A nova proposta que vem alterar a Lei Geral de Trabalho, Lei nº 7/15 de 15 de Junho, traz como novidades a licença de paternidade, o teletrabalho e a obrigatoriedade de os patrões garantirem aos seus funcionários o seguro contra acidentes de trabalho. Espera-se que a mesma venha promover o equilíbrio e salvaguarde os interesses legítimos de trabalhadores e empregadores
Depois de ter sido aprovada, na generalidade, a nova Proposta de Alteração à Lei Geral de Trabalho foi objecto de discussão na especialidade na Assembleia Nacional, tendo merecido a aprovação dos representantes de todas as organizações, desde sindicatos, organizações patronais, académicos, magistrados judiciais, Ministério Público e quadros da Administração Pública, que deram o seu contributo para enriquecer o diploma Considerada como a lei de maior equilíbrio, ante os interesses do empregado e do empregador, a nova Proposta de Alteração à Lei Geral de Trabalho, cujos debates na especialidade encerram, hoje, Sexta-feira, vem redirecionar os eixos e introduzir algum equilíbrio no regime laboral entre trabalha- dor e empregador, com certas vantagens para ambas as partes.
O documento, que mereceu o beneplácito dos representantes de várias organizações sociais, está sistematizado em 326 artigos e 11 capítulos. Depois de ter sido analisado, na especialidade, capítulo por capítulo, o mesmo deverá seguir ao plenário para a sua aprovação final global no próximo dia 25. A lei vigente (Lei nº 7/15 de 15 de junho), de acordo com o legislador, estabelece normas diferentes, que se enquadravam, na altura (2015), com a realidade da população em Angola.
Porém, tendo em conta a evolução de vários aspectos sociais, tais como a possibilidade de se trabalhar a partir de casa, viu-se a necessidade de repensar e actualizar esta lei, de modo que a relação laboral entre empregador e trabalhador não seja beliscada pela descontextualidade laboral.
Vantagens mútuas
A nova proposta é considerada como a lei que vem para mudar a filosofia da actual Lei Geral de Trabalho, que se tem mostrado estar muito mais inclinada na salvaguarda dos interesses dos empregadores. Porém, segundo o legislador, ela acarrecta vantagens mútuas, ao contrário da actual. O legislador explica que as empresas continuarão a beneficiar do princípio constitucional relativo à livre iniciativa económica e empresarial, que visa basicamente a obtenção do lucro, sendo o trabalhador um importante instrumento enquanto for produtivo.
Todavia, considerando as alterações introduzidas na lei, o legislador chama a atenção para os desafios das empresas na sua aplicação, para que não se ponha em causa os direitos dos trabalhadores. O documento traz inúmeras vantagens e novidades, tais como a licença de paternidade e a obrigatoriedade de os patrões garantirem aos seus funcionários o seguro contra acidentes de trabalho , o teletrabalho, entre outros. Vem assumir o contrato por tempo indeterminado como regra, reduzindo as possibilidades de se assinar um contrato por tempo determinado ao prazo máximo de cinco anos e tipifica de forma mui- to mais clara as situações para a celebração de um contrato de trabalho por tempo determinado.
Na nova lei, os pais passam a beneficiar de uma licença de paternidade por 15 dias. Propõe ainda a possibilidade de se gozar a licença de maternidade por substituição. Isto é, se por fatalidade a mãe da criança falecer numa altura em que ela ainda não tinha completa- do os noventa dias, ou, se se tornar incapaz depois do parto, o pai da criança pode, por substituição da mãe, gozar estes 90 dias de licença de maternidade para poder acompanhar o desenvolvimento dos primeiros dias do seu filho.
Indemnização ao trabalhador
No caso de o trabalhador vir a perder o seu posto de trabalho, a possibilidade de indemnização está salvaguardada, visto que foi alterada nessa nova lei a fórmula dos cálculos para a indemnização do trabalhador, um formato que dá maiores garantias ao trabalhador despedido sem justa causa. Trata-se de uma medida que engloba todas as empresas, quer grandes, médias e microempresas. A nova proposta de lei traz também maior flexibilidade na organização do regime laboral do trabalhador estudante. Foram introduzidas na mesma medidas que vão facilitar a inserção dos trabalhadores estudantes, bem como de pessoas com responsabilidades especiais, tais como país com filhos menores com necessidades especiais, para que estes possam trabalhar em horários mais flexíveis.
Benefícios ao empregador
Para tranquilizar os empregadores, o legislador assegura que a nova proposta traz igualmente boas notícias para o empregador no âmbito de equilíbrios. A mesma traz a preocupação de criar um bom ambiente de negócios e de não retrair o investimento directo, quer interno ou estrangeiro. Retira, por outra, o encargo ao empregador de assumir, por exemplo, despesas de um trabalhador adoentado por um longo período de tempo. Nesta nova proposta, passará a ser o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) a assumir as despesas ou os encargos.
Teletrabalho, uma realidade
A nova proposta de lei traz a consagração do teletrabalho, uma nova realidade que, de acordo com o legislador, se mostrou eficaz durante o período de pandemia da Covid-19. Relativamente a esta nova realidade, especialistas ex- plicam os constrangimentos que podem advir do teletrabalho. Advogado sócio administrador, Lievem Cambonga explica que os trabalhadores poderão encontrar alguns constrangimentos que podem consistir na improdutividade ou no incumprimento das tarefas em teletrabalho, o que pode dar lugar a complicações na relação jurídico-laboral com a entidade patronal. Avança que o teletrabalho pode tornar difícil a execução do trabalho no horário legalmente estabelecido pela empresa, por motivo de não haver em casa condições apropria- das ou equiparadas ao emprega- do para executar o trabalho durante o horário estabelecido pela entidade patronal.
Outra questão tem a ver com o facto de que o teletrabalho poderá provocar ou reduzir a produção do trabalho por conta de inúmeras dificuldades sociais vivenciadas pelos trabalhadores nas suas próprias casas. Para os empregadores, as implicações poderão consistir nas falhas de internet nas residências dos trabalhadores, bem como outras situações sociais negativas a que os trabalhadores têm enfrentado no seu dia-a- dia, tais como falta de energia eléctrica e poluição sonora por conta de vizinhos.
Implicações jurídicas
E como nem tudo “são rosas”, a nova lei traz também consigo alguns “espinhos”. O advogado Lievem Cambonga esclarece que são várias as implicações jurídicas que a nova proposta de lei traz, quer para os trabalhadores como para os empregadores. Por exemplo, o empregador será obrigado a indemnizar o trabalhador caso decida rescindir o contrato de trabalho que esteja a vigorar para além dos cinco anos. Podem, outrossim, serem vislumbra- das desvantagens para os trabalhadores, como a perda da remuneração em caso de suspensão da relação jurídico-laboral por conta de um processo disciplinar.
Outra questão é o facto de que o teletrabalho poderá provocar ou reduzir a produção do trabalho por conta de inúmeras dificuldades sociais vivenciadas pelos trabalha- dores nas suas próprias casas. O jurista sublinha que podem ser também consideradas como desvantagens para as empresas a limitação do tempo anteriormente previsto para tornar um contrato de trabalho em tempo indeterminado, uma vez que na lei anterior as micro, pequenas e médias empresas dispunham de até dez anos para verem automaticamente alterada a tipologia do contrato de trabalho para tempo indeterminado, ou de rescindir o contrato com a alegação de cessação ou caducidade do mesmo.
Este período foi reduzido para até cinco anos ininterruptos. Lievem Cambonga avança que existem outras desvantagens, tais como o direito à paternidade atribuída aos pais, o que poderá reduzir a produtividade de uma em- presa. Outra questão tem a ver com as medidas disciplinares. Na lei vigente, por exemplo, há quatro medidas disciplinares que visam a manutenção do emprego do trabalhador. A nova lei vem acrescentar duas, nomeadamente a suspensão sem remuneração e a despromoção temporária do cargo.
“Uma lei que vale apena ser aprovada”
Para a União Nacional dos Trabalhadores de Angola (UNTA), esta é a lei que mais se aproxima aos interesses das partes, comparativamente a actual Lei Geral de Trabalho, razão pela qual vale a pena ser aprovada. O seu presidente, José Laurindo, considera-a como uma lei pacificadora, que traz novos elementos no que respeita aos benefícios dos trabalha- dores. “É uma lei que vai trazer, na nossa óptica, isso se não tiver outros elementos intrusos, paz social no emprego, com um espirito mais congrega- dor que facilite o diálogo que se quer e a concertação permanente entre os emprega- dos e a classe patronal”, disse.
O incumprimento no pagamento da segurança social tem sido uma prática recorrente na actual lei, por isso o sindicalista apela à classe empregadora a honrar a medida, chamando a atenção aos empregadores que descontam para a Segurança Social, mas que não depositam o valor. O presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Superior, Eduardo Peres, defende que a nova lei deve colocar no centro a pessoa humana, ou seja, o trabalhador. “Sempre que há uma alteração de uma lei, ela deve visar a melhoria e não o contrário. Esperamos que a nova Lei Geral de Trabalho traga melhorias”, disse.
Uma Lei que vem proteger mais os trabalhadores
A classe empresarial não ficou de fora e aponta aqueles que poderão ser os constrangimentos desta nova proposta de Lei. O empresário Rui Silva entende que esta nova lei vem proteger mais a classe trabalhadora. Relativamente às normas da contratação, o empresário não concordou com os novos critérios prescritos nesta lei para a celebração do contrato de trabalho. “Eu como empresário não concordo, tendo em conta os problemas sociais que a gente tem vindo a ter no que respeita ao comportamento dos nossos funcionários. Fica complicado quando, a determinada altura, um dos nossos funcionários se portar mal, mas teremos que pagar uma indemnização grande por um tempo determinado.
Fica complicado gerir isso”, disse Rui Silva, alegando que os funcionários, normalmente, quando sabem que há esse tipo de cultura têm a tendência de adoptarem propositada- mente comportamentos menos adequado. Quanto ao teletrabalho, o empresário mostrou-se céptico, alegando que se verificou na pandemia ser uma medida que não resulta para a conjuntura angolana. “Quando as pessoas não estão no controlo da em- presa os níveis de produção baixam muito. Falei com várias empresas, disseram que era muito complicado ter as pessoas fora, porque elas vão passear, às praias, às compras e não se focam no trabalho. É uma medida que na nossa realidade não resulta muito bem. Lá fora acho que resulta porque as pessoas têm objectivos, metas e normalmente cumprem. Aqui por várias situações é complicado ter o teletrabalho”, concluiu.