Especialista em segurança marítima considera que o Centro Nacional de Coordenação e Vigilância marítima, inaugurado recentemente pelo titular do Poder executivo, visa dar resposta aos desafios de segurança marítima que o mar de angola enfrenta, em coordenação com outros sectores que intervêm no mar
O Centro Nacional de Coordenação e Vigilância Marítima, cuja primeira fase foi inaugurada recentemente pelo Presidente da República, João Lourenço, insere-se na estratégia do Executivo angolano de dotar a Marinha de Guerra Angolana (MGA) de meios modernos, para melhor responder aos desafios do sector, incluindo na protecção da Zona Económica Marítima Exclusiva do país, de cerca de 200 milhas náuticas.
Para a especialista em segurança marítima Suraia da Conceição Munguengue, numa perspectiva interna, o centro visa dar resposta aos desafios de segurança marítima, suprindo as vulnerabilidades e ameaças que as águas territoriais angolanas enfrentam.
Segundo a especialista, o centro vai operar em coordenação com outros sectores que realizam actividades no mar, mas não só, estendendo a sua interconectividade com o Ministério das Relações Exteriores e outros.
Mas o braço directo dessa linha operativa, segundo Suraia Munguengue, deverá ser a componente naval da Marinha de Guerra Angolana (MGA), para dar resposta a estes desafios de segurança marítima, que são essencialmente a pesca ilegal, a pirataria marítima, a poluição do mar, a delapidação dos recursos marítimos, quer da fauna como da flora, e outros.
Salientou que, numa perspectiva mais externa, o centro visa garantir o cumprimento das deliberações saídas da Cimeira de Yaoundé, nos Camarões, em 2013, que versam sobre segurança marítima na região do Golfo da Gui- né (Atlântico Sul), da qual o país faz parte. O encontro, acrescentou, deu origem ao conhecido Código de Yaoundé, que prevê a criação de centros regionais nos países membros para a partilha de in- formações. “Portanto, a necessidade de criação de um centro de coordenação e vigilância marítima surge de uma iniciativa do Estado angolano, anterior ao período de consignação desta infra-estrutura”, disse, acrescentando que esta é uma recomendação expressa na estratégia marítima da União Africana (UA) 2050.
Preocupação com a segurança marítima
Suraia Munguengue lembra ainda que o país tem uma estratégia marítima própria, a denominada “Estratégia Nacional para o Mar de Angola (ENMA) 2030”. O documento, aprovado pelo Decreto Presidencial n.º 183/22, de 22 Julho, tem como principais objectivos fomentar e diversificar a economia marítima, assim como optimizar os meios e adoptar mecanismos de segurança e vigilân- cia nos mares do país. A especialista fez ainda saber que as principais linhas de acção contidas nas metas da ENMA 2030 têm a ver com um olhar profundo sobre a qualificação profissional no mar, a promoção do conhecimento científico e o desenvolvimento tecnológico dos oceanos, cujas acções estão já em implementação.
“Estamos com isso a dizer que o desenvolvimento desta estratégia demonstra a preocupação que o Estado angolano tem com a segurança marítima, porque o mar é extremamente importante para o país, em vários sectores — sobretudo no que concerne à arrecadação de receitas —, uma vez que o recurso que mais contribui para o OGE, o petróleo, é maioritariamente explorado no mar”, lembrou.
Promoção do emprego
Suraia da Conceição Munguengue adiantou ainda que, no quadro da ENMA-2030, a visão do Estado angolano com o desenvolvimento desta estratégia passa pela promoção e aumento do bem-estar social, do emprego, potenciar a economia azul no quadro do desenvolvimento sustentável, apoiar o desenvolvimento científico e a afirmação de Angola como uma referência marítima no quadro geoestratégico, sobretudo no Golfo da Guiné. Destacou que o valor da estratégia passa, essencialmente, pela partilha de informações e comunicações, colaborar e cooperar com outros órgãos no sentido de se reforçar a capacidade de co- ordenação e envolve um conjunto de sectores.
Lembrou que a ENMA-2030 tem sete eixos fundamentais, “nomeadamente, a diversificação da economia marítima, aumento do emprego e a qualificação profissional em actividades voltadas ao mar, optimizar os meios e os instrumentos e mecanismos de segurança e vigilância marítima, promover o conhecimento científico e o desenvolvimento tecnológico e a cultura dos oceanos, promover e garantir o bom estado ambiental do meio marinho e a gestão sustentável dos recursos biológicos, optimizar o modelo de governança dos espaços marítimos em coordenação intersectorial e reforçar o papel de Angola no contexto internacional e regional voltadas para as políticas marítimas”. Referiu que, olhando para as metas da Estratégia Nacional para o Mar de Angola, o Centro Nacional de Coordenação e Vigilância Marítima tem, seguramente, estas duas perspectivas, que se afiguram importantes, quer do ponto de vista interno como externo, para a afirmação de Angola nas questões marítimas.
Mais engajamento
Suraia Munguengue entende que Angola deve envolver-se mais nas questões que têm a ver com a segurança marítima, uma vez que, ao longo do Atlântico Sul, o país possui a sexta maior Zona Económica Exclusiva e conta com uma extensa costa marítima. Por este motivo, a especialista em segurança marítima apela ao Estado a prestar cada vez mais atenção às questões marítimas. Todavia, considera que, com a entrada em serviço do centro ora inaugurado, aliada à modernização e a restruturação da Base Naval do Soyo, aos poucos o país vai olhando o país com “olhos de ver”. Outrossim, afirmou que Angola precisa, também, de desenvolver uma cultura do mar, acrescentando que o país faz parte das regiões geopolíticas e geoestratégicas dependentes do comércio marítimo, já que grande parte do comércio internacional acontece no espaço marítimo.
Riscos e ameaças
No tocante aos principais riscos e ameaças à segurança marítima, avançou que contrariamente ao senso comum, que olha mais para a pirataria marítima e pesca ilegal, hoje por hoje há uma onda crescente de crime organizado transnacional que ocorre no mar e o tráfico de drogas no mar. Outros riscos, segundo a especialista, está ainda na degradação das infra-estruturas portuárias, já que, dos sete portos existentes no país, três são altamente estratégicos, como são os casos do Porto do Lobito, que faz ligação com o Corredor do Lobito, o Porto de Luanda e o Porto do Namibe. Segundo Suraia Munguengue são infra-estruturas portuárias estratégicas, mas que vão tendo alguma degradação, o que coloca em causa a segurança marítima.
Marinha de Guerra ainda carece de investimento
Para uma garantia de segurança das fronteiras marítimas mais eficaz, há que se fazer uma aposta séria na Marinha de Guerra Angolana (MGA), que passa por mais investimentos neste braço do exército nacional. Deste ponto de vista, Suraia Munguengue entende que a marinha de Guerra angolana é ainda o “parceiro mais empobrecido” dos três ramos das Faa, argumentando que, durante a guerra civil, entre 1975 e 2002, o teatro de operações foi o espaço terrestre e aéreo, tendo havido, por isso, mais investimentos na Força aérea Nacional (FAN) e no exército.
No entanto, continua, nos últimos anos o executivo angolano tem prestado alguma atenção à MGA. Suraia Munguengue reconhece, por outro lado, que equipar uma Marinha de Guerra não é tarefa fácil, não está ao alcance de qualquer nação ter uma marinha costeira e regional, um desejo há muito alimentado pelo estado angolano. Para a especialista, a construção do Centro Nacional de Coordenação e Vigilância marítima é um passo rumo à modernização deste braço das FAA, e da garantia dos principais objectivos de Angola no que à segurança marítima diz respeito.
Novos meios para MGA
Recentemente, durante o acto inaugural do Centro Nacional de Segurança Marítima de Luanda, o Presidente da República, João Lourenço garantiu que o seu pelouro vai prestar uma atenção particular à modernização, sobretudo do também ramo das Forças Armadas, concretamente a Marinha de Guerra, na qual, nos últimos anos, têm vindo a ser feitos investimentos importantes, não só em infra-estruturas de terra, como na aquisição de embarcações modernas. O comandante-em-chefe garantiu que esse esforço vai continuar. “Começou com a renovação da Base Naval do Soyo, hoje a inauguração deste Centro Nacional de Coordenação e Vigilância Marítima.
A Base Naval de Luanda também está sendo reabilitada e temos em carteira, com a previsão do início de obras para muito em breve, data muito próxima, a construção daquela que passará a ser a maior base naval do nosso país”, apontou. João Lourenço disse que a modernização das nossas Forças Armadas, no geral, mas em particular da Marinha de Guerra, é um facto. E dia após dia, as coisas começam a ficar mais visíveis. Ainda para a Marinha, anunciou que o país vai receber, nos próximos meses, três aviões de reconhecimento e vigilância marítima da Airbus Espanhola. “Vamos receber um primeiro em breve, depois os outros dois, acredito até ao final do corrente ano. É um sistema integrado que comporta infra-estruturas modernas, embarcações do mar e aviões de reconhecimento marítimo”, anunciou.