As relações entre Angola e os Estados Unidos da América (EUA) no quadro da Guerra Fria caracterizavam-se como difíceis e afastadas, devido à ideologia assumida na altura pelo Movimento de Libertação Popular de Angola (MPLA), que proclamou a independência nacional na capital e teve o reconhecimento da maioria dos Estados da comunidade internacional.
É de domínio público que, no quadro da Guerra Fria, os EUA apoiavam a UNITA, por via da África do Sul, e a ex-URSS apoiava o MPLA, e neste período as duas grandes potências lutavam para travar o avanço das ideologias do adversário em qualquer espaço geopolítico. Como aliado da então URSS e de Cuba, o Governo angolano viu coarctadas todas as hipóteses de aproximação aos EUA, tendo mesmo sofrido, ao longo desses convulsivos anos, embargos financeiros e comerciais, ao mesmo tempo que era catalogado pelas sucessivas administrações norte-americanas de país “marxista-leninista”.
Por isso, Angola foi incluída numa “lista negra” de países indesejáveis, sem reconhecimento formal dos EUA e objecto de sanções jurídicas, económicas e comerciais, conforme defendido pelo embaixador José Patrício, na sua obra “Angola – EUA, Os Caminhos do Bom Senso” A década de 80, do século XXI, constituiu-se num período mais complexo entre Angola e os EUA, chegava ao poder o Presidente Ronald Reagam, que era favorável a uma intervenção militar dos EUA em Angola e manifestava o apoio aberto dos americanos à UNITA que era cada dia mais visível. É de tanto ser assim que o Dr. Jonas Savimbi foi recebido na Casa Branca pelo presidente Regan. Daí o famoso “slogan” do Governo angolano na época: “Reagan tira as mãos de Angola!”
É impossível abordar o processo de estabelecimento das relações diplomáticas sem citar o embaixador José Patrício, por ter sido ele o embaixador junto da Organização dos Estados Americanos quando Angola foi admitida como membro observador, que permitiu o país ganhar estatuto diplomático em Wanshigton, e também por ser o primeiro embaixador de Angola acreditado nos Estados Unidos da América. A abordagem da normalização das relações entre os dois Estados remete para um recuo histórico, ainda que telegráfico; desta feita, importa referenciar que os primeiros passos dados nesta direcção foi com a abertura do Escritório de Interesses de Angola em Washington, com estatuto diplomático e com a admissão de Angola como membro observador junto da Organização dos Estados Americanos, em 1991, como referido acima.
Neste mesmo ano, o Presidente George Bush recebe o Presidente Eduardo dos Santos, em Setembro, na sala Oval da Casa Branca. Os EUA não reconheciam o MPLA como o governo legítimo de Angola, muito pelo alinhamento ideológico assumido pelo MPLA, mas os interesses económicos dos EUA funcionavam principalmente pelas empresas de exploração petrolífera americanas (Texaco, Mobil e Exxon) que operavam em território angolano. A normalização das Relações entre Angola e os EUA decorreu em 19 de Maio de 1993, durante a ad- ministração Clinton. Deveu-se em grande medida aos fracassos nas negociações para se encontrar a paz em Angola.
Depois das eleições de 1992, Dr. Jonas Savimbi e a UNITA perderam o apoio internacional, o que facilitou o reconhecimento. Concorreram para o efeito vários factores, como o fim da Guerra Fria, a visão de que a UNITA pretendia chegar ao poder pela via militar, o governo legítimo saído das primeiras eleições e a descoberta de grandes reservas de petróleo em Angola. Isso pesou significativamente para essa mudança de realinhamento da política externa norte-americana para Angola e criou as condições para o início das sanções da ONU à UNITA, conforme o autor deste artigo defendeu na sua obra “As Eleições em Angola de 1992 até aos Nossos Dias”.
A administração Clinton afirmara que “(…) a UNITA recomeçou a guerra mesmo antes do processo eleitoral ter sido concluído e está agora a recusar assinar o Acordo de Paz em discussão em Abidjan (…)” Nessa mesma declaração, o presidente Bill Clinton reconhecia que “(…) O Governo angolano, pelo contrário, aceitou assinar um acordo, foi investido por uma Assembleia Nacional democraticamente eleita e ofereceu a integração da UNITA a todos os níveis do governo (…)”, conforme descrito pelo embaixador Patrício.
Com base neste reconhecimento, o Estado angolano, na gestão do Presidente dos Santos, redefine a sua estratégia junto aos americanos, no sentido de coarctar os apoios que a UNITA recebia dos americanos, com objectivo de reduzir a correlação de força no teatro das operações da UNITA. A chegada ao poder do Presidente João Lourenço e a mudança de paradigma da governação introduzida em Angola — numa demonstração mais clara do alinhamento da política externa angolana assente nos pilares e valores apregoada pelo Ocidente, e com as várias reformas introduzidas como o combate à corrupção, ao nepotismo, à má gestão do erário, adopção de políticas mais inclusivas, defesas dos direitos humanos —, permitiram uma mudança da abordagem das relações entre os dois Estados. Muito antes de João Lourenço se tornar Presidente, ainda na veste de ministro da Defesa foi ao Pentágono e vislumbrou-se novos ventos nas relações entre ambos os Estados.
O primeiro ano de mandato do presidente João Lourenço foi marcado como a afirmação de um novo estadista no cenário internacional e a busca de apoio para os desafios que o país enfrentava. A participação de Angola no Fórum EUA-África, realizada em Washington D.C., de 12 a15 de Dezembro de 2022, foi um ponto importante no que concerne à aproximação de Angola aos EUA e à redefinição de uma nova página das relações entre os Estados.
O encontro de ontem simbolizou um ganho da diplomacia angolana por um lado, e, por outro lado, o reconhecimento das mudanças estruturantes e estruturais introduzidas desde o primeiro mandato do Presidente João Lourenço, desde o combate à corrupção, à melhoria de negócios, entre outros aspectos, bem como se enquadrou no âmbito das comemorações dos 30 anos da normalização das relações entre os dois Estados.
Os EUA é o “Estado Gendar-me” do mundo e compreender até que ponto os americanos têm interesses em investir em Angola pode ser uma boa certificação dos avanços das reformas que o país introduziu nos últimos tempos, e com isso o Estado angolano poderia capitalizar melhor a sua estratégia de atracção do investimento estrangeiro direito face às reformas introduzidas para melhorar o ambiente de negócio.
A par dos elementos acima apresentados, é importante frisar que os EUA também têm interesses económicos, políticos e até de segurança em Angola, porque Angola é um país importante dentro da geografia política africana, com uma participação activa nas organizações regionais, na construção e na promoção da paz em África e em matérias de Prevenção, Gestão e Resolução de Conflitos, elementos que catapultaram a imagem do país no Sistema Internacional.
POR: OSVALDO MBOCO