A revelação foi feita pelo advogado Francisco Muteka, por entender que, com base no Código Penal, os candidatos incorrem no crime de falsificação de documento público, punível nos termos da alinha a), do n.° 2 do art. 251, ao apresentarem documentos que presumivelmente não condizem com o seu real cadastro criminal.
Para o efeito, no seu ponto de vista, o Ministério Público deve abrir um inquérito de modo a se aferir responsabilidades, tendo em conta que a falsificação de documento é um crime contra a fé pública e, portanto, crime público. À semelhança do que acontece com os crimes cometidos no exercício de funções públicas.
“Para estes casos, o Ministério Público (PGR) é o legítimo pro- motor do competente procedimento criminal. Para tal, basta a PGR ter notícia ou qualquer conhecimento de que haja um possível crime, seja lá de onde venha a notícia”, frisou.
Francisco Muteka sublinha que o facto de a revelação ter sido feita publicamente pelo próprio SME, por intermédio do intendente de migração, Cláudio Fernandes, é mais motivo para investigar.
“Já que a notícia está sendo passada pelo órgão que tutela, o facto em voga tem respaldo, conforme estabelece o artigo 49 do Código de Processo Penal”, frisou.
Por outro lado, afirmou que, caso se venha a confirmar que tais registos tenham sido obtidos de forma fraudulenta através de alguma dependência do Serviço de Identificação e Registo Criminal, órgão afecto ao Mile constantes são falsos, nos termos do art 252 n.° 1 al.c) conjugado com o n.° 2 do mesmo artigo”, detalhou, sublinhando que, ao se comprovar em tribunal que eventualmente tenham aceite suborno, incorreram nos crimes de recebimento indevido de vantagem e no crime de corrupção passiva de funcionário.
Em relação aos candidatos maiores de 45 anos de idade admitidos ao referido curso, Francisco Muteka explicou que não cometeram crime algum, pois o Código Penal é omisso quanto à criminalização de indivíduos que frequentem certo curso ou que passem em concursos sem requisitos. Para este caso, basta que se não dê eficácia e validade jurídica. “Quer dizer que, para estes indivíduos, é como se a lei desconhecesse o seu caso.
O acto simplesmente é nulo, nos termos gerais do artigo 220 Código Civil, conjugado com os artigos 219 e 286, todos do mesmo diploma legal. Sem descurar das normas e regulamentos que regem o respectivo recrutamento”, explicou
Admissão de candidatos de 45 anos pode resultar em processos
No entanto, o advogado esclareceu que o mesmo não se pode dizer em relação aos funcionários do SME que permitiram a admissão dos candidatos com 45 anos. O Código Penal, no artigo 251, n.° 3, dispõe que o funcionário público que intercalar acto (…) sem cumprir as formalidades legais, também incorre no crime de falsificação de documento.
“Aos técnicos do SME que validaram a candidatura dos indivíduos com 45 anos, tendo em atenção que não obedeceram às formalidades, o crime é igualmente de falsificação de documento”, frisou. De modo a dissipar eventuais dúvidas, Francisco Muteka explicou que o facto de validarem as suas candidaturas, por si só não indica que terão cometido algum crime.
“Simplesmente podemos sofismar para aqueles que tiveram a sorte de cair na graça da falta de atenção do funcionário que recebeu os seus documentos. Mas, se pelo facto de terem idade avançada, subornaram o funcionário ou falsificaram o BI (o que na linguagem comum diz-se catanar) para parecerem mais novos, aí sim estariam a incorrer em algum crime”, detalhou.
Acrescentou de seguida que aos que apresentaram certifica- dos falsos o crime é de falsificação de documento, cuja moldura penal é de até 2 anos ou multa até 240 dias. De salientar que, após a suspensão temporária do curso básico de Migração para o ingresso no SME, os candidatos estão a ser reavaliados e, dentre as várias irregularidades, foram registados os mais de 300 instruendos com cadastro criminal e dezenas de candidatos com idade superior a 45 anos.
Este curso do SME, cancelado no dia 25 de Novembro, após a publicação de um despacho do director-geral, por terem sido verificadas irregularidades graves durante o processo de selecção dos candidatos, conta com mais de cinco mil candidatos. As autoridades realizaram um processo de recadastramento dos instruendos do 2.º Curso Básico de Migração, do dia 30 de Novembro até 10 de Dezembro, e, actualmente, os candidatos todos estão a ser submetidos novamente a exames médicos.
A direcção do SME esclareceu que alguns dos instruendos se puseram em fuga ou não apareceram, um total de 85 candidatos, bem como estão a ser submetidos a novos testes psicotécnicos, entre outros, onde foi aferido que pelo menos 450 instruendos têm dificuldades de leitura e escrita.