durante a sua implementação.