Para salvaguardar o interesse do bem público, o Governo legalizou os 60% de todo o património da empresa CIF Angola, que se encontrava sob alça- da da empresa IF – Investimentos Financeiros, ligada ao general Leopoldino do Nascimento “Dino”. Já o general Hélder Vieira Dias “Kopelipa” entra no processo como representante legal da CIF Angola
Veronica Fung, esposa do empresário chinês Sam Pa, que se encontra detido na China há 8 anos, está a mover um processo contra a empresa ligada ao antigo chefe das Comunicações da Presidência da República, junto da Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Luan- da por, alegadamente, ter viola- do a lei ao entregar ao Estado todo a património da CIF em Angola. O ex-ministro de Estado e chefe da Casa Militar, Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, também está arrolado ao processo por ser o signatário de um auto que confirma a entrega de tais bens.
Na lista dos bens em causa estão os edifícios CIF Luanda One e CIF Luanda Two, a centralidade Vi- da Pacífica, constituída por 24 edifícios, três creches, dois clubes náuticos e quatro estaleiros, no Zango 0, e a Centralidade do Kilamba KK 5800, com um total de 271 edifícios e 837 vivendas em diferentes níveis de construção. Além destes imóveis, a família pretende recuperar o “império” industrial de Sam Pa em Angola, do qual fazem parte a fábrica de cimento (CIF Cement), a fábrica de montagem de veículos automóveis (CIF SGS Automóveis), a fábrica de cerveja (CIF Lowenda Cervejas) e a empresa de logística (CIF Logistics Company) que assegurava todas as operações do Grupo CIF Angola, a CIF logística, de acordo com documentos a que OPAÍS teve acesso.
Segundo apurou este jornal, são mais de dez empresas que fazem parte do grupo China International Found (CIF) Angola, cuja primeira empresa foi registada no país em 2008, em nome de Lourdes Maria Caposso Fernandes, como representante da sociedade Plansmart International Lda, uma Offshore Incorporations, e Paula Andréa Custódio e Silva Inglês. Esta cidadã angolana entrou na sociedade como representante da empresa Utter Rigth Internacional Limited, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, num centro de offshore, conforme atesta a escritura pública registada, a 11 de Abril de 2008 no Cartório Notarial do Guiché Único de Empresa e publicada em Diário da República, a 30 de Maio do mesmo ano.
As duas empresas acima mencionadas, pertencentes ao magnata Sam Pa, eram, até 2015, altura em que este foi detido no seu país, as reais proprietárias de todo o património do grupo CIF em Angola, sendo a Plansmart detentora de 95% e a Utter Rigth com 5%. “Em princípio a empresa CIF Hong Kong é que estava para vir fazer este investimento em Angola, por intermédio de uma sucursal que pretendiam criar.
Porém, com o passar do tempo Sam Pa desistiu dessa ideia e optou por constituir essas duas em- presas britânicas, pertencentes às suas duas mulheres, que são as donas da empresa CIF Angola”, afirmou uma fonte ligada ao processo. Salientou ainda que, nesta altura, a CIF começou a trabalhar com o Gabinete de Reconstrução Nacional que, na época, era dirigido pelo ex-ministro de Esta- do e chefe da Casa Militar, Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”
A entrada do general Dino na jogada
No entanto, face à sua detenção por crime de traição ao Partido Comunista Chinês e corrupção, os seus representantes legais e sócios, reunidos em Hong Kong, deram início a um programa de transferência de parte das acções da CIF para uma outra empresa, com vista a salvaguardar os interesses de Sam Pa, caso o governo chinês entrasse na justiça para ficar com tal património.
“Eles aprovaram uma resolução através da qual mandaram passar 60% das acções de todo o património da CIF para a empresa IF – Investimentos Financeiros, S.A, cujo último beneficiário é o general Dino, e os outros 40% ficaram repartidos da seguinte forma: 38% com a Plansmart e 2% com Utter Rigth”, atesta a nossa fonte. Apesar de não ser muito conhecida, a IF – Investimentos Financeiros SGPS, S.A se encontra a operar desde 2011, ano em que foi constituída como sociedade anónima no Cartório Notarial do Guiché Único de Empresas.
Os seus criadores registaram como sede o apartamento nº5, do edifício 108, da rua 50 do bairro Nova Vida, de acordo com o Diário da República nº 110, de 11 de Junho de 2012, a que OPAÍS teve acesso. A nossa fonte atesta que os do- nos de tal empresa, também ar- rolados ao processo movido pelos chineses, passaram uma procuração irrevogável ao general Dino em troca de uma contrapartida financeira. Uma outra fonte próxima ao general Dino afirma que ele só as- sumiu a gestão de todo o património da China Internacional Found (CIF) em Angola, por intermédio dessa empresa veículo, pelo facto de o referido empresário sino-britânico, que também tem nacionalidade angolana, ter sido dado como desaparecido, aquando da sua detenção.
Na época, o general já havia cessado as funções de chefe das Comunicações do Presidente da República, pois trabalhava somente como consultor da Casa de Segurança, e prosperava no mundo empresarial, o que demonstrava ser um bom gestor e a pessoa ideal para cuidar do império do “amigo chinês”. “Portanto, o general Dino foi apenas chamado pelo então Titular do Poder Executivo [José Eduardo dos Santos] para que, dada a sua experiência no mundo empresarial e como já não se encontrava no activo, por ser um mero consultor do então Chefe da Casa de Segurança [do Presidente da República], criasse uma equipa para fazer um inventário dos bens daquela empresa porque o seu dono estava desaparecido, que é o famoso Sam Pa”, garantiu.
Acrescentou de seguida que “a IF [Investimentos Financeiros] só entra na estrutura da empresa CIF como uma empresa veículo. Não estava definido quem seriam os accionistas”. A nossa fonte próxima ao general explicou que, em regra, as empresas veículos são constituídas por escritórios de advogados com nome de alguns cidadãos que posteriormente passam procurações irrevogáveis, até por morte, aos reais detentores das empresas. Esse processo não é gratuito, pois os detentores legais as vendem à empresa em papel, por um preço que pode variar entre 100 ou 200 dólares. Disse que se trata de um mecanismo legal usual no mundo da alta finança.
As pessoas que recorrem a este recurso, geralmente não têm tempo para irem à instituição, como o Guiché Único de Empresa, com o fito de constituir uma empresa, embora estejam a necessitar urgentemente para montar um negócio. “É usual no mundo das altas finanças. Dos grandes projectos que implicam investimentos altíssimos e, por vezes, a empresa- mãe não quer correr o risco de estar na linha da frente para não ser afectada, caso o mesmo fracas- se”, frisou. Por essa razão, segundo esclarece, são criadas as empresas veículos que assumem a titularidade de um determinado projecto e na eventualidade de algum fracasso, caberá a ela responder e a empresa investidora, por seu turno, acaba por ficar protegida.
General Kopelipa: o “salvador” dos chineses
Por ser uma das pessoas com quem Sam Pa mais interagia, na época em que dirigia o Gabinete de Reconstrução Nacional (GRN), o general Kopelipa foi indicado pelo então director da CIF em Angola, identificado apenas por Braile, para representar essa empresa junto das autoridades angolanas, quando se achasse necessário. “Por essa razão, acabou envolvido neste processo e no que está a ser movido pela PGR, mas o general não tem nada a ver com esse caso”, afirmou.
Segundo apurou OPAÍS, no momento em que foram notificados a procederem à entrega dos bens, o general Dino terá procurado deixar claro que a IF – Investimentos Financeiros detinha apenas 60% de todo o património da CIF em Angola. E tendo em conta que o general Kopelipa era o representante legal da CIF em Angola, recebeu os títulos da IF das mãos do general Dino e, por força da lei, entregou à PGR.
“Os chineses da CIF querem pelo menos recuperar os 40% de todo património pertencentes às duas empresas, sedeadas no exterior. Tendo em conta que os generais entregaram todo o património”, disse, uma outra fonte ligada a CIF.Afirmou ainda que os chineses estão a mover o processo também contra o Estado, pelo facto de a PGR ter ficado com 100% de todo o património, quando, por força da Lei sobre o Repatriamento Coercivo e Perda Alargada de Bens, da Lei Reguladora das Revistas, Buscas e Apreensões, entre outros diplomas legais, devia ter ficado apenas com os 60% que se encontravam sob alçada da empresa do general Dino. “Os 40% são dessas empresas e devem ser respeitados. O general Kopelipa não entregou essas acções. Entregou apenas os 60% em nome do general Dino. Isso está tudo documentado”, frisou.