Quem iniciou o exercício do jornalismo na década de 90 ou mesmo em finais desses anos lembrar-se-á do peso que o conflito armado exercia naquela fase.
Com a guerra nos campos de batalha ao rubro, eram quase lendárias muitas das figuras que lá actuavam, tanto lado do Governo, através das Forças Armadas Angolanas, como da UNITA, com as extintas Forças Armadas de Libertação de Angola (FALA).
Os acordos de paz em 2002, alcançados na sequência da morte de Jonas Savimbi em Lucusse, no Moxico, trouxeram, definitivamente, para a cidade muitos destes comandantes militares e políticos, sobretudo os ligados à UNITA, muitos dos quais se tinham retirado para as matas depois da refrega pós-eleitoral em 1992, isto é, há 10 anos.
Os novos tempos de paz permitiram-nos conhecer, de perto, muitos destes homens, entre militares e políticos. Do topo à base.
A nível político, familiar e até mesmo de amizade, muitas das quais cujas relações perduram até aos dias de hoje.
Desde Abril de 2002, quando se assinaram os acordos de paz no Palácio dos Congressos, numa cerimónia memorável, em que muitos dos dirigentes da UNITA apareceram ao público em número significativo, apesar de ainda enfraquecidos pelas vicissitudes na última fase do conflito, foi possível concluir que eram também comuns mortais, à semelhança dos demais seres vivos que habitam este país, continente ou mesmo planeta.
Não era, nem é, necessário beliscá-los para perceber que também sentem dor, se aleijados sangram e que se doentes estiverem, caso não se submetam a tratamentos atempados e adequados, poderão igualmente morrer, tal como ocorre com outros angolanos independentemente da filiação política, credo e cor.
Foi o que sempre pensei. Afinal, nunca se deixou sequer transparecer que alguns destes nossos compatriotas fossem imortais.
É que sempre que morre um dirigente politico ou antigo chefe militar surgem sempre desconfianças de que alguém os terá ‘estufado’, subentendendo-se por orientações dos antigos inimigos do campo de batalha e hoje do campo político.
As cerimónias de homenagem ao malogrado deputado Raul Danda acabaram numa névoa por conta das habituais desconfianças que vão sendo lançadas.
E desta vez pelo próprio responsável máximo da organização, dando conta dos receios que muitos destes quadros têm quanto ao tratamento dado nos hospitais angolanos.
Seria expectável que se possuíssem informações de que alguns dos quadros tenham sido mortos, então que se avançasse com uma investigação cujos resultados viessem a público e os responsáveis responsabilizados.
Não é aceitável que se pinte sempre a tese da existência de ‘imortais’, procurando-se sempre por um culpado, associando-se sempre uma classe integrada por profissionais sacrificados.
Porque, ao lançar ao ar as continuas insinuações, desrespeita-se um grupo de angolanos que se doa diariamente, entre enfermeiros, médicos, quadros administrativos e técnicos de outras áreas, para todos os dias garantir assistência médica e medicamentosa aos angolanos, independentemente das filiações partidárias, de Cabinda ao Cunene e do mar ao Leste.