A casa do desporto rei, onde passaram nomes do desporto angolano antes e depois da Independência, proclamada a 11 de Novembro de 1975, precisa de socorro das autoridades da província de Luanda.
Quem passa por lá fica com a sensação de que o esquecimento é a palavra de ordem, visto que até ao momento o projecto que o transformaria num centro de treinamento para as selecções nacionais, por parte da Federação Angolana de Futebol (FAF), continua sem sair do papel, de acordo com as “fintas” que o jornal O PAÍS teve para apurar os factos
Apesar de alguns recintos para a prática do futebol, federado e não federado, em Luanda, terem desaparecido, no distrito urbano do Rangel, o Campo do São Paulo, pelas condições em que se encontra, vai resistindo no tempo.
No palco onde já desfilaram nomes sonantes do desporto-rei angolano, as instalações da era colonial, que em 1997 beneficiou de obras de restauro e consequentemente reinaugurado pelo então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, pode-se inferir que está votada ao abandono.
No Campo do São Paulo, o acesso depende da vontade do cidadão nacional ou estrangeiro que por lá passar, visto que no portão principal não há serviço de guarda.
Assim, o cidadão da República Democrática do Congo (RDC), Guelor Vuzu, contou, sem quaisquer receios, à reportagem do jornal O PAÍS que se dirigiu para aquele local com o objectivo de fazer necessidades maiores.
O vendedor de acessórios de telemóveis no mercado dos “Congolenses”, há sete anos, adiantou, num português arranhado, que estava muito apertado e que não tinha valores para pagar o lavabo existente na praça.
“Desde manhã ainda não vendi nada, não tenho 200 kwanzas para pagar casa de banho, isso me fez vir aqui e encontrar um espaço para fazer maiores”, disse o cidadão do Congo Democrático.
Para além da necessidade maior, Guleor Vuzu faz do Campo do São Paulo um local para relaxar sempre que perde ou ganha o dia no mercado assim que termina as suas vendas no final dia.
No interior, quem entra, no lado direito e no lado esquerdo deparase com carros avariados e estacionados de moradores que residem nos blocos e clientes que frequentam os “Congolenses”.
Os lavadores de carros são os mais “abençoados, visto que quando entra um carro, de alguém conhecido ou não, vão directamente ter com o proprietário da viatura, no sentido de solicitar uma lavagem.
Ao ser aceite, a água do tanque que serve para regar a relva é a primeira matéria-prima do lavador escolhido para o efeito, visto que o detergente e o resto do material aparece num abrir e piscar de olhos.
Parecendo que não, depois do trabalho, os jovens, do valor cobrado, mil kwanzas, tiram uma percentagem e partilham com alguns funcionários que no final do dia também levam alguma coisa para os filhos em casa.
The Masta, um dos lavadores mais famosos no Campo do São Paulo, fez saber à reportagem deste jornal que trabalha naquele local há mais de três anos, porque gosta de futebol.
“Com o dinheiro que ganho aqui todos os dias, consigo satisfazer as minhas necessidades, porque é aqui onde gosto de ficar a trabalhar e não tenho problemas com ninguém”, referiu The Masta.
O jovem de 32 anos, apreciando um cigarro para esquecer as “malambas” da vida, tal como afirmou, mostrou-se amante do futebol.
Aliás, tem na cabeça a agenda das actividades que o palco da bola acolhe, mesmo estando nas condições em que se encontra actualmente.
O palco do desporto-rei é também um espaço usado para negócios dos vendedores, além de que montam música nas viaturas, reparam pequenas ou grandes avarias, ponto de relaxe quando o sol aperta por baixo das árvores e das bancadas nas barbas dos funcionários.
Nas cercanias do Campo do São Paulo, o lixo também faz morada, visto que a maior lixeira no seu interior, no portão colado à parede dos “Congolenses”, agora encerrado, foi combatido, sendo certo que naquele local foi colocado um estaleiro que apoia as obras que decorrem em algumas ruas das Bês e das Cês.
Tempo devasta as infraestruturas
O palco, que em 1999 do século passado acolheu o célebre jogo do Girabola entre o Cambondo de Malanje e o Petro de Luanda, com vitória da equipa da equipa da terra Palanca Negra, por uma bola a zero, conta com um campo principal e um adjacente.
Assim, o recinto principal, relvado e com bancadas de betão, alguns materiais já não estão em condições, porque o tempo e outros agentes atmosféricos contribuem para a sua degradação.
Com capacidade para cinco mil espectadores sentados, o palco que também já foi casa do Kabuscorp do Palanca, um dos clubes com mais adeptos em Luanda, a tribuna central, com um alpendre já não está em condições e tem sido um espaço para o relaxe dos jovens. Na tribuna central, os jovens, naqueles momentos em que está arejar como deve ser, tiram a camisola, compram cervejas, cigarros e outros produtos para ganharem o dia.
Uma fonte deste jornal alegou que a direcção não tem condições de trabalho, visto que há muitas coisas que ultrapassam os que lá funcionam todos os dias, talvez, por amor a camisola.
“Os funcionários do campo fazem muito para manter o recinto movimentado, visto que não se ganha nada lá, mas por amor ao trabalho estão lá todos os dias”, rematou a fonte do O PAÍS.
A direcção do Campo de São Paulo e outras partes que o compõem também carecem de obras de restauro.
As paredes cor de rosa estão a degradar-se, mas por força do mau estado e das chuvas.
Aliás, os balneários para os atletas, antes ou depois dos jogos, também estão em mau estado, visto que muitos atletas preferem equipar-se no carro ou num outro ponto próximo do palco do jogo.
As torres de iluminação não acendem há muito tempo, facto que não permite a realização de jogos à noite, por isso, quando cai a noite todo o mundo abandona o campo, restando apenas os guardas, que estão em prontidão somente no período noturno.
O campo adjacente, apesar de estar relvado, também apresenta alguns problemas técnicos, ainda assim recebe jogos no fim-de-semana de equipas locais ou de outros pontos de Luanda.
A rega da relva é feita à moda antiga, visto que o tanque está à distância e usa-se uma mangueira comprida com uma motobomba ligada à corrente eléctrica e lá a água chega a todos pontos do tapete verde.
FAF fecha os olhos
Em relação ao projecto definido pela Federação Anglana de Futebol (FAF), presidida por Artur Almeida, em transformar o Campo do São Paulo num centro de treinos para as selecções nacionais, tudo continua no papel.
Em 2019, com a vinda do presidente da FIFA a Angola, o responsável da FAF adiantou que os contactos com o Governo Provincial de Luanda (GPL) estavam avançados.
Mas, até ao momento, não há um pronunciamento oficial do órgão que rege a modalidade no país em relação ao assunto.
Por isso, não se sabe ao certo como fica o projecto de reabilitação do palco onde desfilaram Ndunguidi, Jesus, Laika, Lufemba, Vicy, Nejó, Vieira Dias, Maluca e outros.
O jornal O PAIS, antes do fecho da presente edição, fez todas as diligências para ouvir a versão da direcção do órgão que rege o desporto-rei no país, mas sem sucesso.
Os responsáveis da instituição não responderam aos questionamentos desta publicação, incluindo o vice-presidente José Carlos, que remeteu para Artur Almeida.
Nova direcção não fala, mas com tarefa difícil
A nova direcção do Campo do São Paulo, apesar de ter fintado a equipa de reportagem do jornal O PAÍS, tomou posse a pouco menos de cinquenta dias, visto que o elenco de Nelson José João viu o seu mandato terminado em Março passado.
Ainda assim, segundo uma fonte deste jornal, a nova direcção, comandada por Elma Prisco, garantiu , em reunião com os funcionários, que veio para trabalhar e dar uma nova dinâmica ao complexo.
Por isso, conta com a colaboração de todos, visto que as dificuldades também são de todos, num contexto em que o mais importante é trabalhar para dar solução à situação actual.
De acordo com a fonte do O PAIS, neste momento a nova direcção está a fazer um inventário das condições em que se encontra o Campo de São e depois vai criar uma estratégia para atacar os problemas que se impõem.
Delegação multissectorial visita as instalações
Nesta segunda-feira, uma delegação multissectorial, composta por membros do Governo Provincial de Luanda (GPL) e do Ministério da Juventude e Desportos, efectuou uma visita ao Campo do São Paulo.
Os membros, em companhia do elenco da nova responsável, Elma Prisco, percorreram as instalações e anotaram todas as falhas e problemas que o complexo apresenta.
Sem dar quaisquer explicações, a fonte deste jornal adivinha que nos próximos tempos haverá uma boa nova para o Campo de São Paulo, visto que a desordem instalada pelos populares deverá acabar.