O Procurador-Geral da República (PGR), Hélder Pitta Gróz, reafirmou, ontem, Quinta-feira, em Luanda, que os processos criminais, envolvendo cidadãos nacionais nos casos mediáticos de corrupção, continuam em fase de instrução preparatória
Entre os nomes mais sonantes cujos processos seguem o curso normal de instrução preparatória na DNIAP da PGR, no quadro das acções de combate à corrupção, estão o antigo Vice- Presidente da República, Manuel Vicente, dos ex-PCA da Sonangol, Isabel dos Santos, e da seguradora AAA, São Vicente. Segundo o Procurador, recentemente reconduzido no cargo, Hélder Pitta Gróz, “os processos não devem ser discutidos em hasta pública”.
Nas suas declarações à imprensa, após a cerimónia de inauguração, ontem, do novo edifício da Procuradoria-Geral da República (PGR), esclareceu que, em relação aos processos-crimes, deve-se aguardar para que estes saiam da fase de instrução e do segredo de justiça e se tornem públicos, com a sua remissão ao tribunal. O magistrado salientou ainda que o órgão vai continuar a dar prioridade ao combate à corrupção e ao crime organizado.
Também em declarações à imprensa, o antigo Procurador-Geral da República, Domingos Culolo, considerou “excelente” o actual trabalho da instituição, que hoje assinala o seu 44º aniversário, embora ter considerado como sendo “difícil”. Domingos Culolo, que esteve à frente dos destinos da PRG de 1993 a 2002, defendeu o envolvimento de toda a sociedade para o êxito do trabalho deste órgão.
Condição de militar influencia recondução de Pitta Gróz na Procuradoria-Geral da República
Segundo o jurista Albano Pedro, a decisão da recondução, por parte do Presidente João Lourenço, do general Hélder Pitta Gróz à frente da Procuradoria-Geral da República, terá sido motivada por episódios de insubordinação de magistrados militares a magistrados civis. E esclareceu que enquanto órgão hierarquizado, o Titular do Poder Executivo tem a competência de nomear o candidato da sua confiança Para o jurista, não era expectável que fosse nomeada uma outra figura que não fosse o general Hélder Pitta Gróz, pelo facto de ser o único militar que concorreu às eleições. Explicou que, na sua organização interna, a Procuradoria-Geral da República é composta por dois tipos de magistrados: sendo uns afectos ao Ministério Público (civis), e outros adstritos à Procuradoria Militar.
E por causa dos vários episódios que já ocorreram no passado, mas que raramente chegaram ao conhecimento público, houve falta de subordinação de procuradores militares a magistrados do Ministério Público, a quem chamou de procuradores civis. “E este facto tem estado, até então, na origem da nomeação de militares na direcção deste órgão”, disse. Ademais, acrescentou que se tratar de um órgão hierarquizado, que depende de orientações superiores – não sendo –, por isso, um órgão com a característica do sistema judicial, em que os juízes gozam de plena independência no exercício das suas funções judiciais.
“Este é um órgão hierarquiza- do, em que os que estão no topo coordenam os que estão em baixo, e todos eles dependem do Presidente da República, na qualidade de mais alto magistrado da nação e de guardiã da lei”, defendeu Albano Pedro. Por este motivo, prosseguiu, “era de se esperar que um militar ficas- se no topo para que a procuradoria militar não caia no risco da insubordinação”. Para este jurista, um procurador civil “teria criado desarranjo” ao nível dos militares, já que Hélder Pitta Gróz não é o único general. Ao nível da Procuradoria Militar vários oficiais-generais coordenam diferentes áreas daquele órgão, pelo que foi o acautelar de actos de insubordinação a magistrados do Ministério Público que o Presidente João Lourenço optou na continuidade de Pitta Gróz.
“Confiança é ainda mais importante”
Por outro lado, elucidou que, contrariamente à Magistratura Judicial, que deve ser visto como um órgão independente, quem tem que estar no topo da hierarquia do Ministério Público é um indivíduo da confiança e conveniência política do Presidente da República, por ser um mandatário seu. “E isto não se negoceia”, afirmou, reiterando que a confiança é muito importante e, que, para ele, a figura indicada é a que, neste quesito, mais garantias apresenta ao Presidente da República.
Outrossim, lembrou que numa altura em que o Presidente João Lourenço está a conduzir a política de combate à corrupção, entende que Hélder Pitta Gróz é aquela figura com o qual o Chefe de Estado quer continuar a contar. No que diz respeito à eleição, Albano Pedro disse que o acto não deve ser encarado como uma falta de respeito aos princípios eleitorais. Mas, explicou que o mesmo deve ser entendido, apenas, como um mecanismo de proposta, em que os magistrados reúnem e escolhem três nomes, dos quais o Presidente escolhe quem ele bem entender. “E foi o que aconteceu”, disse.
Quadro jurídico vigente é pouco favorável ao combate à corrupção
Convidado a analisar o primeiro mandato do Procurador-Geral da República e, concomitantemente, o combate à corrupção, o advogado Alcíneo Cristóvão Luís fez uma avaliação razoável do trabalho realizado. Aliás, explicou que a política de combate aos crimes económicos, financeiros e patrimoniais teria logrado muito mais êxitos se houvesse um quadro jurídico legislativo mais favorável que pudesse permitir à PGR agir com maior liberdade. “Sem estar vinculado à visão, os critérios e nem receber instruções do Titular do Poder Executivo”, disse. Segundo este causídico, nos termos da Lei 22/14, Lei Orgânica da PGR, há uma relação estreita entre o Procurador-Geral da República e o Titular do Poder Executivo. E se o PGR tivesse mais liberdade, o seu desempenho teria sido melhor.
Todavia, afirmou que nada está perdido, e que muitos dos processos-crimes que ficaram por ser instaurados e formalizadas as acusações, como é, por exemplo, o caso do antigo Vice-Presidente Manuel Vicente, poderão ser retomados neste novo mandato. “São processos muito complexos, que requerem muita coragem, mas acredito que conhecerão novo rumo neste novo mandato e os seus autores serão responsabilizados até ao limite da sua culpa”, disse.
Inocência Pinto é lufada de ar-fresco na PGR
Albano Pedro entende que a indicação da nova Vice-Procuradora da República, a primeira mulher a assumir este cargo desde que o órgão foi instituído em Abril de 1979, vai ajudar a desanuviar o ambiente mais ou menos tenso dentro da PGR. Aliás, entende, a presença de Inocência Pinto servirá como lufada de ar-fresco para as vozes contra- rias ao então titular do posto, Mouta Liz. “E foi adequado colocar uma senhora naquela posição, até porque as senhoras têm o dom da conciliação, por causa do seu instinto materno, e isto vai criar este clima de harmonia e de equilíbrio e vai ser a figura de interlocução entre as alas que também não andam satisfeitos com o PGR”, asseverou.
A nova vice-procuradora geral da República, Inocência Pinto, que substitui no cargo Mouta Liz, desempenhou, até agora, a função de directora nacional para Prevenção e Combate à Corrupção, desde 2012 -2023. Trabalhou junto da 3ª secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, acumulando a função de directora nacional de Prevenção e Combate à Corrupção 2014-2017. Foi titular da PGR no Cuanza- Norte entre 2005-2011, procuradora provincial adjunta – 2000- 2005, procuradora municipal 1998-2005, inspectora da Polícia Nacional, chefe da Cátedra de Direito da Escola Nacional de Polícia da Ordem Pública (Capolo 1), entre 1996 – 1998. Foi aspirante, instrutora de Direito na Escola Nacional da Ordem Pública 1992 – 1999.
Licenciada em Direito pela Universidade Agostinho Neto, congrega no currículo a seguinte formação profissional: curso de Cooperação Internacional em Investigações Complexas, pro- movida pela Agência Nacional do Crime do Reino Unido e pela IACCC-International Anti- Corruption Coordenation Centre; curso de Actividades Offshore dirigido a entidades jurídicas e disposições legais, sob promoção do Departamento de Tesouro dos Estados Unidos da América. Inocência Pinto é ponto focal de Angola no Southem African Development Community (SADC), em matéria de Prevenção e Combate à Corrupção.
É, também, ponto focal da PGR na Comissão Multissectorial para a criação do Observatório Anti- Terrorismo e a ponte entre a Procuradoria e o Eastern and Southern AFRICA Anti-Money Laundering Group (ESAAMLG), Grupo de Prevenção ao Branqueamento de Capitais de África Oriental e Austral. A vice-procuradora-geral da República, a primeira mulher no cargo é, igualmente, coordenadora do grupo de trabalho que elaborou o primeiro Plano Estratégico de Prevenção e Combate à Corrupção da PGR. Inocência Gonçalo Pinto, coordena, também, o subgrupo de trabalho encarregado da elaboração da proposta da Estratégia Nacional de Prevenção e Repressão da Corrupção (ENAPREC).
Curso de Responsabilidade Criminal da Pessoa Colectiva no Cibercrime- Petroshore Compliance Business School, Media Training. Inocência Pinto é especialista, também, em Fraude e Criminalidade Económica e Financeira pela Unidade de Formação Jurídica e Judiciária da Universidade de Coimbra, Confisco e Apreensão de Proveitos do Crime- United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). Tem formação em Análise de Conduta Verbal, Cibercrime e Criptomoeda, Análise e Investigação de Delitos contra o Meio Ambiente, Curso de Arresto e Apreensões pela PGR, Detecção de Mentiras em Entrevista, Identificação e Recuperação de Activos no Estrangeiro.
Em 2017, a nova vice-procuradora da República, Inocência Pinto, participou no curso de Formadores em Matérias de Drogas e Tráfico de Estupe- facientes, Corrupção, Branqueamento de Capitais e Criminalidade Conexa, promovido pelo Projecto de Apoio à Consolidção do Estado de Direito (PACED), em cooperação com a União Europeia.
Tem, igualmente, o curso de Investigação em Criminalidade Económico-Financeira Transnacional, ministrado pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal da Procuradoria-Geral de Portugal (DCIAP), Formação em Liderança e Gestão de Equipas, Criminalidade Complexa e Técnicas de Investigação Criminal, Sistema de Justiça e Organização Judiciária, no âmbito do Programa de Apoio ao Desenvolvimento dos Sistemas Judiciários (PIR PALOP II). Curso sobre Criminalidade Organizada nos domínios económico e financeiro no Instituto Nacional de Administração e Gestão de Cabo Verde.
É formadora nacional de magistrados, instrutores dos Serviços de Investigação Criminal (SIC) e técnicos da Unidade de Informação Financeira (UIF), em matéria de Corrupção e Criminalidade Conexa. Além da língua oficial, Inocência Pinto fala a língua nacional kimbundu.