O colectivo de três Juízes de Direito do Tribunal da Comarca do Huambo julgou, parcialmente, procedente a acção movida pelo Ministério Público, no âmbito do processo comum número 109/2025, em que são arguidos sete cidadãos, suspeitos de terrorismo, e condenou João Gabriel Deucinho, cabecilha do grupo, a 15 anos de prisão. O tribunal diz ter ficado provado o apoio financeiro e logístico da UNITA. O juiz primeiro assessor, Sebastião Sambuta Nanga, referiu, quando respondia aos quesitos, que Liberty Chiyaka teria orientado a destruição de provas, depois de o plano ter fracassado
Os juízes acordaram, em nome do povo, absolver o co-arguido Ade- lino Kamulombo Bacia de todos os crimes de que vinha pronunciado e acusado, fundando a posição no princípio jurídico-latino «In dubio pro reo», ou seja, em caso de dúvidas, deve-se decidir a favor do réu. Desta feita, mandam-lhe em paz e em liberdade.
O colectivo de juízes de direito absolveu os co-arguidos João Gabriel Deucino, Domingos Gabriel Muekalia, Crecenciano Capam- ba, Arão Rufino Eduardo Calala e Francisco António Nguli dos crimes de associação criminosa e fabrico, tráfico e detenção e alteração de arma e munições proibidas.
Por via do douto acórdão, são, igualmente, absolvidos os coarguidos Crecenciano Capamba e Arão Rufino Eduardo Calala do crime de organização terrorista. Francisco Nguli via-se também absolvido da prática do crime de fabrico, aquisição ou posse de substâncias explosivas, tóxicas e asfixiantes. Crecenciano Capamba foi absolvido do crime de falsificação de documentos. Desta feita, Pedro João da Cunha era condenado pelo crime de que Capamba foi absolvido, na pena de três anos.
O juiz-presidente da causa, Cipriano Catito Tchivinda, continuou a leitura do acórdão e deu nota de que o tribunal decidiu condenar o co-arguido Crecenciano Capamba por fabrico, aquisição ou posse de substân- cias explosivas tóxicas e asfixiantes, na pena de três anos e três meses de prisão.
O co-arguido Arão Rufino Eduardo Calala foi condenado pela mesma prática. Mas, diferente de Crecenciano Capamba, ele vai cumprir três meses a mais. Ou seja, vai ficar três anos e seis meses encarcerado. O colectivo de juízes deliberou que o co-arguido Domingos Gabriel Muekalia foi condenado por organização terrorista e, por isso, vai cumprir sete anos de prisão.
“Pela prática do crime de fabrico, aquisição ou posse de substâncias explosivas, tóxicas e asfixiantes, na pena de três anos e seis meses de prisão. Considerando as regras do concurso de infracções, vai o co-arguido condenado na pena única de oito anos», sentenciou o juiz.
Francisco Nguli, motorista do cabecilha, apesar de ter afirmado, em sede de julgamento, que se limitava a seguir ordens do seu patrão, nas circunstâncias do cabecilha, o tribunal condenou- o na pena única, pela prática de organização terrorista, de cinco anos de prisão.
Em relação a João Gabriel Deucino, o homem por via de quem tudo começou, o Tribunal da Comarca do Huambo condenou- o por organização terrorista (10 anos), fabrico, aquisição ou posse de substâncias explosivas, tóxicas e asfixiantes (4 anos e seis meses) e por falsificação de documentos (4 anos e seis meses).
Desta feita, considerando as regras de punição do concurso de infracções, vai, assim sendo, o co-arguido condenado na pena única de 15 anos de prisão. “Tendo em conta as circunstâncias da infração imputável ao co-arguido Pedro João da Cunha, por não se ter provado que o mesmo tenha tido consciência da conexão da falsificação de documento aos crimes imputados aos demais co-arguidos, vai suspensão a execução da pena de prisão a si aplicada por um período de quatro anos”, determinou o juiz, ao ordenar a destruição dos engenhos explosivos apreendidos, emissão de mandados de soltura a favor dos co-arguidos Adelino Bacia e Pedro João da Cunha.
Os sete arguidos sujeitam-se ao pagamento da mesma taxa de justiça, 100 mil kwanzas para cada um. O juiz principal da casa diz que o tribunal fundamentou a sua posição com base nas provas produzidas em sede de julgamento, em função daquilo que foram as declarações dos arguidos, declarantes, testemunhas, ao que se juntaram, igualmente, a defesa e o Ministério Público.
Antes da deliberação do colectivo de três juízes de direito, responderam-se às 110 perguntas, sendo 109 formuladas pelo tribunal e uma adicionada pela defesa. Ficou provado que João Gabriel Deucino, para a materialização do seu plano subversivo, contou com o apoio material, logístico e financeiro da UNITA, de quem recebia, mensalmente, três milhões de kwanzas.
O juiz primeiro assessor, Sebas- tião Sambuta Nanga, sublinhou, ao responder aos quesitos, ter ficado provado que Liberty Chiaka e João Gabriel Deucino destruíram alguns documentos que tinham sobre o projecto (acordos firmados), tendo o cabecilha sido orientado a destruir o seu telemóvel, depois de ele ter informado ao político de que o plano tinha fracassado, na sequência da detenção de outros co-arguidos pelas autoridades, no Huambo.
O tribunal também deu como provada a viagem feita pelo cabecilha ao Burkina Faso, onde, segundo referiu o juiz de direito, manteve contactos com altos funcionários da presidência daquele país, com destaque para o líder, capitão Ibrahim Traore. Para a viagem, ele desembolsou pouco mais de um milhão de kwanzas – conforme bilhete de passagem constante nos autos – deu-se nota.
Tribunal julga improcedente estatuto de réu colaborador
O juiz-presidente da causa, Cipriano Catito Tchivinda, julgou improcedente e indeferiu o pedido de delação premiada – para a realidade brasileira ou de es- tatuto arguido colaborador – nos termos do ordenamento jurídico angolano – requerido pela defe- sa, por entender que os arguidos, ao abrigo da Lei 19/17, de 25 de Agosto, não tinham trazido na- da de novo, agravado com o fac- to de não ter havido uma celebração de acordo entre os arguidos e o Ministério Público ainda na instrução preparatória.
Com efeito, o magistrado judicial sustenta-se no facto de a co- laboração dos arguidos não ter sido efectiva, eficaz ou determinante – conforme estabelece o diploma a que aludiu acima – razão por que negou o pedido, uma vez que não avançou nada para a descoberta da verdade material.
Pedagogia judicial
Logo a seguir à leitura do douto acórdão, o juiz-presidente da causa dirigiu-se a Adelino Bacia e disse-lhe que vários elementos tinham concorrido para a sua absolvição, sendo que um deles era relativo à falta de provas suficientes para o manter preso.
Já a Pedro Cunha, sobre quem recaía a acusação do crime de falsificação, naquele ar pedagógico, o Juiz de Direito espera que ele tenha aprendido a lição, reforçando que o legislador sabe o porquê de ter previsto alguns formalismos. «É preciso ganhar lição, vai para casa. Cumpra os formalismos», aconselhou.
Após esse momento, o juiz-presidente da causa, Cipriano Catito Tchivinda, perguntou às partes envolvidas, designadamente Ministério Público e defesa, se tinham alguma coisa por acrescentar. O procurador Avelino Sandala Capessa assegurou que o Ministério Público iria reflectir e, caso houvesse necessidade, se pronunciaria.
Por sua vez, a defesa dos seis arguidos, David Mendes, manifestou-se inconformada com o douto acórdão, tendo, em virtu- de disso, garantido que vai interpor recurso com efeito suspensivo, com as alegações a serem apresentadas no prazo determinado pelo juiz, o de 20 dias. David Mendes requereu, igualmente, a cópia do acórdão.
O juiz-presidente da causa, Cipriano Catito Tchivinda, admitiu o recurso interposto, devendo subir imediatamente os próprios autos com efeito suspensivo quanto aos arguidos condenados, nos termos dos artigos 460, 463, número 1, alínea b), 469, número 1, 470, número 1, alínea a), 471, número 1, alínea a) e 475 todos do Código do Processo Penal.
“Tribunal andou mal” – diz advogado de seis réus
O advogado David Mendes refere que, nas questões prévias, o tribunal não anuiu o pedido de- les, quando o Ministério Público, nas suas alegações, achou que eles estavam certos. O causídico sinaliza, neste particular, que há elementos constantes nos autos que não apareceram na instrução, mas que foram levantados em sessões de julgamento. Mendes desmonta a tese de falta de cooperação, alegada pelo tribunal. “Quem descobriu o grupo foi o Domingos.
Então, cooperou. Se foi quem disse quem eram as pessoas que estavam envolvidas e onde é que estavam parte dos explosivos, cooperou. Não pode o tribunal, no meu ponto de vista, dizer que não houve essa cooperação”, realça.
Em relação ao crime de falsificação, o advogado salienta que não se podia suspender a pena ao funcionário público e, por conseguinte, a quem solicitou é-lhe dada uma pena de prisão de cumprimento obrigatório.
“Se suspendeu a pena de quem exerceu a execução da falsificação, a pessoa que se beneficiou deve mantê-lo na cadeia. Neste caso, tinha que suspender a pena”, considera, ao afirmar que, em determinadas matérias, o tribunal andou muito mal.
David Mendes desvaloriza a decisão da primeira instância e diz haver ainda pela frente uma série de diligências processuais, ao abrigo da interposição de recurso ao Tribunal da Relação. Caso não lhe seja favorável, vai ao Supremo e Constitucional.
POR: Constantino Eduardo, enviado ao Huambo