A Somaïr, Société des Mines de l’Aïr, é detida em 63,4% pela Orano e em 36,6% pelo Estado do Níger. A junta militar, que chegou ao poder naquele país através de um golpe de Estado, em Julho de 2023, fez da soberania a sua prioridade, nomeadamente no que se refere à questão do urânio.
Em Junho, começou por retirar à Orano a licença de exploração do mega depósito de Imouraren e das suas reservas estimadas em 200 mil toneladas. Na sequência disto, a empresa francesa anunciou, em Outubro, que, face à situação “gravemente deteriorada”, a sua filial ia suspender a produção a partir de 31 de Outubro, por não poder “continuar a trabalhar” no país.
“Há vários meses que a Orano vem alertando para as ingerências que o grupo sofre na governação da Somaïr, da qual é acionista maioritário e operador no Níger”, afirmou o grupo francês num comunicado emitido ontem.
“As decisões tomadas pelo conselho de administração da empresa deixaram de ser aplicadas e a Orano constata agora que as autoridades nigerinas assumiram o seu controlo operacional”, acrescenta. Em 12 de Novembro, o Conselho de Administração da Somaïr aprovou a suspensão das despesas relativas à atividade mineira.
No entanto, alguns dias mais tarde, uma delegação de conselheiros do regime visitou as minas de Somaïr, no norte do Níger, para felicitar e encorajar os trabalhadores da empresa a prosseguirem a atividade.
Ontem, o grupo francês acrescentou que “os custos de produção que se mantêm no local estão a deteriorar cada vez mais a situação financeira da empresa”. “Neste contexto, a aplicação da resolução adotada pelo Conselho de Administração da Somaïr, em 12 de Novembro, de suspender as despesas ligadas às atividades de produção, a fim de dar prioridade ao pagamento dos salários e preservar a integridade da unidade industrial, está a ser deliberadamente impedida”, prossegue Orano.
A empresa afirma que “os representantes do Níger aceitam esta posição, que defenderam na reunião ordinária do Conselho de Administração realizada na terçafeira, 03 de Dezembro de 2024, confirmando, em particular, a sua recusa em exportar a produção”.
Um total de 1.150 toneladas de concentrado de urânio das reservas de 2023 e 2024 – quase metade da produção média anual do local – estão atualmente bloqueadas, com um valor de mercado estimado em “200 milhões de euros”, segundo o grupo, cujo capital é detido em 90% pelo Estado francês.
Este episódio ilustra as tensões entre o Níger e a antiga potência colonial francesa, à qual a junta militar virou as costas desde que chegou ao poder. No entanto, o urânio pode interessar a outros países: em Novembro, o ministro das Minas do Níger, Ousmane Abarchi, convidou empresas russas a explorarem os recursos naturais do país.
Ontem, a Orano lamentou o desenvolvimento da situação, “que está a pesar sobre os funcionários e as comunidades locais”. A empresa declarou que “tenciona defender os seus direitos junto das autoridades competentes e reafirma a sua convicção de que só uma vontade partilhada por todas as partes interessadas em restabelecer um modo de funcionamento estável e sustentável permitirá retomar as actividades com serenidade”.
O Níger fornece 4,7% da produção mundial de urânio natural, muito atrás do Cazaquistão (45,2%), segundo os dados de 2021 da Agência de Aprovisionamento da Euratom (ESA).