Nos últimos anos, a voz dos antigos jogadores do futebol nacional tem ecoado, cada vez mais, por melhores condições sociais. Muitos desses ex-atletas não conseguiram tirar proveito dos ganhos do passado, visto que, na época, o desporto-rei não era encarado com elevado sentido de responsabilidade.
Nesses antanhos, jogava-se mais por amor à camisola e por um sentido de nação, porque o sistema político, de partido único, depois da Independência, a 11 de Novembro, assim o permitia. Os atletas recebiam baixos salários, os contratos eram quase que inexistentes, além de não haver um sistema que assegurasse alguns direitos como, por exempo, a Segurança Social.
Em virtude disso, os amantes desta modalidade nas demais regiões do país entendem que todos aqueles que alguma vez elevaram o nome do país deveriam receber o apoio do governo como forma de reconhecimento. No entanto, antigos praticantes sugerem uma missão quase impossível para o Executivo, a fim de merecerem uma atenção “especial” no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS).
Aliás, muitos elevaram dentro e fora do continente o nome de Angola nas competições internacionais em várias modalidades. Nesta carruagem de problemas sociais, um deles é Sarmento “Apesar dos apoios da sociedade, ainda continuo insatisfeito” Nascido em 1958, na província do Uíge, Sarmento Seke, uma das figuras incontornáveis do futebol nacional, continua a enfrentar dificuldades e clama por mais apoio da sociedade para ter uma vida tranquila Kiameso Pedro Seke, que começou a jogar futebol no Zaire, hoje Congo Democrático, onde se refugiou com os seus pais, por conta da guerra em Angola.
Sarmento Seke, um dos mais talentosos do seu tempo, com Maluka, Zandu, Fussu, Vicy e outros, teve passagem pelo BCC de Kinshasa, nos idos anos de 1974, mas é nos 80 que regressa para Angola no 1.º de Maio de Benguela por conta de Pascoal Luvualo, então secretário-geral da UNTA. Com uma qualidade acima da média, especialmente no último passe, Sarmento Seke foi campeão com as cores do 1.º de Maio, duas vezes em 1984 e 1985.
Pela forma como jogava, conquistou o coração dos adeptos dentro e fora de Angola, sempre que vestisse a camisola da Selecção Nacional. Durante onze épocas, isto é, de 1981 a 1992, Sarmento Seke, aos 66 anos, após o clamor por ajuda, recebeu apoio de diversas partes da sociedade angolana.
O jornal OPAÍS apurou que a Fundação Brilhante, afecta à ENDIAMA, foi uma das que se comoveu e se mobilizou para apoiar o ex-jogador, arcando com a renda da sua casa por doze meses. Além da Fundação Brilhante, o Projecto Viva também disponibilizou valores ao antigo “génio” da bola, assim como contribuições do General Francisco Furtado, ex-presidente do 1.º de Agosto.
Sarmento Seke assegurou ao OPAÍS que obteve igualmente apoios de amigos e conhecidos que residem em solo angolano e no estrangeiro. Apesar de todo o apoio recebido, Sarmento Seke fez questão de alertar que ainda não se sente inteiramente satisfeito. Sarmento lamentou, concluindo que os apoios minimizaram apenas as dificuldades que tem enfrentado, afirmando que a sociedade deveria ter feito mais e melhor por aquilo que fez em prol do país.
“Muita coisa mudou na minha vida. Já não tenho vergonha em convidar alguém para a minha casa. Agora consigo respirar ar puro, mas não estou ainda satisfeito. Mereço o devido reconhecimento. A sociedade deve fazer mais por mim”, disse Sarmento Seke.
“Ficarei tranquilo quando tiver uma casa própria”
O antigo atleta dos Palancas Negras, Sarmento Seke, manifestou a sua satisfação pelo apoio que recebeu da sociedade após o grito de socorro. No entanto, fez questão de destacar que o seu verdadeiro sonho é ter uma casa própria para garantir estabilidade e tranquilidade para a sua família.
“Fui apoiado pela sociedade, mas não queria apenas o pagamento da renda da casa. O que eu quero mesmo é ter a minha casa. Não quero morrer sem antes os meus filhos terem uma casa própria”, começou por dizer.
O ex- atleta não deixou passar em branco as suas preocupações sobre como vai sustentar a sua família quando o período de pagamento da renda terminar. “Como ficarei quando os meses da renda terminarem? Voltarei a clamar por ajuda?”, questionou. Além da casa própria, Sarmento Seke fez questão de assinalar que deseja ter um meio de transporte e uma fonte de rendimento para arcar com as despesas da casa, assim como as mensalidades escolares dos filhos.
Desta feita, o antigo praticante sugeriu ao governo que o apoiasse com a entrega de condomínio e pagamento de um subsídio mensal. “Por aquilo que fiz pelo país, deveria receber um subsídio mensalmente.
Como vou pagar a propina dos filhos? A família precisa de comer, de onde vou tirar o dinheiro uma vez que não tenho um emprego?”, voltou a questionar.O responsável considerou injusto que aqueles que dedicaram e arriscaram as suas vidas em prol do futebol nacional e representaram a nação fiquem à mercê de condições financeiras adversas depois de pen- durarem as chuteiras.
Sarmento Seke lembrou que, durante a sua carreira, recebia apenas cem dólares por mês, um valor insuficiente para garantir uma vida digna após o fim da carreira desportiva. “No meu tempo, jogávamos por amor à camisola. Ganhavámos cem dólares e com esse valor não dava para fazer poupanças. Servia apenas para coisas básicas”, lamentou.
‘‘A nossa federação não valoriza os antigos praticantes”
O ex-atleta Sarmento Seke fez declarações contundentes sobre a aparente indiferença da Federação Angolana de Futebol (FAF) em relação aos atletas que dedicaram as suas vi- das em prol do país. Sarmento Seke lamentou a falta de atenção e reconhecimento por parte da entidade reitora do desporto-rei.
“Acredito que o silêncio da federação indica que nunca estiveram preocupados com aqueles que fizeram pelo país”, afirmou. O antigo praticante criticou ainda a situação em que aqueles que não contribuíram para o desenvolvimento do futebol angolano pare- cem receber mais apoio e reconhecimento. “Há aqui uma coisa que não entendo.
Os que nunca fizeram nada pelo país é que têm merecido apoio. Isso é incompreensível e lamentável”, disse. Enfatizou a importância de valorizar os esforços dos jogadores que dedicaram anos de suas vidas à modalidade. “É importante valorizar quem alguma vez fez pela nação. Então, como fica o nosso legado? Fizemos tanto sacrifício para nada?”, questionou
“Sinto que fui enganado por algumas pessoas”
Sarmento Seke revelou que se sente enganado por empresários que prometeram ajudá-lo financeiramente após ter vindo a público clamar por melhores condições de vida. Disse que muitos empresários o convenceram a enviar suas coordenadas bancárias com a promessa de que receberia os valores devidos.
Referiu que sempre acreditou na honestidade e na integridade do mundo do futebol, sendo que essa experiência o deixou «bastante decepcionado». “Sinto que fui enganado por muitos empresários. Muitos me prometeram apoio, mas até agora não vi nenhum sinal”, revelou. Apesar da situação difícil em que se encontra, Sarmento Seke acredita em dias melhores.
“Acredito que ainda existam boas pessoas no nosso país. Temos vários políticos que me viram jogar. Não vou pressionálos. Também têm as suas prioridades”, salientou.
Sarmento com medo de perder a esposa por falta de emprego
A antiga estrela da selecção angolana expressou medo de ser abandonado pela esposa devido à falta de um emprego. Sarmento Seke acredita que essa dinâmica pode colocar em causa a relação com a sua esposa e a estrutura familiar. Para o ex-internacional angolano, o trabalho não significa apenas uma questão de renda, mas também de dignidade e respeito mútuo.
Sublinhou não ter dúvidas de que, quando um homem não consegue sustentar a casa, a mulher pode tomar decisões que o deixa- riam profundamente triste e posteriormente à beira de um acidente vascular.
“Quando é a mulher a sustentar a casa, o marido perde o respeito. Depois acontecem situações como trombose. Tenho medo disso”, revelou. Apesar dos seus 66 anos de ida- de, Sarmento Seke ressaltou que ainda possui forças e vontade para trabalhar. Sarmento fez um apelo por oportunidades de emprego, acreditando que ainda pode contribuir activamente para sua família e para o desenvolvimento do país.
Entretanto, a preocupação de Seke vai além da sua situação pessoal, temendo pelo futuro de seus filhos. O ex-atleta acredita que crianças sem formação adequada estão mais propensas a seguir caminhos não dignos.
“Filhos sem formação têm poucas opções e eu não quero que os meus caiam em maus caminhos. Tenho muito medo. Quero que, no futuro, as pessoas tenham orgulho dos meus filhos”, ressaltou.
POR:Kiameso Pedro