Apresente página é fruto de cortes de um projecto em carteira desde 2023. A língua, como instrumento de comunicação (socialização), identificação e de imaginação (pensamento), não é a mesma para todos os falantes, em todos os espaços, em todo tempo e em toda circunstância comunicativa.
É que Castro (2001) aflorou – uma das mais velhas ilusões do homem é a de que uma língua deve ser exactamente igual para todos os que a falam. A língua, como parte de uma sociedade, é heterogénea, aliás, Mateus e Cardeira (2007, p. 14) salientam que se a sociedade é heterogénea, uma língua homogénea seria disfuncional. “A mente humana é naturalmente inquiridora: quer conhecer as razões das coisas”, como observou Mondin (1982, p. 09).
Na tentativa de o homem encontrar resposta de tudo, as primeiras tentativas recorreram à mitologia; outras justificativas, hoje, consideramolas paralogismo. Por exemplo, durante muito tempo, o mundo viveu com a convicção de Aristóteles sobre número de pernas que a aranha tem, mais tarde Lamarck apresentou um número diferente.
Na língua, também há equívocos ideológicos, alguns preferem chamar mitos e outros, inconsistência, mas devemos respeitar e reconhecer que essas proposições dominaram o mundo durante muito tempo e serviram para muitas outras conclusões.
A outra informação importante é reconhecer que as ciências não são acabadas, à semelhança da plasticidade cerebral, ou seja, se não conhecemos o limite da mente humana, igualmente, não pode haver acabamento de uma ciência.
Angola, enquanto nação, convive com a língua portuguesa há 50 anos, um tempo não muito longo. Os formados em Linguística ou áreas afins procuram responder a algumas situações linguísticas angolanas.
Muitos estudos sobre a variedade do português identificam três variedades do português: europeia, brasileira e africana. Inclusive, muitos professores de Português até hoje ensinam assim.
A verdade é que não concordamos existirem apenas três variedades do português. Um moçambicano não apresenta os mesmos traços linguísticos como ou a de um angolano ou um timorense, só para citar. Então, muitos estudiosos angolanos concluíram que há uma variedade do português de Angola, que a torna diferente dentre todas as outras variedades.
O PA (Português de Angola) tem sido objecto de muitas pesquisas entre angolanos e não só, mas a institucionalização de uma norma não depende (só) de estudo e, como Mateus e Cardeira, afirmam depender de factores que não são linguísticos.
A justificativa de que a próclise é uma marca do PA, identificada como interferência das línguas bantu, é a justificativa do presente texto (próclise, arcaísmo funcional).
Quase toda realização linguística que difere do PE é atrelada às línguas africanas, às interferências linguísticas bantu. Alguns estudiosos concluíram que o PA é característico proclítico, como se vê abaixo: “A tendência de colocação do pronome é proclítica […] Miguel (2014, p. 67); “[…] as frases […] configuram-se desviantes à norma-padrão pelo facto de serem declarativas afirmativas e nas mesmas ocorrerem a próclise, mesmo sem proclisador.” Adriano (2015, p. 140) Porém, no período arcaico do português, por exemplo, já eram usuais tais marcas.
Silva e Osório (2008: 72) buscam Martins (2002: 271) para dizer que: nas orações principais afirmativas (sem o verbo em posição inicial e não introduzidas por constituintes proclisadores), podemos constatar o seguinte: adjacência obrigatória e variação entre ênclise e próclise, com maior frequência da ênclise. Cardeira (1999) caracteriza o português médio como proclisador.
“A opção pela ênclise, largamente dominante durante o século XIII, vai sendo progressivamente substituída pela opção pela próclise[…]” Quanto à posição dos clíticos (maioritariamente proclítica, sem proclisadores) na Carta de Pêro Vaz de Caminha (1450 -1500), apresentamos três exemplos extraídos na obra: “Entre as 8 e 9 horas, nos* achamos entre as Canárias.”; “Na noite seguinte à segunda feira amanheceu, se* perdeu da frota.”; “Nicolau Coelho lhes* fez sinal que pousassem.
Silva e Osório (2008, p. 11) já deixaram claro que “um estudo linguístico deve partir sempre de uma perspectiva interna e não externa”, portanto, partindo da perspectiva interna, podemos concluir que o uso da próclise sem proclisador não é fruto das influências das línguas bantu. O uso da próclise sem proclisador é um arcaísmo funcional.
Por: ADILSON FERNANDO JOÃO