Conhecia pouco sobre o escritor António Cardoso, até que tive o privilégio de fazer um trabalho sobre a sua vida e obra para um programa de rádio simulado quase no final da década de 90 pela malograda professora Gabriela Antunes. Até então, eram poucas as referências que possuíamos em relação à cultura nacional.
As referências que possuíamos na época eram mais sobre músicos, alguns nacionais, assim como actores, devido às telestórias que passavam por nós, amiúde, através da Televisão Pública de Angola, com alguns nomes sonantes, na época em que muitos directores angolanos davam o ar da sua graça. Pouco ou quase nada percebíamos de pintura e outras artes que nos pareciam mais exigentes.
Afinal, olhar para um quadro, perceber como tinha sido pintado, interpretar o que lá estava era quase que uma miragem para muitos jovens, sobretudo aqueles saídos do outro lado do asfalto, em que, à luz de candeeiros, cozinhávamos os nossos sonhos.
Alguns alcançados e outros não. Foi com as aulas de Artes e Literatura Angolana (ALA), ministradas pela exigente professora, que fomos bebendo um pouco de quase tudo.
Aprendemos mais sobre pintura, tecelagem, música e outras artes, assim como os respectivos expoentes máximos de cada área, embora hoje, passados vários anos, não nos sintamos nem pouco em condições de nos assumirmos como conhecedores do que se vai produzindo e esgrimir argumentos vários sobre as especialidades, suas necessidades e projectos para o futuro.
Foi percorrendo os centros culturais, participando em tertúlias várias, em Luanda e noutras cidades em que fomos já depois de vários anos, lendo quase tudo, assim como assistir a lançamentos, simpósios e espectáculos de dança e música, que fomos percebendo que a cultura era muito mais vasta do que imaginávamos.
Está acima de muito do que parecemos inicialmente perceber, mas até aos dias de hoje ainda falta concluir o referido capítulo. Por isso, quem quer que venha a dirigir um departamento de cultura deve, no mínimo, ter noção do que se lhe pede para amanhã não cair no ridículo, o que não se deseja a alguém, por mais popularidade que se tenha.
Contrariamente ao que se vai assistindo no interior do país. Incluindo em muitos municípios recém-criados no âmbito da Nova Divisão Político-Administrativa.
Em Luanda, vimos emergir a nomeação de cantores, principalmente do estilo Kuduro, para as funções de directores municipais da cultura e turismo de muitos municípios. Nunca tive nada contra kuduristas. Aliás, poucos são os que resistem ao estilo.
Embora não seja um dançarino de proa, não resisto às batidas de Bruno M, Rei Panda, o mítico Nagrelha, com os seus Lambas, Noite e Dia e tantos outros, principalmente os da velha guarda, se podemos considerar. Por isso, não tenho nada contra o kuduro bem feito, nem contra os kuduristas.
O que se espera de muitos dos nomeados é que procurem fazer a diferença, aproveitando a oportunidade para afastar a má imagem que em muitos círculos se tem dos fazedores deste estilo. É importante que se compreenda que a cultura é muito mais vasta do que as batidas e rimas.
Está presente através da literatura, cinema, música, pintura, dança e muito mais. Por isso, perceber isso será essencial para se atingir, provavelmente, os objectivos que podem ter ditado a escolha para os cargos que agora exercem, salvo se sejam outras as razões que ditaram a escolha.