O filme de Luca Guadagnino sobre um romance entre um adolescente e um homem mais velho mais não faz que inverter a situação de um formato tradicional do cinema. Eurico de Barros dá-lhe duas estrelas
Todos eles contemplam o mesmo tema: um adolescente é iniciado no amor e no sexo por uma mulher mais velha, quase sempre no espaço de um Verão, e servindo-lhe de introdução à idade adulta.
É uma fantasia sexual recorrente no cinema, que a tem tratado quer com pudor, quer como picante, ora como drama, ora como comédia, com maior ou menor carga erótica. “Chama-me pelo Teu Nome”, de Luca Guadagnino (“Eu Sou o Amor”, “Mergulho Profundo”), volta a visitar este tema. Agora com a diferença da situação ser homossexual em vez de heterossexual, envolvendo um rapaz de 17 anos e um homem com vinte e muitos.
O filme adapta parte do livro homónimo do escritor egípcio André Anciman, publicado em 2007 (a outra parte, em que os dois protagonistas são mais velhos e um deles está casado e tem filhos, vai também ser levada à tela por Guadagnino) e tem argumento do realizador James Ivory, autor de fitas como “Quarto Com Vista Para a Cidade” ou “Regresso a Howard’s End”.
Ivory ia realizar “Chama-me Pelo Teu Nome”, mas foi Luca Guadagnino, há vários anos associado ao projecto como colaborador, quem acabou por agarrar no filme, rodado na Lombardia, onde vive. Ainda quis fazê-lo a meias com o próprio Ivory, mas este declinou e chamou a si apenas os créditos de argumentista e produtor.
O protagonista é Elio (Timothée Chalamet), um jovem intelectualmente precoce e com talento para a música, que está a passar as férias de Verão, no início da década de 80, com os pais, na sua casa de campo.
O pai é um prestigiado professor de Arqueologia e a mãe uma intelectual distinta, e a família vive num ambiente de conforto, privilégio, cultura e erudição, onde se fala inglês, italiano, francês e alemão.
Todos os anos, o pai de Elio selecciona um estudante recém-formado para ser seu assistente durante o Verão. E assim surge Oliver (Armie Hammer), um americano bonito e atlético, que cai de imediato nas graças dos pais de Elio, dos amigos e amigas destes, e até dos habitantes da vila, e com o qual o rapaz embirra, virando-se para Marzia, com a qual tem um namorico. Só que lentamente, Elio começa a sentir-se atraído por Oliver. (Num filme feito há 20 ou 30 anos, Oliver seduziria a balzaquiana mãe de Elio e não o filho).
O facto de estarmos nos anos 80, quando a atitude social para com a homossexualidade e a sua visibilidade quotidiana e mediática eram o oposto de agora, frisa a ideia de clandestinidade que envolve a história do filme, sensualmente fotografado pelo tailandês Sayombhu Mukdeeprom, colaborador de Apichatpong Weerasethakul e que trabalhou em “As Mil e Uma Noites”, de Miguel Gomes.