A organização e realização do Carnaval na capital do país é de inteira responsabilidade da Associação Provincial do Carnaval de Luanda (APROCAL), com mais de 25 anos de existência, que há muito anos vem se deparando com inúmeras barreiras e limitações para ‘sobreviver’ e concretizar a missão que lhe é, legal e oficialmente, confiada
Há mais de 15 anos, a organização actualmente liderada por Víctor Nataniel “Tany” Narciso tem as suas instalações a funcionar num pequeno escritório adaptado, no degradado e quase abandonado Estádio da Tourada, no distrito da Maianga, enfrentando inúmeras dificuldades para se manter em “pé”, sobrevivendo de apoio de parceiros e associados.
A Tourada, aquela gigantesca infraestrutura erguida, na década de 1960, com o objectivo de ser uma praça de Touros, apesar do seu estado degradante, acomoda vários estabelecimentos e postos de serviços, servindo de “refúgio” para acolher a sede da maior e mais prestigiada Associação Carnavalesca do país.
No interior do espaço, as paredes humildemente pintadas tentam esconder o estado de degradação daquela estrutura carente de intervenção de obras “urgentes” e profundas, que vem servindo também de abrigo para desamparados que deambulam nas imediações adjacentes ao histórico Estádio Nacional da Cidadela.
Logo à entrada, bem no centro da sala de recepção, encontram-se três sofás velhos ‘cansados’, impróprios para acomodar alguém, repletos de pequenas manchas e furos em várias partes, reflectindo a necessidade de ser reestruturado ou mesmo substituído.
Instalações eléctricas adaptadas, bem à frente, uma secretária já um pouco velhinha e compartimentos com sinais de infiltração é o cenário que se pôde verificar no interior da sede da APROCAL, numa visita guiada pelo secretário-geral daquela organização carnavalesca. Em entrevista exclusiva a OPAÍS, o secretário-geral da associação, António de Oliveira ‘Delon’, disse que várias são as limitações que a organização vem enfrentando, há mais de duas décadas, sendo a carência de um espaço digno para acolher a sua sede, uma das mais visíveis.
Explicou que a falta de alternativa “obriga” a direcção a continuar se “remediando” naquela zona que, dado o estado de conservação da infraestrutura, considera-se uma zona de risco para quem nela habita. Segundo conta, algumas intervenções ligeiras foram feitas interna- mente no escritório da associação para “camuflar” o estado degradado que a mesma apresenta, e permitir que a instituição dê seguimento às suas actividades laborais, dentro das condições mínimas e difíceis que o espaço oferece.
Delon adiantou que a instituição já várias vezes procurou bater portas de terceiros para solicitar apoio referente a um local que pudesse acolher a sua sede, mas até ao momento sem sucesso. Receoso, admite que o espaço que acolhe a sede não é digno, tendo em conta a dimensão da organização, e afirma que a situação já é de domínio das instituições do governo, mas até ao momento nada foi feito para resolver.
Entretanto, mantém viva a esperança de ver a situação ultrapassada dentro de poucos anos. Frisou que a infraestrutura já esteve em condições piores, forçando a direcção da APROCAL a realizar pequenas obras de intervenção imediata para, embora timidamente, mitigar os efeitos das péssimas condições em que o espaço se apresenta e que vai piorando a cada ano que passa, sobretudo em épocas de chuva. “Em termos de funcionamento até estamos bem, mas quanto à nossa instalação não estamos nada bem, precisamos de melhorar a nossa infraestrutura. Já estivemos pior, mas estamos a aprender a superar, fazer como, temos que nos remediar”, expressou.
Uma direcção comprometida e resiliente
Apesar das dificuldades, a direcção da Associação Provincial do Carnaval de Luanda encabeçada por Victor Nataniel “Tany Narciso” (presidente), Diogo Colombo (como vice-presidente e António Francisco de Oliveira (como secretário-geral), mostra-se firme e resiliente, comprometida com o êxito e a melhoria da qualidade dos car- navais de Luanda, a cada ano que passa. Desde que tomou posse, em Maio de 2021, a equipa da APROCAL, que foi eleita com 56 votos a favor, nenhum contra e apenas um nulo, tem-se comprometido em, todos os anos, realizar um desfile de carnaval mais inclusivo, dinâmico, criativo e que reflecte a dimensão sociocultural de Luanda, como reitera “Delon”.
A meta, segundo frisa, é melhorar e superar as expectativas a cada edição, mas para tal, reitera, “é preciso um esforço enorme e um trabalho árduo apesar de as condições muitas vezes não permitirem”. ‘Delon’ afirma que tem sido um trabalho cada vez mais difícil organizar e realizar os carnavais de Luanda, sobretudo devido à escassez de verbas e apoios que possam suprir as necessidades e atender às exigências que o espectáculo em si impõe.
Confidenciou que, além das despesas com a organização do carnaval, internamente a APROCAL tem vivido também situações no que diz respeito à supressão das despesas, adiantando que vezes há em que a instituição vê-se com as “mãos atadas” sem verbas para pagar os funcionários. Contou que, às vezes, os funcionários ficam vários meses sem salários, porque a organização não dispõe de fundos próprios e depende daquilo que recebe de parceiros e “benfeitores”, ou até mesmo do governo central, em véspera dos preparativos para o carnaval. “É difícil tocar neste assunto porque é algo triste e lamentável, temos funcionários que consideramos heróis devido às suas entregas. Às vezes eles ficam mais de cinco meses sem salários e quando possível, temos que recorrer a parceiros para podermos cobrir”, revelou.
A “luta” pelo estatuto de ‘utilidade pública’
A par da questão da infraestrutura da sua sede, outra situação que aflige a associação carnavalesca é a “luta” pela aquisição do estatuto de “utilidade pública”. De acordo com o responsável, a associação vem há anos lutando para que lhe seja atribuído o estatuto de “instituição de utilidade pública”, condição que lhe dará o direito de ser orçamentada pelo Estado. ‘Delon’ adiantou que a entidade já deu entrada de todos os processos junto das instituições de tutela há mais de uma década, mas até agora não houve qualquer resposta. “Estamos a lutar no sentido de a APROCAL se tornar uma instituição de utilidade pública o que, achamos que daria um grande reforço naquilo que é o nosso funcionamento”, disse o responsável.
Referiu que, enquanto aguarda pela resposta das instituições de direito, a associação tem procurado trabalhar arduamente, junto dos seus parceiros, para projectar e realizar um carnaval cada vez melhor a cada ano, apesar das limitações que vão se impondo, em especial de fórum financeiro e material. Garantiu que a associação se mantém paciente e optimista em relação à atribuição do estatuto que muito anseia e que tudo tem procurado fazer para que tal acto lhe seja digno e mereci- do, reiterando que o estatuto será o sinal do “reconhecimento legítimo” por parte das instituições do governo. “Aguardamos que a APROCAL tenha o reconhecimento das instituições do governo. Tudo tem o seu tempo e estamos a trabalhar para isso”, reiterou.