Do Luena ao Luau, a 12.80 da fronteira com a República Democrática do Congo, “respira-se” comércio, destacando-se a venda de produtos feitos nas terras férteis e extensa da província do Moxico e não só. Essa prática alimenta várias famílias angolanas e, naqueles dias em que o CFB anuncia paralisação dos comboios para manutenção, quer das locomotivas, quer da linha, vive-se como que momentos de “sufoco”
E a viagem deste jornal ao Corredor Logístico do Lobito, um dos mais importantes da África Austral, na óptica de alguns especialistas, prosseguiu, desta vez, para percorrer os restantes pouco mais de 200 quilómetros, depois dos mil já percorridos, perfazendo, assim, um total de mais de 1200 KM de linha férrea.
Diferente da rota Lobito/Luena, na de Luena/Luau ‘respira-se’ comércio.Ao longo do percurso, há à disposição de visitantes uma variedade de produtos, maior parte dos quais feitos nas terras férteis de cada localidade da “gigante” província do Moxico, a maior de Angola, em termos de dimensão territorial.
Abacate, limão, alho, mel, ginguba, banana, mandioca, tangerina são, entre outros produtos, vendidos sobre os carris do caminho-de-ferro de Benguela.
Uma actividade que assegura a subsistência a inúmeras famílias ao longo de um corredor comercial que se estende até à vizinha República Democrática do Congo, país que partilha uma extensa fronteira com a Angola a Norte e Leste, com “eco” na Zâmbia e nos de mais países da SADC.
Do Congo, por enquanto, conforme apurou este jornal na fronteira, vêm apenas cobre e manganês, sendo certo que as ambições dos dois países, agora com a concessão de exploração dos serviços ferroviários entregue a um consórcio de três empresas, vai para lá desses produtos.
Mas, da parte angolana, há empresários que encontraram no Congo um bom mercado para o sal, peixe e feijão, estes produzidos na província de Benguela, para além de produtos alimentares de outros centros de produção do país.
Para quem viaje de comboio, nota, claramente, que o comércio não está apenas fora do comboio, estendido nas margens das linhas férreas.
No seu interior há, igualmente, a venda ambulante, cujas personagens são, maioritariamente, crianças com idade escolar, mas as dificuldades das famílias colocam-nas lá.
No município da Cameia, não se vive só da agricultura. Rica em recursos hídricos, os residentes dedicam-se também à pesca fluvial, cujo produto é vendido na estação do comboio e o excedente «exportado» para o município do Luau, na fronteira com a RDC, país que conta com pouco mais de 100 milhões de consumidores.
Estar-seá, diga-se, a faltar investimentos para a produção da cultura do arroz, uma vez reunir condições climatéricas.
A região já dispõe de chanas propícias para o efeito. Uma aposta séria neste domínio retiraria o país do “sufoco” de importação deste produto, invertendo, com efeito, cenário de “descontrolo” do preço no mercado (um saco de 25 kg saiu dos 12 mil KZ para 19.500, embora o preço varie de acordo com as marcas, conforme constatou este jornal).
Pronto, voltemos ao corredor, deixemos de lado este assunto para apreciação do Governo, por via de departamentos ministeriais afins.
Para além do barrulho ensurdecedor, o «puãããã!» do comboio “estremece” bolsos de quem tenha ficado, por exemplo, três meses a produzir cultura como feijão. Com o apito vêm clientes dispostos a abrir os cordões à bolsa e de lá retirar algumas notas de menor ou maior valor facial para a compra de algum produto do campo.
Por aquelas paragens – diga-se – os preços tendem a ser ligeiramente mais baratos, se comparados aos praticados em províncias como Benguela, Cuanza-Sul e Luanda, capital do país.
Não fosse a circulação de comboio, permitindo o escoamento, conforme constatação deste jornal, vários produtos estragar-se-iam nos campos de produção, pois tal é a quantidade produzida.
Esse meio de transporte afigurase na única alternativa de que os produtores dispõem para os fazer chegar a outras paragens do país.
Entretanto, tal cenário descortina problemas de alegada falta de capacidade para fazer face à demanda. De acordo com uma fonte da empresa, o CFB não está a suportar e sustenta que o Estado se limitou a investimentos em locomotivas e não em carruagens e vagões.
A nossa fonte defende uma combinação entre a linha férrea e a estrada para desafogar os comboios. “O caminho de ferro não vai conseguir suportar à demanda de passageiros no corredor Huambo Bié/Luena”, sustenta, para quem, se o concessionário não fizer os investimentos anunciados, sob supervisão americana, confrontarse-á com muitos problemas.
“Estou a vender banana e abacate.
Assim mesmo, o tal ca-dinheiro é para comprar alguma coisa em casa”, explicou-se Luzia, vendedeira a quem o autor destas linhas comprou um dos produtos para ludibriar algum roncar de estômago, embora, por aquelas horas (9h da manhã), ainda fosse controlável.
Luau à vista, RDC a acenar
Até apitar na estação do Luau, uma espécie de fim da picada, a 12.80 quilómetros da fronteira com a RDC, o comboio passa por quatro municípios, nomeadamente Léua, Cameia, Lumeje e Luacano. Chegados ao Luau, este jornal dá de cara com um movimento frenético de comerciantes, ao que se junta, igualmente, a movimentação de comboios.
Quando o comboio proveniente do Luena se fez à estação, um outro cruzava a fronteira e seguia viagem em direcção ao país de origem, RDC, carregando material de construção.
A empresa chinesa SINOTRANS, licenciada pelo transporte de mercadoria do Lobito ao Luau, de mês em mês, transporta 30 toneladas de sódio, além de outros produtos da cesta básica em 14 vagões de que os comboios da RDC que se encarregam de os colocar em seu solo pátrio, revelou ao jornal OPAÍS, na fronteira, Joaquim Santiago, responsável pela manutenção da empresa. Na fronteira, vendem-se vários produtos, ou melhor, de quase tudo.
Géneros alimentícios, electrodomésticos, materiais de higiene, para citar apenas estes. Sandrac Zacarias, vendedor ambulante, salienta que, com o comércio “abençoado” com o movimento de comboios, ele coloca comida à mesa de casa, auxiliando, assim, a sua mãe.
Um cidadão, identificado apenas por João, auxilia compradores e passageiros a carregar e descarregar bens em cada chegada e partida do comboio. Em declarações ao jornal OPAÍS, contou que essa actividade que pratica é rentável, porque “quando chega o comboio do Luena, é festa, vem bwé cheio e com muitos produtos”.
Maria Tchenda, por seu turno, considera intensa o comércio desenvolvido ao longo da fronteira, mas entende que a RDC teria mais produtos para oferecer e espera que o consórcio venha a inverter esse estado de coisas.
O chefe interino da Estação do Luau, Carlos Sérgio, revela que tem havido um movimento frenético de passageiros e os comboios andam sempre apinhados de gente do trajecto Luena/Luau, que, em muitos casos, se torna difícil fazer face à demanda de passageiros.
Ao longo da viagem Lobito/Luena/Luau, saltou-nos à vista o trabalho de levantamento técnico que uma equipa constituída por dois técnicos chineses faziam e o mesmo número de angolanos.
Mandatados pelo Ministério dos Transportes, o trabalho da aludida equipa consubstanciou-se em aferir alguns aspectos técnicos que ainda careçam de uma atenção especial, a fim de que se garanta melhores condições ao consórcio, segundo apurou este jornal.
Por: Constantino Eduardo, enviado ao Luau (Moxico)